Capítulo I

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O príncipe acordou pela manhã, esperando que o dia anterior não passasse de nada mais que um pesadelo. Olhou pela janela e o céu parecia mais nublado que o normal, como se lamentasse a morte do rei.

Ao ver seu reflexo no espelho, teve a confirmaçãode que a tragédia realmente havia acontecido, pois seus olhos castanho esverdeado estavam inchados, por ter chorado horas e horas seguidas.
A pessoa que mais admirava havia partido e não voltaria jamais.

ㅡ Tom, como se sente? ㅡ o gato de pelos alaranjados questionou, sentando-se sobre a cama.
ㅡ Péssimo, Theo. Estou péssimo ㅡ suspirou profundamente.
ㅡ Sei que é difícil, mas precisa ir ao enterro para apoiar sua mãe e sua irmã.
ㅡ Eu farei isso. ㅡ fez um breve carinho na cabeça do guardião e seguiu para tomar um banho.

Ao afundar o corpo na banheira, deixou que sua mente vagasse pelas boas lembranças que possuía ao lado do pai.
O rei sempre fora muito dedicado ao reino e a família. Nunca deixou faltar atenção e afeto. Sem dúvidas, o melhor exemplo que seus filhos poderiam ter. Mas e agora? Ele não estaria mais ali para orientá-los.

ㅡ Pai, o que eu devo fazer agora? ㅡ lágrimas escorreram pelo rosto bonito do garoto lentamente. E por um momento, lembrou-se de uma fala do mais velho que ouviu na pré-adolescência: "Thomas, nem sempre tudo será perfeito e você precisará ser forte. Chegará o dia em que eu não estarei mais aqui, e você deverá cuidar da sua irmã e sua mãe.".
ㅡ Eu prometo me esforçar ㅡ falou para si mesmo, num sussurro, afundando ainda mais seu corpo na banheira.

ㅡ Alteza? ㅡ era o criado, Dominic, do lado de fora. Provavelmente estava separando um traje para o príncipe.
ㅡ Sim, Dom ㅡ respondeu, mudando o tom de voz.
ㅡ Só queria avisar ao senhor que seu terno já está pronto, alteza. ㅡ dito e feito.
ㅡ Está bem.
ㅡ Precisa de mais alguma coisa? ㅡ pelo som de sua voz, ele tinha chegado mais perto da porta do banheiro.
ㅡ Não. Pode se retirar. Estou bem ㅡ assegurou o rapaz, logo ouvindo o mesmo se afastar.

Thomas então terminou o banho e se arrumou lentamente, a contragosto. Não estava com vontade de ir ao enterro, mas era seu obrigação como monarca e filho.
Desceu as escadas com o mesmo ânimo que se vestira, se segurando no corrimão, enquanto a coroa em sua cabeça parecia pesar mais de uma tonelada. Naquele momento, odiava seu título.

O salão, onde o corpo do rei estava sendo velado, parecia um formigueiro. Várias pessoas de preto, sentadas nas centenas de cadeiras e ainda mais delas do lado de fora do palácio estavam ali. Era possível ver a multidão através portão principal.
Talvez muitos estivessem ali simplesmente pelo dever de ser um súdito. Enquanto outros lamentavam profundamente a morte de Richard Warley III.

O príncipe avistou duas mulheres abraçadas, ambas de cabelos loiros escuros. Sua mãe e irmã mais velha.
Ao se aproximar delas, se juntou ao abraço.
A rainha os apertou em seus braços maternos enquanto chorava sem parar, já Louise parecia exausta e tinha um olhar vazio.

ㅡ Eu prometo cuidar de vocês. Está bem? ㅡ o mais novo sussurrou para elas.
ㅡ Meu bem, não se preocupe. ㅡ a mãe deixou um beijo em sua testa. ㅡ Vamos nos sentar. Já, já o velório chegará ao fim.

A família real ocupou seus respectivos tronos, e no do rei, ao invés dele estar lá, apenas a coroa repousava sobre com seu brilho prateado e frio.
A sensação de vazio e tristeza tomava conta do príncipe, mas ele engolia o choro, na expectativa de parecer forte diante da multidão.

O caixão foi velado totalmente lacrado, pois segundo as autoridades, o acidente acabou desfigurando vossa majestade.

Após os discursos do padre, alguns membros da família e nobres de reinos vizinhos, foi a hora de um anúncio muito importante, do qual Thomas desconhecia.
ㅡ Com a triste partida do rei, nosso reino necessita de segurança para a próxima geração da família real. É com grande satisfação que eu anuncio o noivado oficial da princesa Louise, do nosso querido e amado reino de Pã, com o jovem príncipe Oliver, do grande reino de Titã ㅡ o porta-voz do reino se pronunciou e desceu do palanque. E o rapaz imediatamente se voltou para a irmã mais velha.

