Ana
Tudo bem. Não posso dizer que não sou uma sortuda, porque acabei de ingressar na faculdade de medicina e toda a gente daria a vida para estar aqui.
Porém, eu não me sinto tão sortuda como toda a gente que me disse até agora, acha que eu sou. Óbvio que eu consegui entrar no curso que eu mais queria, mas para isso tive de abdicar muito do meu tempo e dedicação para um monte de livros que não me dizem nada.
Todas as horas que eu passei a estudar foi sempre a pensar no meu futuro e eu nunca consegui viver, realmente, o meu presente. Todos os adolescentes da minha idade já deram o seu primeiro beijo, já transaram pela primeira vez. E eu ?!?
Eu só sei que transar é enfiar um pénis dentro de uma vagina, mas nunca o fiz na verdade. Gostava de ter sentido as borboletas na barriga que as minhas amigas falavam e acordar de uma noite de bebedeira sem saber o que andei a fazer na noite anterior.
No entanto, o que eu sei é que a minha maior noitada foi estar amarrada a um livro de ciências para estar pronta para o teste do dia seguinte. Uma realidade monótona e chata, mas por isso mesmo que eu decidi mudar.
Ou melhor, recomeçar!!
Dar um novo rumo à minha vida que não uma vida parada, sempre sentada em frente de uma secretária. Mudar-me para uma nova cidade, longe de casa, onde as únicas restrições que eu tenho é saber controlar o dinheiro que os meus pais me mandam.
Não que os meus pais fossem controladores e me obrigassem a ser médica, mas o facto deles também serem médicos acho que me daria uma maior pressão que eu não estou disposta a sofrer. Com eles longe e sem me olharem eu poderei experiênciar e conhecer novas coisas, sem ter a típica desaprovação dos pais. Ou seja, conseguir uma vida de estudante normal.
Tudo o que lhes pedi foi que não se preocupassem comigo, pois eu ia ficar bem, e prometi que todos os fins de semana lhes ia ligar por skype. Mas o que lhes prometi não estava tão linear como agora.
Antes de vir para Coimbra arrendei uma casa de dois andares com dois quartos, uma sala e uma cozinha. Só que agora o proprietário da casa estava a pedir o dobro do dinheiro que pediu inicialmente.— Eu não estou entendendo, Senhor Cruz. O Senhor falou que a casa ia ficar trezentos euros. Como é que no recibo está escrito quinhentos?
— A menina sabe ... é que a renda só ficaria trezentos euros se não se importasse de partilhar a casa com alguém, mas como você não aceitou eu tenho de subir o preço. E esse que lhe estou a oferecer já é muito bom, porque já tem cem euros de desconto incluído. Senão pagava seiscentos. — O homem grisalho fala, como se fosse o dono da razão.
Mas eu apostava que isto não tinha sido o combinado.
— E agora como é que eu vou pagar mais duzentos euros? Eu não estava a contar com este aumento na renda? — Olho para ele sem saber o que fazer.
Eu vinha com o dinheiro contado. Não tinha mais dinheiro para lhe pagar.
— Tente pedir aos seus pais. De certeza que eles irão compreender. Na próxima semana volto cá a visitá-la. — O Senhor Cruz fala e deixa-me sozinha na entrada da porta com as chaves da mesma na mão.
Eu podia ligar aos meus pais e pedir que me depositassem mais dinheiro na minha conta. Mas o objetivo de ter vindo para Coimbra era mesmo esse, não depender da minha vida passada. Não depender dos meus pais.
Eu tinha de encontrar uma solução.
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Recomeçar
RomanceToda a gente em alguma fase da sua vida precisa de um recomeço. Uma casa nova, uma escola nova, uma vida nova. Com Ana não foi diferente. Depois de um ano cheio de estudos e uma vida monótona que nem ela soube saborear, ela teve de recomeçar. Mud...