Senti o gosto salgado de sangue no canto da minha boca e isso fez com que eu lambesse vagarosamente bem onde estava o novo corte. Sorri de lado com isso, aprofundando meu olhar no meu adversário que me chamava com a mão. Abri os braços, pedindo gritos da plateia de bêbados que nos assistiam. Cuspi o restante de sangue no chão, voltando a rodeá-lo como se fosse uma presa, e ele era, daquelas bem fáceis.
Estava o cansando, era uma tática, um soco ou outro eu aguentaria, até bem mais que isso. Então permiti que ele acertasse alguns, mas eu conseguia observar o suor em sua testa, suas pernas ficarem mais lentas, sua respiração mais ofegante que antes. Ele estava se desgastando tentando me derrubar, mas ele não conseguiria, não daquele jeito.
— Tá cansado, princesinha? — provoquei, fazendo os caras rirem com minha provocação e só incitando ele a vir para cima de mim.
Desviei de um soco, de outro e bloqueei o terceiro com meu joelho, o acertando bem de esquerda. Ele cambaleou para trás, atordoado e voltou a me atacar, sem pensar porque estava com raiva e cansado. Sorri, rodopiando quando ele voltou a tentar me socar.
— Achei que íamos lutar, não valsar. — Usei aquele tom de provocação novamente, sentindo-o me acertar um bem dado no peito, fazendo com que eu tossisse um pouco, porém, logo voltei a rir.
Peguei o brutamontes de surpresa e lhe dando uma boa cotovelada na jugular, o ouvi tossir sem ar e aproveitei para dar mais um soco em seu estômago, outro em sua barriga e um último de baixo para cima em seu rosto. Aquele golpe o fez cair imediatamente no chão. Senti meus dedos latejarem um pouco e os balancei no ar, ouvindo os aplausos. Abri mais o sorriso e peguei minha caneca de cerveja, virando todo o líquido e quando fui pedir mais uma, vi os guardas do castelo adentrarem a taverna. Rolei meus olhos com isso.
— Príncipe null null Luther, seu pai ordena sua volta ao castelo imediatamente. — Bati a caneca na madeira do balcão, pegando o pano que tinham me dado para secar o suor e o sangue e, em seguida, a minha camisa mais encardida que o lugar em si.
— E se eu me recusar a ir? — arqueei a sobrancelha para eles e vi o silêncio se estender por todo aquele lugar.
— Ele ordenou para que nós o levássemos escoltado até o castelo então. Desacordado mesmo.
Então mais soldados entraram, acabei rindo daquilo e vendo que era algo bem do meu pai ter mandado mesmo. Bufei, imaginando que a briga seria boa e eu venceria, porém, o castigo seria pior depois. Então, apenas soltei o ar pesadamente e assenti para eles, os acompanhando novamente até o castelo sem resmungar como era de costume. Estava dolorido pela briga e meio atordoado por ter bebido bastante, mas já estava quase sóbrio para poder sentir todas essas coisas.
— Podem deixar que daqui eu sei o caminho para o meu quarto. — Dispensei todos eles quando entramos no castelo.
Eles assentiram e voltaram para seus postos fora dali. Fechei minha camisa que ainda estava aberta, notando que eu tinha perdido alguns botões naquela taverna, dei de ombros e quando olhei para cima para identificar em qual corredor eu estava, acabei dando um encontrão com outra pessoa, uma pessoa menor que eu e mais delicada, obviamente.
— Você não é uma parede. — null murmurou, os olhos semicerrados fixos no meu peito. Ela parecia estar vendo algo extraordinário a julgar pelo olhar concentrado. — Ei, por que você tá brilhando?
E então ela cutucou o meu peito, depois olhou para o próprio dedo como se não estivesse compreendendo nada.
Ela estava bêbada?
— Você nunca tinha notado meu brilho? Eu sou um príncipe e todos os príncipes brilham. Você também brilha. Estou perplexo que você nunca tenha notado. — Acabei me deixando levar pela brincadeira, porque eu iria zombar muito dela quando ela estivesse sóbria.