ㅡ Quando isso aconteceu? Por que não me contou? ㅡ perguntou, confuso.
A loira se ajeitou em seu trono e disse:
ㅡ Nosso pai planejava anunciar no Ano Novo ㅡ um mínimo esboço de sorriso surgiu em seus lábios. ㅡ Mas agora, as coisas precisarão ser mais rápidas.
ㅡ Você está bem com isso? ㅡ segurou a mão da garota suavemente.
ㅡ Eu não tenho escolha, Tom. E de qualquer maneira, isso aconteceria algum dia ㅡ ela pôs a mão sobre a do irmão.
ㅡ Você tem ideia de como ele é? Digo, o tal príncipe ㅡ olhou para ela, preocupado com o futuro de Louise.
ㅡ Nós trocamos algumas cartas. Ele não parece ser um babaca, mas apenas meio fechado. ㅡ brincou com o bordado do vestido, o olhando novamente. ㅡ Ele está aqui no palácio.
ㅡ Ótimo. Quero conhecê-lo.
ㅡ Possessivo, que nem o papai ㅡ riu sem jeito após citar o falecido rei, pois doía lembrar daquilo, ajeitando meus cabelos em seguida. ㅡ Tenho certeza de que ele tinha muito orgulho de você. São tão parecidos ㅡ uma lágrima desceu de seus olhos e o mais novo a enxugou rapidamente com o polegar.
ㅡ Não diga mais nada, por favor ㅡ Thomas pediu, com os olhos marejados, lhe dando um abraço.

[...]

O momento do enterro chegou, a última chance de se despedir. Ninguém jamais o veria novamente, além dos retratos.
Quando o caixão foi colocado no túmulo, o coração do filho foi partido em mil pedaços, mas o jovem ainda permanecia de pé para a mãe e Louise, fingindo não sentir nada.
Cada pá de terra, parecia um golpe da lâmina mais afiada existente, penetrando sua pele.

ㅡ Com licença. A família real de Titã gostaria de prestar seu apoio à vossa majestade e seus herdeiros. ㅡ o porta-voz do reino se aproximou.
ㅡ Podem ficar à vontade. ㅡ a rainha autorizou, limpando as lágrimas em seu lenço bordado.
Logo um casal e seus dois filhos se aproximaram.
ㅡ Rainha Léia, nossos mais profundos sentimentos. ㅡ a outra nobre cumprimentou a loira. Ela tinha cabelos negros, como os demais membros da família Blanc. Havia boatos de que ela era prima distante do marido.
ㅡ Agradeço, majestade. ㅡ a viúva sorriu pequeno. ㅡ O que acham de um chá? Assim deixamos os mais jovens se conhecerem melhor.
ㅡ Acho uma ótima ideia ㅡ o rei de Titã concluiu, acompanhando a monarca e sua esposa.

Thomas olhou para os príncipes por longos segundos. O mais alto tinha cabelos ondulados e um pouco mais longos, na altura da orelha, enquanto o outro mantinha um estilo mais comum, partido de lado. Ambos tranbordavam seriedade.

ㅡ O que acha de mostrar os jardins para o príncipe Sebastian, Tom? ㅡ foi a vez de Louise sugerir. O irmão mais novo sabia que ela precisava de um tempo a sós com o noivo.
ㅡ Está bem. Vamos lá, alteza? ㅡ falou amigavelmente, enquanto o maior apenas assentiu e o seguiu. Ele estava tão calado, que o príncipe de Pã tinha a impressão de estar sozinho em alguns momentos.
ㅡ Eu sinto muito pelo seu pai ㅡ finalmente se pronunciou, com um tom de voz baixo.
ㅡ Obrigado pela consideração ㅡ sorriu minimamente, tentando parecer gentil.
ㅡ Não há de quê ㅡ respondeu firmemente.

Depois de minutos de caminhada, o silêncio entre os dois era insuportável e abriu espaço para a dor no peito de Thomas aumentar drasticamente. O rapaz se sentou num banco, recebendo um olhar confuso do moreno.
ㅡ Você está bem? ㅡ parou na frente dele.
O mais baixo acenou negativamente, sentindo as lágrimas em seus olhos.
O príncipe Sebastian se sentou ao lado dele e deu tapinhas de consolo em suas costas, pois não tinha ideia do que fazer num momento desses. Mas aquilo surtiu um efeito negativo no garoto que sofria.
Sabendo que sua companhia não lhe ajudaria em nada, Thomas sugeriu que voltassem ao palácio, onde cumprimentou formalmente o futuro cunhado e seus pais, seguindo para o próprio quarto.Theo saberia demonstrar mais apoio que aquele rapaz.

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