Capítulo 1:

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Os taxistas de Nova York eram criaturas singulares. Destemidos ao extremo, arremessavam-se em alta velocidade pelas ruas abarrotadas com uma tranquilidade excepcional. Para preservar minha sanidade mental, eu havia aprendido a me concentrar na tela do meu celular em vez de ficar vendo os carros passarem ao meu lado a milímetros de distância. Sempre que cometia o erro de prestar atenção ao tráfego, eu me via o tempo todo apertando o pé contra o chão, instintivamente tentando acionar um pedal de freio imaginário. Mas, pela primeira vez em muito tempo, eu não precisava procurar nenhuma distração. Estava grudento de suor depois de uma aula de krav maga das mais intensas, e minha cabeça ainda estava a mil em razão do que o homem que eu amava tinha feito,Harry Shum Jr. Só de pensar em seu nome eu já sentia uma onda de calor por todo o corpo. Desde a primeira vez em que o vi , quando notei o lado obscuro e perigoso que havia por trás de um homem fascinante e inacreditavelmente lindo , senti uma atração irresistível, que só poderia ter acontecido porque eu havia encontrado minha alma gêmea. Eu precisava dele assim como precisava do meu coração batendo, e ele por sua vez arriscou tudo o que tinha para ficar comigo. O barulho de uma buzina me trouxe de volta ao presente. Pelo vidro do carro, vi o sorriso de um milhão de dólares do meu colega de apartamento estampado em um anúncio publicitário na lateral de um ônibus. Os lábios sedutores de Dominic Sherwood e seu rosto fino e alongado estavam bloqueando o cruzamento. O taxista buzinava sem parar, como se isso pudesse liberar o caminho. Sem chance. Dom se manteve imóvel, assim como eu. Estava deitado de lado, descalço e sem camisa, com a calça jeans aberta a fim de mostrar o elástico de sua cueca e os músculos bem definidos de seu abdômen. Seus cabelos castanhos estavam sugestivamente despenteados, e seus olhos verdes brilhavam com malícia. Só nesse momento, de repente, me dei conta de que seria obrigado a esconder do meu melhor amigo um segredo de enorme importância. Dom era meu porto seguro, minha voz da razão, meu melhor ombro amigo, um irmão para mim em todos os sentidos. Eu odiava a ideia de não poder contar a ele o que Harry tinha feito por mim. Eu precisava desesperadamente conversar sobre aquilo, procurar ajuda para tentar assimilar melhor o fato, mas nunca poderia abrir a boca para ninguém. Nem mesmo o nosso terapeuta poderia saber a respeito, pois se tratava de um caso em que a regra do sigilo profissional não precisava necessariamente ser seguida. Um guarda de trânsito corpulento, vestindo um colete fluorescente, apareceu e mandou que o ônibus voltasse para sua faixa fazendo um gesto autoritário com a mão coberta pela luva branca e um grito que não deixou dúvidas de que estava falando sério. Ele fez um sinal para que atravessássemos o cruzamento pouco antes de o semáforo fechar. O trajeto entre a cobertura de Harry na Quinta Avenida e o meu apartamento no Upper West Side era bem curto, mas dessa vez pareceu ter durado uma eternidade. A informação que a detetive da Polícia de Nova York, Shelley Graves, havia compartilhado comigo poucas horas antes tinha transformado minha vida para sempre. E me obrigava a abandonar a única pessoa com quem eu precisava de fato ficar. Tive que deixar Harry sozinho porque não acreditei na sinceridade das palavras de Graves. Eu não podia me arriscar. E se ela tivesse revelado suas suspeitas apenas para ver se eu voltava correndo para Harry e fornecia a prova de que seu rompimento comigo havia sido apenas uma farsa friamente planejada? Minha nossa! O turbilhão de sentimentos no qual eu estava envolvido fez meu coração disparar. Harry estava precisando de mim agora — assim como eu precisava dele, se não mais — , e ainda assim tive que lhe virar as costas. A desolação em seus olhos quando a porta de seu elevador privativo se fechou foi de cortar o coração. Harry. O táxi virou a esquina e parou na frente do meu prédio. O porteiro da noite abriu a porta do carro antes que eu cedesse à vontade de pedir ao motorista para me levar de volta, e o ar quente e úmido de agosto invadiu o ambiente, anulando o efeito do ar-condicionado.

— Boa noite, Sr. Daddario.— Além da saudação, o porteiro bateu com a ponta do dedo na aba do quepe e esperou pacientemente enquanto eu passava o cartão de débito. Quando o pagamento foi concluído, aceitei sua ajuda para descer do táxi e percebi que olhava discretamente o meu rosto marcado pelas lágrimas. Sorrindo como se estivesse tudo bem, entrei no saguão e fui direto para o elevador, fazendo apenas um breve aceno de cabeça na direção da recepção.

Para Sempre Seu - Shumdario - 3 temporadaOnde histórias criam vida. Descubra agora