Cobertas macias, quentes e confortáveis, cobriam o corpo nu de Midoriya. De lado, com a cabeça encostada no travesseiro, tão macio que o esverdeado dizia que era como uma nuvem, ele estava quase dormindo. Ou tentando.
Fez seu pequeno cenário em sua mente, imaginando coisas impossíveis, como correr com suas pernas num campo vasto, com flores e grama verde, o céu azul claro e o sol brilhante. Talvez sentir com suas mãos a terra, ter a grama entre seus dedos.
Com leve dificuldade, Midoriya se virou para o outro lado, dando seu jeito para fazer a coberta voltar a cobrir seus ombros.
Queria ir na piscina.
Não está quente do lado de fora, quando a janela foi aberta o vento foi inesperadamente frio, por isso não pode ir. Adoraria levantar e fechar a cortina, mas está na cama agora, não sabe que horas são, mas se a luz está assim de cinza supõe ele que são cinco da tarde.
Pensou que bom seria ir a praia, normalmente detesta o lugar, não gosta da areia entrando nas suas roupas, ou de quando é chibatado pelo vento forte que leva diversos grãos de areia. Mas adoraria ir no verão, pensou que queria sentir a areia entre os dedos, dos pés ou das mãos, simplesmente adoraria.
Voltou a pensar sobre água quando se lembrou do mar, também não gosta das ondas quando estão grandes, parece que o mar quer lhe dar um tapa na nuca a cada onda. Mas se estiver no mar calmo, ficaria lá, apenas boiando na água e sentindo as ondas o levarem. Tristemente isso só aconteceria numa Lagoa, pequenas ondas e calmaria? Definitivamente uma Lagoa. Foi longe ao pensar em ir para o Caribe, ou algum outro lugar tropical famoso.
Conhece alguma outra praia tropical turística que não é o Caribe? Quem sabe Bahamas? Bahamas não é no Caribe? Quer pesquisar sobre, seu primeiro pensamento foi pegar o celular e pesquisar. Bocejou e deixou isso para lá. Não conseguiria.
Tentou se lembrar de algum plano para semana. Salvar alguém? Fazer uma boa ação? Pedir para um antigo colega o visitar? Não tem nada disso, tem a semana completamente livre, vem estando livre por muito tempo. Muito, muito tempo. Quem sabe pode ir na cidade? Comer em algum restaurante caro, ou simplesmente pedir um chá chique de pérolas de tapioca — ou boba tea —
Suspirou pesadamente ao perceber que dormiu demais e agora não tem sono. Passou o dia dormindo? Muito provavelmente, teve uma noite agitada.
Levou a coberta ao rosto assim que sentiu as bochechas esquentando, ficou vermelho ao se lembrar do que fez de noite, do que disse. Já aconteceu diversas outras vezes, mas naquela noite decidiram fazer algo diferente, ousado.
Sentiu que seu rosto iria explodir ao se lembrar de tudo, implorou, gemeu, mordeu, fez de novo, e de novo, até os dois ficarem exaustos.
Se virou outra vez ficando de barriga para cima, espalhado na cama parecendo uma estrela do mar. Se sente só, se é realmente as cinco da tarde ou mais, Tomura já deveria ter chegado. Não sabe dizer quando ficou tão dependente da atenção, da presença dele, simplesmente o quer ao seu lado, não o quer longe muito tempo. Sente medo disso.
É estranho pensar assim quando no início os dois eram inimigos declarados.
Riu triste ao se lembrar do passado, quantas pessoas foram perdidas e quantas agora são velhas demais, enquanto Midoriya continua jovem. Poucos ainda estão por aqui como ele, que podem vir visitar por ter tempo, dos seus colegas: Todoroki-kun, Uraraka-san, Tsuyu-san, Kachan, Aoyama-kun, e Aishido-san. Os únicos adultos daquela época são Hawks, e seus antigos professores, Aizawa-sensei e Mic-sensei.
Algumas vezes se juntam para conversar, como não tem mais muito assunto, conversam sobre o passado, ou sobre onde foram e o que ganharam.
Ouviu gotas de chuva, e se preocupou com Tomura, não viram a previsão do tempo então ele não deve ter levado o guarda-chuva. Se sente sua mãe nesses momentos, quando vai até a porta desejar Tomura bom trabalho, sempre pergunta se ele está levando tudo, celular, chaves, o creme, um casaco se ficar frio. Até mesmo o pergunta se comeu bem, mesmo tendo comido juntos.
Ficou entediado de apenas ouvir a chuva e não fazer nada, já não sente sono, dormir seria impossível agora. Mesmo com o barulho constante das gotas de chuva, tem energia demais para dormir.
