Capítulo Único

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Sentada em frente a janela de seu quarto, Jane, olhava fixamente a mesma cena por cerca de dez minutos. Todos os sábados desde que ele assumiu seu namoro com Heather, ele a levava à pracinha que fica na esquina, segurava sua mão, a beijava e fazia carinho em sua bochecha. Ela vestia seu suéter e parecem o casal mais feliz do bairro, talvez até do mundo. Jane não sabe em que momento ela começou a desejar ser a Heather, talvez no momento em que seu namorado começou a cobiça-la enquanto ela passava, toda fofa e delicada, sempre parecendo um anjo com seus cachos dourados e seu sorriso iluminado.

O que mais dói? Saber que aquele mesmo suéter que Heather vestia na pracinha, era o mesmo que ela vestiu várias vezes, e Bruno fez questão de dizer que ficava muito melhor nela do que nele próprio. Ela se perguntava se ele disse a mesma coisa a nova namorada enquanto lhe dava o suéter. "Mas que importância isso tem? É apenas poliéster." Ela pensou, mas o coração pesou e o choro na garganta entalou.

— Queria ser metade bonita como ela. – Jane disse em voz alta abraçando os joelhos, sentindo o coração apertado, mas sem conseguir sair do lugar.

Olhou o calendário, faltava muito para o calor e ela parar de ver Heather com o suéter.

Respirou fundo, pegou o celular, abriu a janela da sua conversa com Bruno e leu a mesma mensagem pela milésima vez "Eu estou apaixonado por outra pessoa, melhor a gente terminar". Já não doía tanto quanto da primeira vez em que leu, ela nunca o respondeu, ele nunca voltou a sua casa para fazer aquilo da forma correta, ele apenas começou a beijar outra pessoa. Involuntariamente ela sentiu seu estômago embrulhar de ansiedade, uma lágrima no olho se formar e escorrer pelo rosto até pousar no seu joelho perto do queixo.

O telefone em sua mão vibrou sinalizando uma ligação da Rafaela, sua melhor amiga, ela a viu passando na rua, em frente a pracinha e antes de atender já sabia exatamente o motivo da sua amiga estar ligando àquela hora.

— Alô?

— Jane, você tá bem?

Ela resmungou, a vontade de chorar era tão forte e quase impossível de segurar.

— Você não tá parada na janela vendo os dois na pracinha não, né?

— O que você acha? – Ela sussurrou virando o rosto no momento em que Heather e Bruno se beijaram. — Eu queria ser a Heather.

— Amiga, não fala besteira. Você é maravilhosa, um dia vai encontrar alguém que te ame de verdade.

"E por que alguém me amaria? Eu não sou bonita como a Heather"

— É pode ser.

— Jane... – Pelo tom de voz percebeu que sua amiga estava ficando brava com ela. — Já faz duas semanas, você precisa sair dessa.

— É mais fácil falar do que fazer, Rafa.

Ela ouviu a amiga suspirar do outro lado da linha, mas não disse nada. Ficaram caladas, Jane olhando o casal, Rafa parada no final da rua olhando na direção da pracinha. Seu cenho franzido. Ela odiava o que a amiga estava passando, odiava o fato de Bruno vir justamente para a praça no final da rua de sua ex-namorada com a atual namorada; ela se perguntava se ele era burro, mau caráter ou simplesmente um imbecil. Qualquer pessoa que entrasse no quarto de Jane conseguia ver a pracinha da janela, ele não poderia ser tapado o suficiente para não perceber que Jane em algum momento não os veria de sua janela, e é exatamente em momentos como esse que ela gostaria de bater nele até ele melhorar como pessoa, ou simplesmente morrer. Ela sabe o quão errado é desejar a morte de uma pessoa, mas quando ela fica na linha com sua melhor amiga e a ouve respirar fundo tantas vezes, é a única coisa que se passa na sua cabeça. A morte dele.

— Jane, você quer fazer alguma coisa?

Jane suspirou e olhou sua amiga parada no final da rua, ela não conseguia ver o seu rosto nitidamente, mas pelo tom de voz ela soube o quão preocupada sua melhor amiga estava.

— Rafa, eu só quero ficar sozinha mais um pouco.

— Hoje é a última vez. – Foi a última coisa que ela disse antes de desligar a chamada.

Jane se jogou na cama ainda encolhida, abraçada aos joelhos e chorou por tanto tempo que começou a ficar sem ar. No fundo ela sabia o quanto sua amiga estava certa, isso precisava parar, ela precisava parar de chorar, de desejar ser alguém que nunca seria, parar de desejar o amor de alguém que nunca amou e provavelmente jamais amará. Parar de se lembrar a sensação do poliéster dele no seu corpo, ela precisava parar de amá-lo.

Ela sabe que estava desperdiçando sua vida, ela sabe que o mundo não se acaba por causa de um coração partido, mas isso não faz doer menos. Depois de muito tempo chorando, se levantou, limpou o rosto, olhou pela janela uma última vez e não encontrou ninguém. Era como sacudir a poeira. Estava finalmente decidindo levantar a cabeça e seguir em frente.

No canto do quarto em cima da cadeira ela viu o suéter igual ao dele que ela comprou em uma promoção, um dia depois do término, mas aquele não tinha seu cheiro, não estava gasto como o dele.

— É apenas poliéster. – Pegou a peça na mão, esperando sentir tudo que ela não tinha mais, e como sabia que jamais sentiria a jogou no lixo, saiu do quarto e respirando fundo foi enfrentar o mundo e a dor acumulada no peito.

Ela ainda se lembraria de tudo, dos momentos bons, dos choros na madrugada, da mensagem insensível e fria e principalmente do brilho no olhar que ele tinha quando Heather passava e prometeu a si mesma que nunca mais amaria sozinha em um relacionamento.

Ela pode não ser Heather, ela pode não ter metade de sua beleza, mas ela nunca mais olharia aquela janela aos sábados no final da tarde, e principalmente, nunca mais desejaria ser outra pessoa. Ela é Jane.

Vai doer por um tempo, mas não vai doer para sempre. 

É apenas poliésterOnde histórias criam vida. Descubra agora