Sirius acordou enquanto ainda estava escuro lá fora.
O corpo quente de John estava deitado ao lado do seu, suas pernas enroscadas. Ele sorriu lembrando-se de sua surpresa quando entrou no quarto e o encontrou lá, parecendo inquieto, o cabelo perfeitamente aparado no estilo militar e as sardas espalhadas pelo rosto. Seu primeiro pensamento foi se John teria sardas como aquelas no resto do corpo, e depois o ocorreu que precisaria agradecer a James pelo presente.
E agora, durante a manhã, Sirius percebia que estava completamente perdido. Como se tivesse experimentado uma droga e soubesse que seria um viciado pelo resto da vida. Não sabia como passaria o resto das suas noites sem John.
Não era simplesmente seu corpo, ou o modo como falava, ou seus olhos cor de mel, mas era tudo isso e algo mais. Sirius não podia evitar sentir seu corpo inteiro em chamas toda vez que se aproximava dele, e uma vontade imprudente de não se prender à sua posição de príncipe, distante e sozinho, mas de conhecê-lo, perguntar sobre sua família, sobre sua infância na Ilha do Sul, sobre tudo que ele quisesse falar. O que era loucura, Sirius tinha certeza, porque eles mal se conheciam e um príncipe não deveria olhar para um soldado daquela maneira.
No fim, quando sentiu que estava pensando mais do que deveria para as primeiras horas da manhã, Sirius acordou John. Sussurrou seu nome como se conhecesse uma palavra nova, e o soldado soltou um grunhido insatisfeito enquanto abria os olhos.
- Eu realmente não deveria ter ido dormir tão tarde – ele murmurou. Sua voz era rouca quando ele ainda não estava totalmente acordado.
- Nesse caso, sinto muito por te manter acordado – o príncipe respondeu, um sorriso brincando nos lábios.
John sorriu. Não desenroscou suas pernas das do outro, e nem fez qualquer movimento para levantar, o que fez Sirius sorrir novamente. Era provavelmente um recorde de sorrisos antes das oito horas da manhã, já que o príncipe era conhecido por ser irritado nas primeiras horas do dia. Mas não hoje. Não depois de passar sua noite com um cara como aquele, e sua voz rouca quando sussurrava, as constelações entre suas sardas e o universo inteiro que cabia na beleza de sua expressão quando estava em cima de Sirius. Ou embaixo, ou em qualquer lugar, na realidade.
- John, você precisa levantar. Seria uma situação... engraçada, se você não aparecesse nas suas atividades durante a manhã e os outros soldados te procurassem só para te encontrar na cama do príncipe. Sabe, eu não me importaria, mas você me pareceu uma pessoa que prefere ser discreta.
O soldado arregalou os olhos durante a fala do outro, e então levantou em um pulo, procurando suas roupas pelo chão do quarto. Depois de se vestir, o que fez sentindo os olhares de Sirius queimarem em sua pele, se encaminhou para a porta. Então se virou para Sirius, parecendo mortalmente constrangido, sem saber como agir.
- Hmmm – murmurou, passando a mão pelo cabelo e evitando os olhos do príncipe – Tenha um... bom dia.
E saiu pela porta.
Da segunda vez, eles se encontraram em um dos corredores do castelo. Em um instante, estavam sendo cordiais, Sirius perguntando a John como ele estava se adaptando ao clima mais seco, e no outro, estavam agarrando-se como se precisassem um do outro para respirar, a pele macia de Sirius atraindo John como um imã, suas mãos em todo maldito lugar.
Mais tarde, depois da afobação, Sirius traçou a pequena cicatriz no ombro de John, e o perguntou como ele a ganhou. Ele contou uma história sobre um assalto armado em uma das feiras da Ilha do Sul. Contou sobre as pessoas correndo, desesperadas, sobre o som que o fez paralisar. E havia acontecido daquela maneira, realmente, mas não eram assaltantes, eram soldados spendat. Suas pernas estavam entrelaçadas novamente, suas respirações ainda ofegantes, suas roupas espalhadas pelo chão. John compensou por suas mentiras sendo brutalmente honesto sobre detalhes pessoais e compartilhando pequenos segredos inofensivos: que ele ainda ouvia os barulhos as vezes, durante seus pesadelos, que sentia falta da sua mãe agora que não estava em casa, que a coisa que ele mais gostava de fazer no mundo inteiro era ler.
- Já conheceu a biblioteca do castelo?
- Não – John respondeu, a respiração na pele macia do ombro de Sirius fazendo o príncipe sentir arrepios – Não sabia se os soldados tinham permissão.
- Não tem. Vamos lá.
Os olhos de John se arregalaram.
- Agora?
- Sim – Sirius respondeu, um brilho malicioso brilhando no olhar antes de continuar – Quer dizer, se eu ainda conseguir levantar.
O soldado corou, riu, e os dois se levantaram ainda meio cambaleantes, andando pelos corredores escuros e pelas horas da madrugada com uma percepção quase embriagada de mundo – exceto, é claro, pelo fato de que nenhum dos dois havia ingerido uma única gota de álcool durante as últimas horas.
Aos poucos guardas que perguntaram ao príncipe se ele necessitava de algo, ele acenou com a mão e respondeu que queria mostrar a biblioteca a um velho amigo, mesmo que a maioria dos guardas conhecesse John e olhasse para os dois com olhares desconfiados.
Era como se, quando estavam um com o outro, fossem capazes de esquecer quem eram, de esquecer as posições as quais haviam sido amarrados, e agir de forma menos controlada. Então foi isso que fizeram. John examinou cuidadosamente vários livros, separou alguns para ler, falou sobre seus autores favoritos para Sirius, que ouviu tudo como se fosse a coisa mais encantadora que já havia sido pronunciada no mundo. O príncipe foi até um canto, tirou um livro empoeirado e recitou uma poesia que, segundo ele, lhe fizera companhia durante anos, mesmo que ele não fosse o maior entusiasta da literatura. John tomou a liberdade de dizer que ele ficava ainda mais sexy recitando poesia, e Sirius falou que se lembraria daquela informação, e então tudo parecia girar e girar e girar.
O príncipe perdeu a noção de quanto tempo eles passaram ali, de quantas horas de sono ele gastou ouvindo a voz doce e rouca de John, escolhendo livros aleatórios e lendo trechos um para o outro, mas não se arrependeu nem um pouco, mesmo que uma leve claridade já despontasse no horizonte quando eles caminharam novamente pelos corredores que os conduziram até a biblioteca. John pareceu indeciso, mas Sirius tomou a decisão por ele quando segurou em sua mão, e continuou segurando quando caminhou até seu quarto, e os dois acabaram no mesmo lugar que haviam começado, deitados entre os lençóis caríssimos da monarquia Spendat, mesmo que o soldado devesse ir para o seu alojamento.
Estavam cansados demais, exaustos, então Sirius simplesmente se jogou na cama e puxou as cobertas para cima, porque a madrugada havia se tornado extremamente fria. Por algum motivo, conferiu duas vezes se John estava bem coberto antes de se permitir pegar no sono.
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Don't Blame Me
FanfictionRemus Lupin tem uma missão: entrar no castelo Spendat e envenenar a família real. Mas quando ele se torna cada vez mais próximo do príncipe Sirius, começa a questionar tudo, até mesmo sua lealdade.