Mas o que poderia fazer? Pensando em água, lhe veio a mente a banheira. Água quente, bolhas, talvez alguma coisa aromatizada. Se colocar algo no mármore talvez seja capaz de dormir lá. Mas como iria encher sua banheira sem Tomura?
É, parece que vai ter que esperar na sala. Vai dar seu jeito de chegar lá.
Bocejou novamente, se sentou e se esticou, sentindo os membros tremerem um pouco e as costas fazer um estalo. Estava tudo bem, mas seu coração falhou uma batida para bater rapidamente. Tremeu. Tremeu e quis chorar, quase começou a hiperventilar. Sentiu seu braço coçar.
Coceira sempre foi algo irritante, causado por reações alérgicas, picadas de mosquito, pele ressecada, ou simplesmente por pelos crescendo. Se lembra das cicatrizes da mão começarem a coçar algumas vezes, ou as raras vezes que sentia uma coceira e não conseguia coçar.
Mas agora não entende, por que sente coceira no seu antebraço? Não deveria. Isso não faz sentido, ou faz? Olhou temeroso para o membro esquerdo, imediatamente seus olhos arderam, lágrimas iriam sair, queria chamar Tomura. Precisa de Tomura, precisa de um abraço agora, precisa sentir o calor de Tomura. Precisa dele.
Olhou seu ombro, as mordidas e chupões, desceu para o seu braço, cicatrizes fazendo pouco contraste com sua pele pálida. E viu o móvel ao lado da cama, viu a parede pintada de cinza, viu o guarda-roupa enorme mesmo usando pouquíssimas roupas. Não vê seu antebraço.
Os dois são iguais, antebraço? Cotovelo? Já devem ter apodrecido no lixo. Não consegue coçar. Mesmo passando desesperadamente o cotoco no colchão não consegue, a coceira é no antebraço. Não adianta levar a mão direita até lá, mexer os dedos e raspar as unhas contra a pele, porque não tem nada disso. Não tem mãos, dedos, ou unhas. Quer Tomura.
Quer Tomura, quer ser abraçado por Tomura, quer que Tomura beije sua testa e diga que está tudo bem, quer ver Tomura sorrir.
Se arrastou para fora da cama, caiu no tapete extremamente grosso e macio que está ali justamente para isso, Tomura sempre está ali com ele e não quer lembrar que está sozinho. Precisa sair. Sentiu dor.
Sentiu uma dor incomoda no pé, na canela, com a queda, encostou a cabeça no chão em agonia, se lembra dessa dor, causada por contração muscular, mau jeito, ou por esforço demais.
Sentiu essa dor por todos esses motivos, sentiu essa dor quando correu para salvar Kachan, sentiu essa dor enquanto corria com All Might, sentiu essa dor quando treinou demais as pernas. O que era? Shoot Style? Full Cowl?
Havia revestido seus tênis com solas de metal, não havia? Seus tênis vermelhos.
Com sua visão embaçada olhou para baixo, suas coxas, as mordidas deixadas ali, os pés da cama, os pelos do tapete. Não vê sua canela, tíbia, tanto faz! De onde vem essa dor? Ela não deveria estar ali. Não deveria sentir. Dói tanto.
Precisa de Tomura, agora mais que nunca.
Precisa ver Tomura. Precisa ouvi-lo dizer que está em casa.
Precisa que ele o leve no colo para algum lugar, qualquer lugar, precisa que Tomura o segure, o carregue.
Dói, dói tanto. Coça e dói, que coçar, quer que pare de doer, quer Tomura. Dói. Coça. Dói. Coça. Dói mais do que coça? Coça mais do que dói? Dói. Dói. Coceira maldita!
Onde ele está?!
Onde está Tomura? Ocupado demais? Trabalhando demais? Por que ele está demorando? Por que Tomura está sempre ali mas não agora? Ele se cansou? Tomura se entediou? Tomura achou outro brinquedo?
Dói dói. Coça e dói, dói e coça.
Precisa dele. PRECISA DELE PRECISA DE TOMURA QUER PRECISA NECESSITA DEPENDE
Gritou. Gritou nada, nem um nome, palavra, ou letra. Sua garganta simplesmente rasgou-se. Lágrimas saíram sem parar. É agonizante, dói tanto, coça tanto. Mas não consegue fazer parar.
Onde errou? Por que perdeu? Seu mentor, seus amigos, seus professores, colegas, futuro, poder, sua vida. Perdeu tudo, Tomura desintegrou tudo. Foi Tomura. Foi ele.
Perdeu por ser fraco, não merecia nada do que foi lhe dado mas achou que sim. Deveria ter acabado com tudo quando teve a chance, Kachan o deu a resposta mas se fingiu de surdo, é um inútil, sem poder, sem nada. Deveria ter pulado, desistido.
