Capítulo 2

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A solidão era incerta.

No decorrer de 20 anos de vida, não me permiti acreditar em um ser soberano. Não quis acreditar em alguém que nos criou e estava conosco todos os dias, pelo contrário. Sempre me senti renegada por todos ao meu redor, e se havia um redentor, ele provavelmente não estava se importando comigo. Bom, isso era o que eu pensava até ver aquele homem resplandecente diante da minha visão. Ele emanava uma luz própria. Ele me trazia um sentimento novo de proteção, e de... Paz?
Aquilo realmente era incrível, mas soava como uma incógnita sem que eu pudesse ter explicações plausíveis. Eu não tive muita coragem de encara-lo. Algo dentro de mim não conseguia. Me sentia impotente. Me sentia incapaz. Me sentia indigna.

As mãos e os pés dEle possuíam um furo cada, totalizando quatro. Naquele momento, eu sabia quem era. Já que nos natais os filmes eram os mesmos e nos transportes públicos a mensagem era focada no tal Jesus que havia morrido por nós em uma cruz. Eu até escutava, achava legal, mas não via verdade naquilo. Na realidade, aquilo soava como algo totalmente fora de contexto. Mas, quando eu o vi, toda a minha incredulidade foi colocada por terra.

Até que, minha mente começou a me levar para lembranças antigas. Meu corpo continuava no mesmo lugar, mas meus pensamentos viajavam de uma forma incompreensível. Mas, quando percebi, estava em uma recordação onde eu tinha apenas 8 anos de idade. Aquele período foi um dos mais dolorosos da minha vida. Foi um período em que meu caráter foi forjado na tristeza e envenenado contra qualquer tipo de fé.

Eu me vi debaixo da cama chorando, apenas balbuciando súplicas e petições de ajuda para o Deus todo poderoso. Para o Papai do céu que minha professora tinha me apresentado. Enquanto isso, era possível ouvir os sons dos meus pais discutindo. Minha mãe totalmente descontrolada e meu pai completamente bêbado. O meu eu daquela idade sabia que em poucas horas meu pai me espancaria como quase todas as noites. Minha mãe não diria nada e seria totalmente conivente com os atos dele. Meus momentos com meus pais de afeto sempre foram bastante raros, isso fez com que meu crescimento fosse conturbado e difícil.

Eu senti a mesma agonia que o meu eu de 8 anos, enquanto chorava debaixo da cama. Eu me sentia sozinha naquele pequeno espaço. Me sentia sem a presença de Deus. Me sentia totalmente desprezada. Lembro-me que foi nesse momento em que comecei a desacreditar na existência do divino. Como resposta aos meus pensamentos, em um piscar a situação mudou completamente.

Eu vi que não estava sozinha. Jesus estava comigo.

Havia sim, alguém comigo enquanto as lágrimas caíam. Eu vi claramente que Ele estava ao meu lado. Vi também que as mãos dEle foram de encontro ao meu rosto pequeno e triste, como uma ação de enxugar as lágrimas. Naquele momento, como em um ato quase milagroso, o meu eu de 8 anos começou a se acalmar. O rosto que outrora estava encharcado, agora estava quase limpo. A respiração que estava acelerada, começou a acalmar-se.

Então, as minhas orações eram ouvidas? E eu sequer consegui perceber isso?

Mas, não faz sentido. Por quê eu era espancada? Por quê minha mãe não dava a mínima pra mim?

Em uma proporção pequena de segundos, o cenário mudou. Mas, aquelas cenas, ao contrário das outras, não eram reais, ao mesmo tempo que pareciam ser. Eu vi várias situações. Vi meu pai causando uma tragédia em nossa casa depois de uma discussão. Vi ele irreconhecível, atentando contra a minha vida, e fazendo com que eu falecesse. Vi minha mãe, antes mesmo de eu nascer, indo em uma clínica e fazendo um aborto. Vi até eu sofrendo um acidente grave enquanto caminhava em direção a escola.

Em meio ao sentimento confuso que pairava no meu coração. Uma voz suave, mas firme, começou a falar.

"Tudo isso era pra ter te acontecido se os planos do maligno fossem concretizados na sua vida. O livre arbítrio dado aos seres humanos é uma determinação que eu coloquei desde o início do mundo. Por isso que quando as pessoas fazem mal umas as outras, é apenas uma consequência do mal enraizado no caráter de cada um. O fato do seus pais terem demonstrado essa crueldade, não quer dizer que você não foi protegida, que você não foi amada e que não foi valorizada por mim. Mesmo que não tenham agido corretamente com você, ainda assim, meu amor foi mostrado por meio dos muitos livramentos e do vigor que te entreguei, o que te fez permanecer forte e firme durante tanto tempo da sua vida."

Quanto mais eu ouvia, mais me sentia incomodada, não com Ele, mas por ter sido tão cega e não ter visto que a solução para os meus problemas estava ali, bem ao meu lado.

Eu vivi da maneira errada, e estava começando a sentir a culpa e o arrependimento brotando no âmago da minha alma.

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Mas eu, Senhor, a ti clamo por socorro;
já de manhã a minha oração
chega à tua presença.
(Salmos 88:13)

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Por isso não tema, pois estou com você;
não tenha medo, pois sou o seu Deus.
Eu o fortalecerei e o ajudarei;
eu o segurarei
com a minha mão direita vitoriosa.
(Isaías 41:10)

Sono Profundo (Concluído)Onde histórias criam vida. Descubra agora