chapter 1

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Charlie

Murmúrios, choro e agonia.

Talvez eu tenha tomado as escolhas erradas, não vale mais a pena, não tenho mais um motivo para seguir isso.

Comecei a faculdade de medicina para um dia achar uma solução para o câncer da minha avó, mas agora ela morreu e eu sinto que isso não faz mais sentido. Tudo era sobre ela e agora é sobre nada.

Entrei no carro tentando controlar a vontade de chorar, o momento era bem conveniente pois eu estou saindo de um velório mas eu não acho pertinente. Dirigi pela avenida movimentada, eu estou anestesiada quase como se estivesse em piloto automático. Cheguei em casa e me joguei na cama pensando no meu plano B, o plano que eu nunca pensei que realmente usaria agora.

O plano B consiste em largar toda a minha vida no Brasil e usar a herança que eu ganharia apenas viajando, mas agora eu acho que devo ao menos fazer algo útil e não apenas gastar. Depois de várias pesquisas eu decidi que poderia trabalhar como au pair, são pessoas que viajam a um país diferente para ajudar uma família a cuidar dos filhos pequenos. Em troca, elas recebem moradia, comida e um pouco de dinheiro.

Adoro crianças, eu sempre falei para mim mesma que a pediatria seria a minha segunda opção, mas acho que preciso de uma coisa nova.

"Preciso viver uma vida nova para mascarar a dor"

Morava com a minha avó desde sempre, meus pais morreram quando eu e a minha irmã éramos pequenas e fomos criadas pela dona Morgana, uma senhora gentil e alegre que sempre tinha bombons guardados na bolsa.

Minha irmã Chloe possui um espírito livre, como ela mesma costuma falar, ela é o que chamamos de garota prodígio que se rebelou e vive como rippie. Terminou o ensino médio aos 16 anos e no mesmo ano entrou para a faculdade de medicina com o mesmo objetivo que o meu, mas no dia da formatura ela largou tudo e começou a viajar pelo mundo.

Agora eu a entendo, ela apenas entendeu que não poderíamos evitar o inevitável. Não a vi antes de sair do funeral e ela entende que preciso de um tempo sozinha.

Peguei o nootebook e deixei o meu perfil de au apir aberto para solicitações, eu não tenho experiência mas sou ótima em línguas, consigo me adaptar facilmente a qualquer lugar, sou ótima com crianças e tenho um ano de medicina como experiência.

"Seria engraçado se não fosse trágico"

Levantei da cama e deixei o perfil aberto, entreio no banheiro e tomei um banho demorado. Eu não estou péssima, eu já estava me preparando para esse dia e isso está tornando tudo menos doloroso mas a dor ainda está aqui, ela é presente.

Saí do banho, coloquei uma roupa confortável e fui para a cama novamente, olhei para a tela do nootebook e já havia 3 famílias interessadas, duas famílias americanas e uma dinamarquesa. Eu poderia escolher uma família americana mas isso não seria uma mudança relevante, não seria algo tão novo, inesperado e muito menos inusitado.

Sem nenhuma relutância escolhi a família dinamarquesa, irei cuidar de duas crianças uma menina de 9 anos e um garoto de 12 anos. Só vou viver uma vez e minha avó iria gostar de me fazendo coisas novas, ela sempre dizia "sem risco, sem emoção" e acho que essa frase tem um fundo de verdade.

"Preciso de emoção"

Acabei dormindo tentando colocar os pensamentos em ordem, minha cabeça estava um caos e eu precisava ficar aderiva e imersa em algum lugar.

No dia seguinte, eu acordei e fiz a mesma rotina de sempre, banho, café da manhã e escritório - mais conhecido como meu quarto - abri o nootebook e havia uma mensagem. Uma mulher chamada Elleri falava que estava feliz por eu ter os escolhido, colocou algumas informações sobre as crianças e pedia as informações sobre o meu voo para que pudesse me buscar no aeroporto.

Comprei uma passagem com voo direto para a Dinamarca, não tenho um pingo de paciência para lidar com escalas, mandei todas as informações para Elleri e comecei a analisar os perfis das duas crianças.

Athena - 9 anos
Alérgica a nozes
Aulas de piano (quarta - sexta - sábado)
Aulas de etiqueta (todos os dias)
Aulas de francês (segunda - quinta - sexta - sábado)
Horários de aula (segunda à sexta: 9 horas - 16 horas)

Henry - 12 anos
Asma crônica
Não poderá desenvolver atividades com esforço físico
Horários de aula (segunda à sexta: 9 horas - 16 horas)

Pelo o que consegui entender, ocupam a garota a ponto de ficar tão exausta que no fim do dia ela desmaia quando chega na cama e protegem o garoto ao extremo.

Não sei o que vou encontrar, mas amanhã vou entrar no avião e começar tudo de novo.

FÉLIX - Félix DenmarkOnde histórias criam vida. Descubra agora