Por que não fez isso? Não estaria sofrendo. Não estaria aqui. Não estaria vivo. Não estaria dependente. Não seria inútil.
— Izuku! O que foi?! Izuku?
Ouviu Tomura gritar, ele gritou mais que Midoriya, agora não mais Midoriya. Se diz com esse nome para não esquecer. Não quer esquecer?
Agora é Shigaraki, Izuku Shigaraki, o marido e bichinho de estimação de Tomura Shigaraki.
Izuku foi abraçado como antes quis, foi colocado no colo de Tomura ainda gritando, e Tomura ficou fazendo chover afeto e atenção em Izuku. Fez carinho em seus cabelos, e beijou sua testa, lhe disse palavras calmas e bonitas. Tomura e Izuku ficaram lá durantes horas, até Izuku não ser mais capaz de gritar ou chorar, e ver na escuridão apenas a silhueta de Tomura, sentir apenas a presença de Tomura.
— Você está aqui, certo? — sua voz estava rouca, sem mãos para tocar e comprovar.
— Sempre estou aqui Izuku. — Tomura beijou a cabeça de Izuku, o fazendo ter certeza ao o apertar, o abraçar mais forte.
— Você não achou outro brinquedo, certo?
Izuku sentiu Tomura parar, ficou nervoso, ansioso, paralisou também. Mais uma vez seu coração bateu forte a ponto de martelar na sua cabeça, se for isso não vai aguentar. Vai perder. Vai perder de novo. Não vai ter mais nada.
— Izuku, você acha que é um brinquedo? — foram as palavras de Tomura, Izuku começou a chorar novamente, soluçar enquanto dizia que amava Tomura, enquanto pedia, implorava, para ele dizer que o amava também.
E Tomura disse, a cada pedido de Izuku, a cada soluço que ele dava, Tomura dizia que o amava, que era mais importante que o mundo, que Izuku era seu mundo. Seu tudo. Faria tudo por Izuku, perderia tudo por Izuku. Que ninguém jamais poderia substituí-lo, Izuku era único, perfeito, seu único e sempre será.
Izuku já não estava triste, desesperado, ansioso, nervoso. Estava um pouco cansado. Só um pouco. Dormiu demais.
Não quer dormir agora, quer ficar com Tomura.
— Eu quero comer fora hoje, eu quero um encontro. — quer sair igual sua imaginação o mandou fazer, um restaurante chique.
— Sim Izuku, se é isso que quer, terá, meu pequeno.
As palavras de Tomura deixaram o rosto de Izuku quente, assim como seu coração.
Tomura o deitou na cama, e o beijou com toda a espera que teve durante todo dia, mas não passou disso. Deixou Izuku sentado, foi até o guarda-roupa e abriu todas as portas, olhando diversas vezes paras as roupas ali dentro e para Izuku.
— O que quer usar? Particularmente, penso que meu Izuku ficaria perfeito em qualquer coisa.
— Para com isso, eu quero usar seu moletom.
— Qual?
— Esse, o seu.
Com seu cotoco direito apontou para Tomura, queria usar as roupas dele, se sentir cercado pelo cheiro dele.
Tomura riu e tirou o moletom, o deixou pendurado no braço enquanto pegava uma roupa de baixo sua. Subitamente Tomura se lembrou que estava frio do lado de fora, e procurou rápido o coberto mais grosso e quente que os dois tem, logo voltou para Izuku.
Cuidadosamente Tomura o vestiu, mesmo sem necessidade para cuidado já que não tem muito o que cuidar. Se deixou ser carregado até a cadeira de rodas, Tomura o cobrindo e colocando o cinto em si. Admirou o rosto focado de Tomura, e pediu um beijo.
Não foi nada carnal, quando terminaram Izuku não quis deixar Tomura se afastar, espalhou beijos singelos por todo rosto dele, e Tomura se manteve ali até Izuku parar, recebendo todo afeto que seu Izuku queria o dar.
Izuku foi conduzido até a porta por Tomura, que teve certeza de levar a prótese de antebraço. Tomura pode amar alimentar Izuku, mas em lugares movimentados foi completamente proibido. O que o deixa triste, sabendo que ninguém sequer ousaria olhar para seu Izuku, ama e odeia toda essa timidez.
E os dois saíram, felizes, mais calmos, um com o outro. Ignorando as pessoas abaixando as cabeças para a mera presença de Tomura todo o caminho, Tomura Shigaraki, o ditador invencível, e seu marido e bicho de estimação, Izuku Midoriya, o herói caído.
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Limbs
Fiksi PenggemarOnde Midoriya sentiu uma coceira no antebraço e uma dor no pé. (Postada também no Spirit)