- Ei ei ei, carinha que mora logo ali, onde acha que tá indo? – Marrento, cheio de gíria e acha que é dono do pedaço, um típico valentão de bairro.
- Ok, tudo bem, tudo bem, vou dar a volta – Recuou erguendo as palmas das mãos em si
– Ah, e aí bruto – Pedro cumprimentou o colega de bairro descontraidamente - só estou indo ali na padaria, é que eu tô com um pouco de pressa... Que bruto o quê pivete? Só os chegados me chamam assim, tá pensando o que? Esse beco aqui é dos parsas, nesse horário nenhum playboyzinho passa aqui não. Vaza, sai fora – O trombadinha se aproximou de Pedro com um cigarro fedido soltando fumaça
nal de rendição. Arregou.
- Isso aí ô, sai fora – falou se virando e retornando para o lugar onde estava
- Ah, bruto, só uma perguntinha... – Exclamou em um tom provocativo
- Mé qui é? Tu tá me tirando, carai?
- Não não, só quero uma informação
- Que informação? Tu acha que eu tenho cara de quê?
- É sobre a sua Super Habilidade nada de mais, qual que é a sua mesmo, você tem uma né? – Por mais que a pergunta parecesse inofensiva, o valentão sabia que o objetivo daquele playboyzinho era simplesmente irritá-lo, e isso o deixou com muita vontade de mata-lo
- Ô seu prego, porque tu tá perguntando da minha relíquia?
- Nada não, era só pra eu fazer o cálculo e ver se vale a pena – Dessa vez não fez questão de esconder o deboche no rosto
- Seu perreco, tu tá querendo é vala né? – Jogou o cigarro contra o chão e caminhou rápido e com sangue nos olhos
- Não fez questão de esconder que estava colocando a mão direita no bolso para tirar algo e usar contra o folgado. Uma faquinha pequena, semelhante a um punhal. A lâmina não chegava a oito centímetros, mas o estrago que era capaz de causar já havia sigo comprovado no passado
Era hora de mostrar como que põe um playboyzinho em seu lugar. Sem mais uma palavra segurou a faca com a lâmina para baixo, semelhante a segurar uma alavanca, melhor jeito de cortar alguém com firmeza. O pescoço era o melhor alvo
- Pra tombar esse prego, é só fazer avenida no pescoço dele e já era – Com esse pensamento o malandro arrastou o braço, com movimento em arco na altura da jugular de Pedro. Não esperava que o garoto conseguiria se abaixar tão rápido. A lâmina faiscou contra a parede do muro.
- Girou a faca em sua mão com certa habilidade, apontando a lâmina para cima dessa vez. Rapidamente o seu braço procurou novamente o pescoço do prego metido a besta - Dessa vez eu acerto – Insistiu em pensamento, mas o seu corpo não foi tão rápido quanto a sua mente.
O seu braço foi parado em curso com a lâmina da faca a não mais que cinco centímetros da almejada jugular. Com apenas uma mão, o perreco segurou o seu punho sem nem mesmo olhar, pois os olhos amarelos dele estavam vidrados no rosto do malandro. Agora pareciam duas lâmpadas incandescentes de tão brilhantes
O valentão tremeu na base. O seu golpe ter sido parado tão facilmente, aqueles olhos amarelos o encarando, ameaçador, assustador. Tudo aconteceu muito rápido, golpe desviado, golpe bloqueado, olhos ameaçadores, e um forte soco no estomago de baixo para cima que fez os pés do malandro saírem do chão
Seus tênis ainda não tinham tocado o solo quando a outra mão agarrou o seu pescoço o empurrando contra a parede em suas costas. A respiração falhava, o seu rosto forçadamente voltado para o agressor, obrigavam seus olhos a encará-lo. A cara de deboche que Pedro fez foi humilhante para o malandro
Aos poucos o braço, rápido como uma flecha, de Pedro, foi cedendo e os pés do valentão sentiram o chão novamente. A pressão em seu pescoço preso contra a parede diminuiu. Agora dava para respirar, mas com dificuldade.
