"Aqueles verdes olhos"

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Nocturnal waltz...

Mary

06/03/1920
Portland, Oregon
10:16am
Nublado

"Eu mereço cada acontecimento que se sucedeu em minha vida, eu sou a única merecedora de tal acontecimento"... Tento inutilmente me persuadir, que esse é o pensamento correto para se haver agora, mas minha derme queima, meu peito continua nesta mesma dor lancinante, minha visão até agora turva, e minhas pernas fraquejando, me mostram o oposto, sinto que meu corpo está prontamente me traindo, mas neste exato momento, não posso cogitar chorar. Todos conseguem acobertar para si próprios o que estão sentindo, e os demais conseguem omitir para os outros quem eles são, então o que Nietzsche diz, prova sua veracidade, "quem em prol da sua boa reputação, não se sacrificou já uma vez- a si próprio?".

Mary, Mary Louise é o meu nome, estou no auge dos meus 32 anos, e ainda me sinto uma moça jovial, a flor da pele, sou de origem alemã, mas como muitos obtém essa crença, eu não sou loira, nasci com uma doença não identificada pelos médicos, meus cabelos são da colocação mais inadequada possível para minha época e idade, branco, meus fios são constituídos de um notável e alvo branco. Sou casada com um homem que não amo, mas que porventura tenho que chamá-lo de marido, ele é um homem como todos desta época, ambicioso, fútil, grosseiro, agressivo e não menos importante, um ótimo enganador, não é a toa que é qualificado ao cargo de advogado, o que me faz caçoar disso. Os advogados protegem os seus clientes e lutam pela percepção deles do que é justiça, uma justiça ao qual não temos em nossa casa, perdi as contas de quantas vezes apanhei até perder as faculdades mentais, somente por não conseguir engravidar e ter o filho que ele e a família dele tanto almejam, é uma situação lastimável, pois eu quero ter filhos, mas não quero colocar minha descendência em uma casa onde meu filho(a) irá crescer observando seu pai esbofeteando a sua mãe, a cada vez que ela se impor, em um mundo onde homens agridem as mulheres, como se fosse a coisa mais certa a se fazer. Eu tenho o discernimento do quão errado isso é, quando a um ano atrás, estávamos no automóvel, indo para casa, após uma reunião entre conhecidos da elite americana de Portland, e passamos por uma marcha de mulheres, que se intitulavam feministas, observei uma placa, enquanto meu marido resmungava algo incompreensível ao meu lado.

"Merecemos justiça, igualdade e liberdade", essa era a frase que segundos após ler, me fez questionar...
-Se ele pode trabalhar, por que eu não posso?
-Se ele pode fumar e beber, por que não posso?
-Se ele pode me bater, por que eu não posso revidar?

Mas infelizmente ou felizmente as vozes de minha mãe e de meu pai ecoaram pela minha estimada mente, contrariando meus pensamentos e me deixando ainda mais caótica, em minha desordem mental.

Mamãe disse:
-" Filha, agora você já é uma mulher, respeite seu marido ou então ele vai procurar na rua o que não tem em casa".
Papai disse:
-"Não se intrometa em assuntos de homem Mary Louise, você é estudada, mas não significa que é um homem".

Céus mamãe, como se eu me importasse se esse homem ao meu lado fosse procurar outra mulher, eu seria imensamente grata, e papai, acredito ser mais estudada e mais inteligente que ele. Sinto-me uma criança ao falar de meus pais, já que me tratam como se fosse uma, o que me deixa confusa, pois tantas vezes mamãe me chama de adulta, mas me trata igualmente a uma criança de cinco anos de idade. Eles não me deram o amor que eu necessitava, aquele colo materno, que tanto folheei em revistas, e aquele abraço de pai, que alguns segredavam a mim quando pequena, optaram por acreditar que eu necessitava mais, do amor entre conjugados, que tolice. 

Meus pais conheceram Felipe quando eu tinha apenas 4 anos e fui prometida a ele quando tinha 10, quando eu completei 15 anos após minha primeira regra descer, casei-me com ele, que por sinal é mais velho que eu 17 anos, mas mesmo sendo mais velho aparenta ser jovial, com seu corpo atlético até certo ponto, um homem de pele branca, olhos verdes e cabelo escuro, alto, a impertinente altura dele me deixa enraivada pois ele se aproveita disso sobre mim, sendo que eu sou centímetros abaixo dele. Sou uma mulher de estatura alta, magra, cabelos curtos e lisos, mas como vou ao salão obtenho perfeitas e suaves ondas, que da um ar de graciosidade a minha pequena franja lateral, e como já disse, possuo cabelos brancos, não por velhice, ainda; apesar do padrão da sociedade ser um corpo retangular meu corpo é coberto de marcas que a vida me deixou, e eu sei que vão deixar mais ainda, e tenho olhos azuis. No início do meu casamento com Felipe, era a coisa que ele mas dizia amar, minha profundidade em azul, mas hoje, ele gosta de aprofundar seus punhos em meus olhos, que ironia, não. 

Entre o verde mar e o azul índigo ( Pausada )Onde histórias criam vida. Descubra agora