— Não. Ogros não têm brilho e você é um ogro. Não sei porque começou a brilhar agora. — null pressionou os lábios um no outro, confusa. — Mas eu brilho?
Ela olhou para o vestido e precisou piscar duas vezes para assimilar o que quer que ela estivesse vendo, pois seu olhar adquiriu um ar ainda mais louco do que estava segundos antes.
— Ai, meu Deus! Meu vestido está pegando fogo. — ela riu, maravilhada, balançando a saia de um lado para outro. — Mas não arde.
— Eu sou um ogro? Verdade, mas um ogro da realeza. — Rolei meus olhos, suspirando com a infantilidade dela com aquela mesma história de ogro. — Infelizmente brilha.
Apontei para ela inteira, ainda achando engraçado como ela estava completamente fora de si. Então acabei rindo alto, sem me aguentar mesmo.
— Não está pegando fogo. Nem o fogo te aguentaria, null. — comentei em resposta, em meio a risos.
— Um ogro da realeza não é muito melhor que um normal, só possui o título a mais. — deu de ombros, parecendo estar segurando o riso a julgar pela forma que sua boca estava levemente contraída. — Por que infelizmente? — perguntou, se referindo ao que eu tinha dito sobre ela brilhar.
Então ela abriu um sorriso torto, jogando seu cabelo ruivo no ar para mostrar um ponto.
— Eu sou o próprio fogo, por isso não me queimaria com ele.— retrucou, nada abalada pelo que eu tinha dito. — Deus do céu, tem dois de você? Você tem um gêmeo? Eu mal aguento um null.
Os olhos dela se arregalaram subitamente, focando em um ponto ao meu lado, depois voltando para o meu rosto.
Rolei meus olhos bem dramaticamente, mas acabei por rir. Sempre achei engraçado ela me chamar de ogro. null vivia em um conto de fadas até nos xingamentos.
— Olha só como ela sabe ser maldosa. Realmente me magoou muito ser chamado de ogro. — Fiz um biquinho como se fosse realmente chorar, sendo o mais falso que eu conseguia. — Porque o seu brilho quase me cega. — Tampei meus olhos ao olhar para ela, fingindo que me incomodava mesmo.
Mas acabei rindo, vendo que ela ria junto, e isso me fez ir parando aos poucos, percebendo que fazia anos que não ria junto com ela. Eram sempre xingamentos e troca de farpas, mas nunca uma risada compartilhada. Aquilo era incomum.
— O próprio fogo? Sei. — Debochei, encarando-a inteira, duvidando claramente disso.
null revirou os olhos, preferindo ignorar a minha provocação, o que só ressaltava o quão null ela não estava. Então, encarei meu próprio lado e franzi o cenho com a sua pergunta. Prendi levemente meu lábio, segurando a risada e voltei a olhar para ela.
— Tenho sim. Ele chama ... Klous. — Segurei a risada dessa vez. — Eu sou mais legal que ele. — falei sério, retraindo os lábios e os umedecendo como se estivesse falando a verdade verdadeira mesmo.
— Klous e null? Criativos... — ela fez uma careta, ponderando os nomes, mas não conseguindo disfarçar como tinha achado estranho o nome do gêmeo. — Você é o mais legal? Klous deve ser o próprio diabo para ser pior que você.
— Criativos demais, eles sabem. — Engoli a risada, não querendo explodir em risos novamente e voltando a fingir ser a verdade mais verdadeira mesmo. — Talvez você sónos ache chatos porque a chata de verdade é você. Já parou para pensar nisso? — Soltei a pergunta baixinho, tocando levemente sua têmpora com o indicador, indicando para ela pensar sobre aquilo.
null me olhou por um momento, depois riu, parecendo achar graça.
— Eu não sou chata. Só com quem merece. Você, por exemplo. — apontou para mim, depois para o vazio ao meu lado. — Vocês, no caso.
— Ótimo, porque eu te trato da mesma forma. Não há injustiças entre nós dois, olha só que maravilha! — usei um tom de falsa alegria e até bati uma palma. — Ah, e o Klous também. Ele te trata da mesma forma. Enfim... — franzi de leve meu nariz, querendo rir.