O playboy revelou de vez a sua personalidade debochada – E aí, tá confortável? – Perguntou, encostando o seu ombro contra o braço do delinquente contra o muro. Ainda segurava a faca com firmeza
O garoto debochado encostou a sua cabeça no muro e permaneceu segurando o valentão e o encarando nos olhos com um sorriso um tanto sádico no rosto, claramente se divertia com o sofrimento do outro que tudo o que podia fazer era estremecer de temor daqueles olhos amarelos
- Então... me fala aí qual é a sua individualidade? – O valentão permaneceu calado – Eu tenho o tempo que precisar, já não digo o mesmo de você – Insistiu apertando um pouco mais o pescoço do malandro
- Pro-proficiência – falou com dificuldade
- Aah, sério? Que interessante! – falou agradavelmente surpreso – Acho que vale a pena – comentou. Seus olhos brilharam ainda mais forte. A mão que segurava a garganta do subjugado, começou a emitir uma energia, também amarela e tão brilhante quanto os olhos do emissor, como se estivesse viva penetrou em seu pescoço através dos poros
Tentou resistir, mas foi em vão. Naquele momento imaginou que seria torturado ou até morto, mas a energia que invadiu o seu corpo, não provocou mais que um leve desconforto. Aquela sensação estranha durou apenas alguns segundos e retornou rapidamente para a mão emissora
Sentiu um alívio rápido em seu pescoço, parecia que seria libertado, mas novamente ficou sem ar com a força aplicada pelos dedos do agressor. O olhar de Pedro mudou, o deboche em seu rosto virou desprezo e raiva.
- Sabe... eu não quero ser preconceituoso nem nada – Falou com ironia
– Mas eu realmente odeio vagabundos como você... ficam vagando pelas ruas à noite, incomodando as pessoas, daqui a pouco estão assaltando e matando boas pessoas por nada, até que algum herói finalmente tenha a coragem de torcer o pescoço de vocês, um por um, antes que se juntem à alguma gangue terrorista e façam o que fizeram ao protetor dessa cidade, que aliás, agora não temos mais
- O jovem já estava ficando roxo quando Pedro finalmente o lançou ao chão. – Vai fazer alguma coisa da tua vida antes que acabe como uma galinha – concluiu Pedro, já se distanciando do jovem que se acabava em tosse sentado no chão de concreto daquele beco escuro que tinha apenas uma lâmpada de poste que não fora quebrada
- Proficiência hein? – Enquanto se distanciava, Pedro refletia sobre essa Super Habilidade – Não esperava que esse cara tivesse uma individualidade tão rara – Prosseguia pensando até que que os seus pés pararam e junto com eles a sua distração
- Ô bruto! – Se virou para o jovem caído – Você por acaso sabe o que a proficiência faz? – Não obteve resposta, o jovem estava mais preocupado com a ardência em sua garganta, massageava-a enquanto ainda tossia
- Essa Super Habilidade é muito rara e pode mudar completamente a vida de uma pessoa, ou de muitas. Você tem noção disso?
- Que se foda! Tô nem aí! É pra eu fazer o quê, sê um herói? Finalmente respondeu. A voz estava instável e completamente roca
- Não, eu não falo disso! Até porque, se for pra ser um herói merda, melhor não ser – Pedro retrucou o jovem com ar de superioridade, olhando-o de cima para baixo – Me refiro a você usá-la para mudar a sua vida. Caso você não tenha feito o mínimo de pesquisa sobre a sua própria Super Habilidade, essa é uma Super Habilidade passiva. Se não souber o que é uma passiva vai estudar, pois ela tem o poder de te tornar mestre em qualquer coisa que quiser. Se você conseguir aperfeiçoar essa Super Habilidade, em qualquer coisa que você se dedique de verdade você será o melhor. Ela pode elevar qualquer habilidade que você tenha, seja uma Super habilidade ou seja uma habilidade comum, a níveis jamais imaginados. Tenha consciência disso e vai fazer alguma coisa da tua vida – Finalizou dando as costas e indo embora
- Oi mãe, voltei, vou deixar as sacolas em cima da mesa tá? – Ângela tomou um susto, não esperava que o filho entraria pela porta dos fundos, esse detalhe já despertou o seu instinto de mãe
- Ei espera aí, que pressa é essa? Porque demorou tanto? – Caminhou na direção de Pedro o analisando
- Ah, por nada eu só... – O que é isso no seu ombro Pedro? – Isso o que? – perguntou o rapaz olhando para o local apontado, tão confuso quanto a mãe – Como o quê, isso aqui filho?...Isso é sangue Pedro? Filho, tem um corte no seu braço, de onde veio isso Pedro? – Eu também não sei - respondeu
– Que merda, quando que aquele merda me cortou? Agora eu tô ferrado pra explicar isso – Pensava consigo, tentando bolar algo, mas a sua consciência o traiu
- Por favor, me diga que você não se envolveu em outra briga Pedro – Ela ficou parada em sua frente esperando a resposta
- A pele clara do rosto se tornava quase tão vermelha quanto seus cabelos, veias saltadas no pescoço, mãos na cintura, a pupila dilatada ganhava mais destaque que sua íris verde e a voz já se alterava desde o início, todos os sinais de uma Ângela furiosa estavam ali
- Eu, não me envolvi – Quase gaguejou – Fui atacado por um noia e, apenas revidei, foi pra isso que aprendi a me defender né?
