Eram em noites atípicas como aquela que sua perna teimava em latejar e queimar como o inferno.
Oliveira observou o pequeno hospital, o movimento dos médicos que iam e viam; seus passos e vozes entrecortados pelo vento que uivava do lado de fora da construção, vibrando em uma intensidade selvagem, como se fosse arrancar as paredes do chão.
Diabos.
Ele não queria estar ali.
Havia tentado ignorar a dor. Tentando se entupir de analgésicos. Perdeu as contas de quanto tempo se revirou na cama, tentando achar uma posição confortável para a perna. Mas cada movimento, por mais controlado que fosse, arrancava um grunhido de sua boca.
Lembrava-se de ouvir as janelas sacudindo com a força insana do vento. Não fazia ideia se estava chovendo ou se era apenas o ar em sua essência mais brutal.
Quando não havia mais como lutar, o militar dentro dele foi obrigado a se render.
Com um suspiro cansado, ele tinha se levantado e caminhado até a sala, procurando pelas chaves da caminhonete. Sua cachorra vira-lata, Abóbora, estava dormindo preguiçosamente no tapete embaixo da janela.
Foi ali que percebeu que, junto dos ventos bravios, a água caía do céu.
Não acendeu a luz.
Os relâmpagos ocasionais jogavam seu brilho azulado para dentro do cômodo, iluminando a estante rústica e decorativa.
Oliveira andou até o móvel, apanhando o porta-retrato central.
A fotografia eternizada da mulher era um alento e uma tortura; uma dissonância entre a felicidade experimentada no passado e a amargura vivida nos dias atuais.
Uma mão invisível comprimiu seu coração.
— Diabos... Vou ter que ir para o hospital, Sofia. Consigo te imaginar discutindo comigo, me chamando de teimoso e me enfiando dentro da caminhonete.
Os lábios gravados na fotografia sorriam para ele.
— Gostaria que você estivesse aqui. Queria te ouvir falando comigo. Queria ouvir sua voz mandona.
Outro relâmpago enchera a sala; como se a própria Sofia estivesse ordenando que ele parasse de enrolar e fosse até o hospital.
Assim, ouvindo a falecida esposa, Oliveira se virou, calçou as botinas, vestiu um casaco e abriu a porta principal, deixando que a chuva e o vento insano fustigassem seu corpo enquanto rumava para a caminhonete.
Atravessar a estrada de terra, que levava para o perímetro urbano da cidade, foi mais difícil do que imaginava.
A combinação tempestuosa de vento e água borrava o caminho.
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Perdição Sublime | DEGUSTAÇÃO
RomantikLIVRO EM DEGUSTAÇÃO. DISPONÍVEL COMPLETO E REVISADO NA AMAZON. Apaixonado pela terra, o subtenente Álvaro Oliveira fechou o coração e se mudou para sua fazenda, no interior de Minas Gerais, após a morte da esposa. Seus dias são marcados por uma roti...