Prólogo

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Um único som, e haverá muitos gritos e mortes

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Um único som, e haverá muitos gritos e mortes.

O cheiro de sangue se mistura ao fedor de suor e medo, impregnando o ar abafado dentro do contêiner. De fato não me incomoda; é apenas uma nota no caos deste ambiente sufocante, pelas poucas horas que estou aqui, me acostumar a isso é inevitável. As correntes apertam meus punhos e tornozelos, mordendo minha pele até esculpir sulcos profundos, embora a dor seja um conceito distante, algo que não me atinge da mesma forma que as demais.

Meu corpo esta nu, colado ao metal gelado do contêiner, e o frio morde minha pele, mas eu tento pensar que não é nada além de uma reação física. Meus músculos tremem por instinto, tentando preservar calor, mas por dentro, estou vazia de qualquer emoção. A palavra 'medo' nunca significou alguma coisa.

A escuridão ao meu redor parece viva, densa, quase palpável. Sinto-a pressionar contra mim, como um manto pesado que não consigo retirar. Então, apenas observo e absorvo, sabendo que estar aqui, nessa condição sobre-humana, é temporário.

Ao redor, murmúrios abafados cortam o silêncio, há medo e desespero. O som de uma respiração irregular, carregada de pânico, ecoa a alguns metros de mim. No entanto, essas vozes são irrelevantes. Nenhuma delas vai nos tirar daqui.

Uma voz feminina tenta romper o silêncio, sussurrando algo trêmulo, ignorando o aviso dado pelos homens do lado de fora. Com o meu emprego de aeromoça, compreendo alguma coisa em francês, eles não querem lidar com os nossos choros e lamentos. Ela fala rápido, as palavras empapadas de medo, como se sussurrar fosse sua única forma de encontrar alívio. Não me dou ao trabalho de entender o que ela diz — seu desespero é inútil.

Então, um som distante perfura o ar — metal contra metal. O som reverbera pelo contêiner, transformando o ambiente em uma câmara de tensão sufocante. Meu coração dispara, uma resposta instintiva, mas não por pânico. Cada segundo se alonga, o tempo se alongando como um elástico prestes a arrebentar. O ar ao redor se torna espesso, quase me sinto sufocada. Cada respiração parece carregada, como se o ar estivesse impregnado de chumbo.

Mais um som. Há um movimento brusco à minha direita. A escuridão, já opressiva, parece pulsar com o medo coletivo. O pânico se propaga como uma onda invisível, crescendo, se movendo de corpo em corpo. Sinto as energias ao redor mudarem, como uma corrente elétrica percorrendo o espaço apertado.

Há um gemido abafado, a respiração ofegante de alguém prestes a perder o controle. O som das correntes se intensifica quando outro prisioneiro tenta se libertar, os movimentos desesperados fazendo as correntes tilintarem freneticamente. Cada barulho é um lembrete de que qualquer ruído pode significar o fim.

Minha mente se afia, aguçada como uma lâmina. Cada detalhe ao redor se torna mais nítido, cada som amplificado. Posso ouvir o sangue pulsando dentro das minhas veias, o ruído rítmico do meu coração, os pequenos estalos dos meus ossos ao me mover lentamente. Meu corpo está alerta, tenso, pronto para o que vier. Minhas narinas captam o cheiro de metal oxidado misturado ao cheiro acre de urina e medo. Tudo ao meu redor está saturado de angústia, mas para mim, isso é apenas mais uma oportunidade.

A tensão no ar cresce com o som das correntes tilintando. Eu permaneço tranquila. Enquanto os outros se contorcem e sucumbem ao pânico, vejo tudo com frieza. Cada silêncio entre os ruídos é uma janela de oportunidade. Não há espaço para medo dentro de mim. Eu o domo e o uso como uma ferramenta. Aqui, nesse lugar de sombras e terror, sou mais poderosa do que qualquer outro prisioneiro.

Na escuridão, encontro paz. Este é o meu santuário, onde posso ser quem realmente sou. Não há necessidade de máscaras aqui. Não há jogos. Apenas eu, minha mente calculista, e o vasto desconhecido à minha volta. No escuro, ninguém pode esconder a verdade. E é nessa verdade que encontro conforto.

De repente, o silêncio denso é quebrado por um som distinto — um clique metálico, seguido pelo rangido agonizante de uma porta se abrindo lentamente. A luz fraca e amarelada escorre para dentro do contêiner, suas sombras dançando nas paredes de metal como fantasmas.

Por um breve momento, o contraste entre a escuridão absoluta e essa luz trêmula é quase cegante. Piscar se torna impossível; meus olhos captam tudo, absorvendo cada novo detalhe revelado pela luz. O cheiro de mofo e ferrugem se intensifica com a entrada de ar fresco.

Meu coração acelera, não por medo, mas por antecipação. O momento que eu aguardava está para acontecer. O som dos passos ecoa — lentos, deliberados, pesados. Eles se aproximam de onde estou, cada um batendo como um martelo contra o chão de metal. Seguro a respiração. O ar ao meu redor parece congelar, a temperatura caindo junto com a aproximação da presença imponente que entra. Ela traz consigo o peso da autoridade, da morte iminente.

Então, uma voz grave e controlada corta o silêncio:

— Chegou a hora.

A luz inunda o contêiner completamente, revelando a máscara que cobre o rosto do nosso captor. Os olhos dele encontram os meus, apenas por um segundo, mas o suficiente para saber que meu momento está próximo. A tensão no meu corpo é como uma mola prestes a se soltar. Quando o momento certo chegar, estarei pronta.

Born to BleedOnde histórias criam vida. Descubra agora