- A mulher tirou a mão direita da cintura e massageou a sobrancelha
– Quando seus pais morreram e o Ben e eu te adotamos, você tinha apenas seis anos, era deste tamaninho – Estendeu a mão indicando a altura. Se esforçando para manter o tom de voz baixo, ela continuou – Eu conheço bem os meus filhos, sei quando estão mentindo...Pedro, você já tem dezoito, eu não quero mais ter que me preocupar com você meu filho. O que é que está havendo com você? Você tem mudado a cada ano, e eu não estou gostando dessas mudanças. Só este ano você já se envolveu em três brigas, e agora mais uma, e eu nem estou contando com as vezes em que você brigou por causa do Arthur, eu entendo você é o irmão mais velho e quer protege-lo, mas, isso está ficando mais sério, você sai e volta machucado...o que é que houve com aquele garotinho que sonhava em ser um super herói?
- Pedro permaneceu calado
- Cadê a minha recepção gente? Ben se aproximava da cozinha pelo corredor atrás de Pedro. – Ué, que aura pesada é essa aqui, e aí filhão? – Emendou tocando nas costas do rapaz e indo na direção de Ângela. Beijou a testa da esposa e ficou esperando uma resposta
- Olha Ben, o ombro do nosso filho, e fala alguma coisa pra ele que eu já estou ficando cansada de falar – A mãe não conseguia manter a calma
- Você se envolveu em uma briga de novo Pedro? – Perguntou com voz seca e cruzando os braços
- Não, eu fui atacado e apenas me defendi. O cara tinha uma faca, mas eu lidei com a situação
- Bem, se você apenas se defendeu então está tudo bem – Falou voltando o rosto para a esposa, esperando a reação dela
- Não Ben, ele está mentindo pra gente, você não percebe isso? Será que só eu presto atenção nos nossos filhos? – respondeu a mulher, gesticulando
- Nosso bairro tem garotos problemáticos, mas eles não mexem com as pessoas do mesmo bairro
- Mas querida, não é assim, nós temos que dar um voto de confiança pra ele, o Pedro já é um adulto
- Um adulto? Um adulto apenas em idade, porque tem se comportado como uma criança imatura. Eu não posso permitir isso, o que ele vai se tornar se seguir esse caminho?
- Ah claro, o caminho que eu escolho é ruim! – Retrucou o garoto com ironia – Porquê o meu caminho só é bom se for a senhora quem escolhe né? Ser um médico, tudo bem, me tornar um super Herói, perfeito, mas se for um caminho que eu mesmo escolho, aí não, porquê é um caminho ruim... por que a senhora quer tomar todas as decisões importantes da minha vida? O que sobra pra eu escolher, o que vou comer no jantar?
- Não me venha com essa – Retrucou apontando o dedo contra o garoto
– Ser um super herói também era o seu sonho... pelo menos era até a Aline morrer
- Ângela...não – Ben tentou impedir que a esposa se excedesse, mas a discussão já estava superaquecida. Ela continuou
- Já se passaram três anos Pedro, você tem que esquecer, não percebe que isso está atrapalhando a tua vida meu filho?
- O que a morte da Aline tem a ver com isso? – Pedro permanecia sério e desafiador, mas não ousava aumentar o seu tom de voz
- Não pense que eu sou boba, desde que ela morreu você passou a desprezar os Heróis, porque você culpa eles pela morte dela. Eles não podem salvar todo mundo meu filho, as pessoas morrem, é normal...
- Depois de um tempo de pausa, se acalmou e retornou a falar – Eu e o seu pai vamos morrer um dia, pode ser de velhice, mas também pode ser em acidente, sei lá...
- Eu, eu não quero falar sobre isso – Ergueu as mãos em rendição e se afastou seguindo pelo corredor em direção às escadas – Pedro... - Ele ignorou o chamado – Ela o seguiu pelo corredor
- Mãe, eu tô com fome! – A voz infantil carregada de sono, a fez parar antes de segurar o braço do rapaz em fuga – Ângela olhou para o lado, acima da sua cabeça, viu o garotinho sentado no primeiro patamar das escadas, se apoiando no guarda-corpo de madeira
- Em um rápido disfarce, mudou completamente o seu semblante - Ah...oi filho, porque você não avisou que já estava acordado? Vem aqui, eu vou te preparar uma coisa bem gostosa
- O garotinho ficou de pé. Antes de ir até a mãe, observava o irmão subindo as escadas em sua direção
- Pedro encarava o chão enquanto subia, mas quando avistou o garotinho, ergueu o rosto, e trouxe com ele um sorriso, afagou o cabelo do irmãozinho enquanto passava por ele e continuou subindo
Para se acalmar e organizar as ideias, nada melhor que uma ducha.
