Uma grande psicóloga

21 2 0
                                    


 Magda havia batido a porta com tanta força que a mesma gerou um tufo de ar, levantando seu cabelo channel cor de carmim. Ajeitou suas lisas mechas e deu as costas para a madeira, indo em direção ao seu destino naquele instante: o restaurante do centro da cidade alguns metros distantes de seu consultório.

 A sapatilha tom de sua pele, rangia com os passos, pois o couro novo ainda não tinha laceado. Por alguma razão repentina quando se achava virando a esquina lembrou-se de que não havia passado a chave na porta. Ou teria? Essa era uma questão muito duvidosa para ela, mas em uma cidade tranquila como a que residia, deixar as portas abertas não era um grande problema.

 Continuou sua caminhada sem deixar de pensar no que havia em seu consultório: os diversos livros sobre psicologia, alguns enfeites e a pesada pistola embaixo do fundo falso da sua mesa. Se questionou porque ainda guardava aquela coisa, mesmo não tendo de usá-la por anos. Se indagou ainda sobre o que aconteceria se alguém resolvesse invadir e roubar seus pertences, porém não chegou a concluir o que realmente faria se algo assim viesse a acontecer.

 Sua caminhada já deveria ter acabado, mas era como se quanto mais caminhasse mais longe ficasse do ponto final. Ela olhou para todos os lados da rua a fim de tentar identificar a distância do restaurante, quando fez isso acabou chocada ao notar que se encontrava em frente a porta de seu consultório, com a mão no trinco que por mais forçado que fosse não permitia a entrada.

 – Que droga é essa? – cochichou ela.

 Largou o trinco devagar e checou mais uma vez a rua: nenhuma alma viva. Aquele horário era considerado morto na cidade nortenha gaúcha. As fumaças de fogões a lenha se elevavam dos poucos prédios daquela única rua do centro, revelando habitantes gélidos que se aquentavam e esquentavam o almoço.

 Magda, ainda sem entender o que tinha acontecido, ajeitou seu casaco de lã batida e retornou a caminhar. Desta vez resolveu seguir pela rua de baixo, (a cidade tinha um estranho relevo que fazia com que o centro tivesse a avenida principal elevada em alguns pontos). Antes de cruzar a rua checou os lados para evitar um acidente, coisa que poderia ter acontecido a qualquer momento visto que tinha a mente em algum outro ponto fora da atual realidade. Assim sendo, a mulher fez uso das escadas e desceu para a rua mais baixa, verificou a rua que ainda estava vazia de carros e pessoas.

 Um pé depois o outro, e então uma luz forte invadiu seu olhar e o som perturbador de freios sendo acionado, adjunto a um cheiro forte de pneu queimado, invadiu o ar. Ela não via nada que não fosse a claridade ofuscante das luzes do caminhão, se é que se pode dizer que aquilo era um caminhão.

 – Aqui!

 Se achou encarando uma lajota branca, alguém falava alguma coisa. Desviou o olhar e o pousou sobre um garoto de no máximo quinze anos, vestido com o uniforme do restaurante que era seu destino.

 – O quê?

 – Magda? – era a dona do restaurante – Você está bem? Faz uns quinze minutos que você está parada aí, encarando o chão.

 – Como?

 – Está tudo bem? – continuou a questionar.

 – Ah, acho que sim. O dia está um pouco estranho hoje...

 – Claro que está – falou a mulher sem se importar muito com o que Magda queria dizer – você vai entrar?

 Magda balançou a cabeça tentando se livrar daquela estranha sensação. O olhar repousou novamente sobre o menino garçom, ele ajeitava o colarinho da camisa preta. A mulher olhou para cima sem saber o que tinha acaba de acontecer, o nome "Biasus", estampava a fachada do prédio de dois andares.

AQUI!Onde histórias criam vida. Descubra agora