Capítulo 2: Eu não posso esquecer

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Sei que deve ser muito difícil acreditar nas coisas a partir desse ponto, e por isso eu vou precisar confiar no seu instinto. Preciso colocar todas as minhas fichas na sua consciência, que dessa vez estará repetindo várias e várias vezes os mesmos mantras: "E se?", "E se for verdade mesmo?".
Por favor, dê ouvidos à essa voz, eu me contento com um "e se?", pois é bem melhor do que imaginar você julgando tudo o que preciso te contar como delírios e pesadelos.

Pesadelos... Quem me dera aquilo tudo tivesse sido um pesadelo...

Nos primeiros momentos em queda livre e envolto em escuridão, minha mente pouco processava o que estava acontecendo, meu corpo apenas lutava com tudo para sobreviver à queda. O frio na minha barriga era desesperador, e tudo o que eu pensava era no tempo que eu ainda tinha de vida. Eu já tinha caído bastante, e tinha ganhado muita velocidade com a queda. Quando o chão chegasse, meu fim certamente chegaria junto. Eu balançava os braços e pernas sem conseguir realmente distinguir para onde era cima e para onde era baixo. Meu queixo agora travava meus dentes, abafando o meu grito em choque, que aos poucos deu lugar ao silêncio. Não havia vento, não havia luz, apenas escuridão e o maldito frio na barriga. Enfim meus membros foram se aquietando, o instinto de sobrevivência de dissipando e deixando o comando das coisas novamente para mim. Quanto tempo já fazia que eu estava caindo? Dez minutos? Trinta? Com toda aquela adrenalina, e sem nenhum meio de distinguir o tempo, tudo parecia muito incerto. Independente dos minutos exatos, era fato que eu estava caindo por um tempo bem maior do que eu considerava possível. O frio em minha barriga permanecia, mas agora minha cabeça entrava uma sequência de pensamentos e possíveis explicações.

Não era possível que existisse um buraco tão fundo assim no nível do oceano, e tanto tempo descendo nessa velocidade... Já era pra eu estar quase chegando no centro da Terra.
"Será que eu estou sonhando?" Tentei me beliscar. A dor era real, muito real.
"Será que eu estou ficando louco?" Como? Eu nunca ouvi falar de uma condição dessas.
"Será que eu estou em uma espécie de pegadinha?" Não fazia sentido, eu não sou tão importante pra isso, e não acho que existam tecnologias e efeitos especiais avançados o suficiente pra replicar tudo isso.
Eu só podia então estar alucinando. Alguém devia ter me dopado, colocado algo na minha comida, soltado algum gás pela casa... Não, isso não faz sentido. Nada faz sentido.

O seu problema é que você tá viajando demais. Acaba se esquecendo do mais simples. — Uma voz feminina irrompeu o silêncio em um tom leve e simpático. Meu frio na barriga se intensificou com o susto, e a voz se repetiu, dessa vez próxima do meu ouvido direito em um volume mais baixo — Pra conseguir enxergar direito, primeiro você precisa tirar essa venda aí.

Balancei o braço para a direita, completamente assustado e desnorteado, na esperança de ao menos tocar na fonte daquela voz. Nada alcancei, como se ninguém mais além de mim estivesse ali.

— QUEM TA AÍ? ME AJUDA! POR FAVOR! EU PRECISO DE AJUDA!— Gritei o mais alto que podia. Minha voz tão desesperada que já adotava um tom de choro.

Já estou te ajudando, não posso fazer muito além disso. — A voz aparece novamente perto do meu ouvido. Dessa vez, logo após começar a ouvir a voz eu balancei meu braço na direção de onde achava que tinham falado. Novamente nada estava ali.  — O seu problema é pensar demais. Tire essa venda que te cega, veja as verdadeiras cores do mundo.

Ouvir aquela voz falando de maneira tão calma e suave me causava um enorme rebuliço no estômago.
Você não fala nada com nada! Eu estou imaginando vozes! É isso!— Concluí, minha voz falhando.

Eu existo de verdade, ué. Mas de quê isso importa? Vai ficar pra sempre aí gritando, todo desesperado?  — Ela indagou.

 Você não percebe o que tá acontecendo? Eu tô em queda livre, e você também tá! — Tentei novamente alcançar quem falava comigo, angustiado para fazer algum sentido daquilo.

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⏰ Última atualização: Nov 22, 2021 ⏰

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