Durante o banho Pedro refletia sobre o que a sua mãe lhe falara. Ela foi dura com as palavras, mas ele sabia que estava certa. Esquecer é difícil, mas, algo tem que ser feito a respeito, não custava fazer um esforço. O banho foi mais demorado do que planejara, mas cumpriu o seu papel
- As coisas estavam meio acaloradas por aqui hein? - Ben, de repente estava de pé no começo do corredor, as costas apoiadas sobre a parede, observava a esposa perdida em seus pensamentos, sentada junto à mesa, solitária na cozinha, tomava um chá – Ah... é, e você, em vez de me ajudar, fica do lado dele né? – Falou a mulher com certo desgosto
- Se eu não intermediar, vira guerra, não posso assumir um lado
– Respondeu com o bom humor de sempre enquanto se sentava próximo da esposa
- Porque que isso está acontecendo Ben? - Perguntou com voz de lamento
– Ele não era assim. É tão difícil assim pra ele aceitar que, o que eu quero pra ele é sempre o melhor?
- Não, ele é bem esperto, eu tenho certeza que ele sabe muito bem disso – Respondeu com tranquilidade na voz
- Então porque ele resiste tanto? Porque ele rejeita os meus concelhos?
– Porque você está tirando dele a opção de escolher, querida
– Não, eu não estou. Ele queria ser um Herói e eu o apoiei, foi ele quem escolheu, não eu
- Verdade, mas, depois ele desistiu dessa ideia, e você não o apoiou
- Sim, mas, porque, claramente foi um erro ele ter desistido, era o sonho dele, eu só quero que ele realize o seu sonho
- Eu sei, mas você deve deixar que ele perceba por conta, ele deve decidir por si mesmo o que quer
- Mas, se eu sei que ele está fazendo a escolha errada, ainda sim eu não devo interferir? Eu devo deixar ele permanecer no erro e depois sofrer sem necessidade, sendo que eu posso fazer algo?
- “Fazer algo”? Você quer dizer, decidir por ele? Tirar dele a liberdade de escolher o seu próprio caminho? – O marido segurou as mãos inquietas de Ângela - Você reclama que ele não age como um adulto, mas, você tira dele a única coisa boa de ser um adulto, que é tomar as próprias decisões.
Por um acaso, ser adulto não é tomar as próprias decisões e lidar com as consequências delas, aprender com os próprios erros?
Querida...já reparou que você trata o Pedro quase da mesma forma como trata o Art?
E, já reparou que o Art tem apenas 6 anos e o Pedro já tem 18?
- Depois de uma respiração profunda, Ângela respondeu – Eu sei, eu sei que as vezes eu sufoco ele, sei que deveria deixar ele decidir as suas coisas por conta própria... mas, eu não entendo... quando eu estava nessa fase de decidir essas coisas, eu desejei tanto, tanto, ter a minha mãe, para me ajudar a escolher, a decidir o que fazer da minha vida, e eu não a tinha mais...eu só quero dar a ele o que eu não tive
- Eu sei querida, eu sei, mas você tem que deixar ele assumir as rédeas da própria vida, e ele resiste a você porque ele também sabe disso. Enquanto você tratar ele como uma criança, é assim que ele vai agir. Se você quer que ele seja um adulto, então deixe ele ser
- Mas ele vai sofrer à toa, seria muito mais fácil se ele... – Amor... você não pode protege-lo do mundo, esse é um caminho que só ele pode trilhar, o que você podia fazer por ele você já fez, agora só nos resta esperar que ele se torne uma pessoa incrível, com o mínimo possível de erros.
Pra mim ele já é um adulto, você tem que enxergar isso também
- Depois do discurso do marido, Ângela não tinha mais nada para dizer, apenas deixou as lagrimas falarem por ela
- Ei, ei, vem cá... – arrastou a cadeira para próximo da esposa, a envolveu com um dos braços e a beijou no rosto – Não se preocupe, você ainda tem o Arthur para tratar como um bebê, por um longo tempo
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Onde Estão Os Heróis
FantasiaDepois de descobrir o verdadeiro potencial de seus poderes, um jovem de 18 anos decide retomar um antigo sonho de ser um grande Herói e sai embusca de mais poder, mas depois de quase morrer em um encontro com uma gangue de vilões, percebe que o pode...