Capítulo 1 - Celeste

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A liberdade nunca foi tão opressora como aquela. Correndo pela floresta, com minha irmã ao meu lado, eu só pensava em voltar e esquecer os meus problemas. Então, a promessa do meu tio, de nos entregar a um desconhecido, como se fôssemos a compra de mercado, me dava força para correr um pouco mais.

Mas eu estava exausta e me joguei sobre uma pedra, com as panturrilhas doendo pelo esforço. Não sabíamos ao certo qual o melhor caminho a percorrer e aquela incerteza estava contribuindo para minha desmotivação.

— Estou cansada. — Abracei as sacolas que carregávamos e me senti sozinha demais.

Recordei da casa simples e com grades nas janelas que morávamos, por muito tempo fomos apenas nós duas. Quando ficamos órfãs, meu tio assumiu nossa criação, nos mantendo longe das mesmas ameaças que atingiram nossos pais. Ele fornecia comida, livros e música, a conexão com o mundo estava inexistente.

Sentia falta de sorvete, dos passeios no parque e brincar com outras crianças. Apesar de ter dezoito anos – de acordo com um cálculo mental não confiável – e não ter experiência de vida, eu me sentia madura o suficiente para ganhar o mundo.

Eu precisava disso.

— Vamos, Celeste! — minha irmã me repreendeu e me tirou dos devaneios tristes.

— Seus joelhos não estão doendo?

— Sim, mas precisamos continuar andando.

— Estou tão cansada.

— Toma um pouco de água. — Ela me entregou uma garrafa e minha boca salivou por um pouco do líquido.

— Obrigada.

Mal terminei, Lara me puxou para ficar de pé e me incentivou a continuar andando. Ela sempre foi a mais ativa e esperta, eu nunca me senti tão boa quanto ela, mesmo que eu me esforçasse para não a decepcionar.

— Logo o nosso tio vai nos encontrar. Acho que dei uma ideia ruim. — Abaixei a cabeça.

— Não diz isso, vamos encontrar um lugar onde possamos ficar sem que ele venha atrás da gente.

Esperava que tio Ravi, realmente, não viesse atrás da gente, para nos obrigar a estar com alguém sem nosso consentimento. Muitos anos se passaram desde o nosso contato com o mundo exterior, eu tinha medo do que poderiam fazer conosco ou os monstros que nos aguardavam.

— Você ouviu isso? — Arregalei os olhos ao reconhecer o som.

— O quê?

— Parece o barulho de um carro.

— Você ainda lembra de como é o barulho de um carro?

Concordei com a cabeça, animada.

— Vamos! — Foi minha vez de segurar em seu pulso e a arrastar para a direção do que parecia conhecido.

Andamos por mais alguns minutos, pulando mato e desviando de árvores. Assim que a floresta acabou, nos deparamos com uma rodovia, onde passavam veículos nos dois sentidos. Do outro lado, ao invés de ter uma floresta como a que estávamos, tinha prédios e casas, com certeza uma cidade que poderia nos abrigar.

Eu e Lara atravessamos a pista sem nenhum cuidado e nos assustamos quando um barulho ensurdecedor, vindo do automóvel que estava em nossa direção, nos congelou pelo medo. Assim que ele desviou de nós, indo para a pista do lado, corremos até a outra extremidade, ofegantes pelo susto e o esforço físico.

Lara deixou as sacolas no chão e apoiou as mãos nos joelhos, respirando com força. Minha mão foi para o coração, o senti acelerado e prestes a sair pela boca.

Prometida para Noah (Degustação)Onde histórias criam vida. Descubra agora