— Já parou para pensar que você é o único que não gosta de mim? Vocês, no caso. Provavelmente porque são os idiotas da história. E eu já ouvi muita gente falar mal de você, então não sou a única que enxerga a verdade. — ela falou casualmente, mas fez uma careta do nada. — Você tá péssimo! E fedendo. Os dois estão.
— Só para constar também, você foi chata comigo primeiro. — Claramente me fiz de vítima, mas eu realmente não lembrava quem começou com a birra com quem ali. — Eu prefiro que falem mal mesmo. Não sou bonzinho e muito menos cavalheiro. Sou um guerreiro, um soldado, não fui criado para ser delicado.
O que era bem a verdade, meu próprio pai me colocava em treinamentos pesados e eu tenho cicatrizes pelo corpo para comprovar isso, mas eu não dava a mínima para null.
— Eu não fui chata com você primeiro, tenho certeza! Eu era apaixonadinha por você quando era criança, não ia querer brigar se você não desse motivo. — Confessou, a voz soando esganiçada pela indignação. — Eu conheço guerreiros e soldados bem educados, sabia? Não é questão de ser delicado, só decente e não um principezinho mimado.
— Mas não serei eu a abalar seu ego inflado dizendo o que as pessoas falam de você por trás. Descubra por si só ou continue vivendo no país das maravilhas, princesinha.
Ela bufou e ignorou o que eu acabei de falar, preferindo sair na frente.
— Droga, tá vendo só? Eu me perdi por sua culpa. — resmungou, mudando de assunto e freando abruptamente no meio do corredor.
Arregalei meus olhos com a informação que eu tinha recebido da própria fonte e então comecei a rir, não tinha nem tentado segurar o riso, apenas ri.
— Apaixonadinha por mim? — Apontei para mim, ainda rindo meio incrédulo. — Então a princesinha de Aleudoria já gostou do ogro. Bom saber... — Aprofundei meu olhar nos olhos dela, mordendo meu lábio inferior.
null se arrependeria a cada segundo por ter soltado aquilo para mim.
— Eu era jovem e ingênua, null. Tinha ideias fantasiosas sobre romance já que somos noivos há anos, mas agora eu sou muito orgulhosa por ter superado aquilo e te enxergar como você realmente é. — ela explicou com impaciência. — Mas isso não importa no momento. Para onde você estava indo? Eu estava indo para... Um jantar?! Eu realmente não lembro.
O olhar de pura confusão no rosto dela seria trágico se não fosse cômico.
— Sei que eu estava indo para o meu quarto mesmo. — Comentei, também me esquecendo que eu tinha que tomar banho para a... — A festa! — soltei, porque provavelmente era para onde ela estava indo.
— Você está realmente precisando de um banho. — null me olhou de cima a baixo, enrugando o nariz após a avaliação. — Está fedendo.
Tive que respirar profundamente um monte de vezes para a crise de riso passar porque tinha sido muito engraçado o que ela tinha me confessado, tinha sido um presente.
— Mas isso quer dizer que ogro já esteve nos seus critérios. Bom saber... — Passei a mão em meu queixo, rindo mais uma vez. — E que bom que hoje em dia está fora de questão. Apesar de tudo, eu não iria querer partir seu coração. — Pisquei um olho para ela.
Até porque eu nunca corresponderia a qualquer sentimento que ela tivesse por mim. Cruzes, eu a vi crescer e ela era insuportavelmente chata, não tinha nem como sentir algo por ela. Impossível. Zero chances.
— É fofo você acreditar que conseguiria partir meu coração. — ela riu, jogando a cabeça para trás em deleite.
— Está me cheirando, Turner? — Fiz uma careta para ela.
Mas eu estava mesmo, fiquei bebendo o dia todo e brigando. Era normal estar sujo, mas eu não era fresco como ela era.
— O seu cheiro está exalando, Luther. Para você ter noção de como está péssimo. — ela suspirou, olhando para o fim do corredor. — Eu preciso que você me leve ao salão, não sei chegar lá.
— Sinto muito para você, mas eu preciso primeiro tomar um banho e escolher minha roupa... — Esbocei uma careta nada contente. — Não posso escolher minha própria roupa, seria um verdadeiro caos.
