2021

Prelúdio

Me lembro bem daquele dia, como eu poderia me esquecer? Traumas, perdas e sofrimento generalizado resumem bem tudo que aconteceu. Por onde devo começar?

Eu era só um adolescente, fazia coisas rotineiras e toda aquelas besteiras que todo jovem faz. Naquele dia, me acordei como em toda manhã e bebi o leite que minha mãe acabara de tirar da vaca que temos em casa, nomeei ela de Ruth porque achei que seria engraçado.

"A Ruth ultimamente não tá dando o leite gostoso que dava alguns anos atrás, né mãe?"

Ela me olha, dá um sorriso de canto e continua a lavar os pratos da janta de ontem, o banquete foi farto e os Davidsons vieram para cá. Sinceramente eu não via do mesmo jeito que meus pais viam aquela família, com exceção da garota que me faz ficar doidinho das ideias, Canille. Aquela noite foi estranha, Canille me falava teorias conspiratórias sobre nosso imperador ser contra qualquer tipo de felicidade e brincadeira, eu não acreditei naquela história furada, nossa vila era muito feliz, vivíamos super bem. Enfim, tive que sair depois do café para comprar legumes e vegetais pro grande almoço que nossa família teria com um dos subordinados do rei. No caminho para a feira, encontrei Jonacas e Gystav, os dois pareciam bem felizes e soavam maliciosamente diabólicos. 

"Sayllo, lembra daquela casa velha do lado da feirinha? Eu e o Gystav estávamos pensando e..."

Eu interrompi bruscamente a fala dele 

"Ficou maluco, Jo? Os guardas vivem fazendo a ronda naquela feirinha, eles veriam a gente e eu sinceramente não quero me meter em problema."

Jonacas fica cabisbaixo e Gystav tenta consolá-lo

"Vamos Sayllo, não vai ser má ideia, vamos só brincar um pouco lá e matar um pouco da curiosidade que eu e o Jonacas temos do que pode ter dentro daquela casa"

Acho que ali foi o divisor de águas, onde passei de jovem para detrator do governo. Eu aceitei ir.

"Meu deus, tá bom, ok, eu vou. Se der qualquer merda eu coloco a culpa toda em você, Gystav, vou logo avisando."

Jonacas pulou de felicidade junto com Gystav, admito que fiquei alegre pelos dois, seria nossa primeira "aventura" e o primeiro passo para descobrir toda a verdade.

 "Ok, o plano vai ser o seguinte: Vamos juntos conversando em direção à feirinha, iremos atravessar ela e pegar um desvio em direção até aquela casa caindo aos pedaços, é um plano simples que eu pensei agora, mas não deixa de ser um plano." Fala Jonacas com brilho nos olhos.

"Tá me zoando, Jo? Puta que pariu, que plano bosta! O que acontece se tiverem guardas na frente?" indago

"Bom... é... Tem isso. Já sei, se tiverem guardas nós podemos distraí-los. Pronto, pensei numa boa alternativa: Lembra da barraca da Meire? A velha vagabunda que vende uvas? Então, eu presumo que, no máximo, tenha dois guardas fazendo a ronda. Analisando direitinho, é bem provável que tenha um só guarda na frente, já que eles ficam rondando só o perímetro do quarteirão que fica a feira. É aí que entra a barraca da Meire: O Gystav, por ser o mais baixinho, vai pegar uma uvinha e atirar na cabeça do guarda, ele vai ficar irado e vai perseguir o Gystav, e é exatamente nesse momento que nós dois entramos na casa e esperamos até que o Gystav despiste o guarda. O que acharam?"

"FICOU DOIDO? POR QUE EU? E SE EU FOR PEGO?" brada Gystav desesperado

"Nada pessoal, Gystav, mas você é o mais ágil e menor entre a gente, além do que foi você que me deu a ideia umas semanas atrás" fala Jonacas calmamente.

Gystav fica com uma cara desconfiada e meio irritada mas logo se anima e chama a gente para botar todo o plano genial do Jo em prática. Naquele momento era tudo ou nada, seguimos todas as orientações de Jonacas e, como previsto, tinha um guarda bigodudo justo em frente da casa. Esperamos que Gystav tacasse a uvinha e claro, deu tudo certo, o desgraçado era ágil que nem um leopardo. Entramos naquela casa imunda, ficamos agachados atrás do murinho de pedra até que Gystav voltasse. Passaram-se minutos e nada do Gys voltar, estávamos ficando bastante preocupados e eufóricos.