— Que tipo de pessoa não sabe escolher a própria roupa? — ela me olhou perplexa.
— Só fui treinado para ser um excelente guerreiro, saber liderar minhas tropas e não deixar meu reino entrar em guerra. A parte das roupas nunca me foi passada não. — Respondi prontamente, rolando meus olhos com isso. — A questão é que você não sabe chegar na festa e eu preciso estar nela também.
— Um adulto funcional sabe escolher a própria roupa. — pontuou, agarrando meu pulso. — Vou escolher sua roupa e você vai me levar até o salão.
Não foi um pedido, nem um acordo, foi praticamente uma exigência enquanto ela me arrastava pelo corredor — indo na direção contrária à que seria a do meu quarto.
Levar ela daquele jeito para a festa seria uma péssima ideia, mas eu estava sem opções e meu pai parecia gostar dela. Não sabia o porquê. Ela era insuportável.
— Talvez não seja uma boa ideia você ir ao baile... — Sussurrei isso, não sabendo ao certo se ela tinha ouvido, confuso sobre fazer isso com ela ou não. — Afinal, o que foi que você tomou? E o seu pé? — olhei para baixo, vendo que ela caminhava muito bem.
— Eu também achei que não fosse, mas o convidado é importante e a rainha queria muito que eu estivesse presente. — Explicou, alegre demais. — Então eu convenci o curandeiro a me dar a mistura para dor que eu ouvi as criadas comentarem. Funcionou bem, não estou nem sentindo o meu pé. Prontinha para dançar!
— Deve ser mais um velho centenário chato e entediante. Nada de novo. Festa chata com gente velha. — Murmurei, totalmente contrariado de ir à festa. — Você tá claramente parecendo uma bêbada que abusou demais. — Apontei para ela inteira, rindo nasalado enquanto caminhava com ela até meu quarto.
— Eu estou perfeitamente bem! — Retrucou na defensiva. — E muito mais apresentável do que você.
Sabia que não era nada apropriado entrar com ela lá dentro, ainda mais sozinhos e isso nos traria muitos problemas mesmo. Mas sabia que se falasse para ela não entrar lá agora, teria que ir com ela naquele estado e também levaríamos a bronca. Quer dizer, no caso eu levaria. Inferno!
— Fique à vontade, eu vou tomar banho. — Anunciei, quando abri a porta do quarto. — Vou precisar fechar a porta e pedir para que você não atenda caso algum guarda ou qualquer outra pessoa bata na porta. Você pode fazer isso, não é?
— Você já percebeu que esbarrar em você só me traz problemas? — Ela suspirou, entrando atrás de mim no quarto. — Primeiro foi um tornozelo quebrado, agora, por conta desse tornozelo, eu estou cheia de ervas que não faço ideia do que são e estou no seu quarto. No seu quarto, null. Eu preciso me lembrar de andar com uma dama que me mantenha longe de você.
— Posso te dizer a mesma coisa, princesa Turner. Só me traz enormes problemas e ainda mais festas chatas para ir e bancar o noivo perfeito para você! — Retruquei, rolando meus olhos e soltando o ar enquanto caminhava para atrás do biombo.
— Não é minha culpa se você é obrigado a comparecer a eventos, null. Você é um príncipe, são obrigações, lide com isso. — Ela rebateu, dessa vez soando irritada como a null normal faria.
Decidi não responder e a deixei sozinha no meu aposento, vendo que meu banho já tinha sido deixado preparado e provavelmente estavam atrás de mim, então apenas me despi e entrei na água que já não estava na temperatura que eu gostava, afinal, eu tinha demorado bastante para vir. No entanto, me banhei assim mesmo, tirando o sangue dos meus dedos e lavando bem o meu rosto, sentindo arder levemente o corte no canto dos meus lábios.
Devo ter demorado mais de dez minutos, enrolei o pano grosso branco em volta da cintura e voltei para o quarto, lembrando que a null estava lá e quase voltei para o banheiro. Mas ela parecia estar...
— Não é que dormiu mesmo... — Murmurei baixinho, negando com a cabeça. — null? — chamei.
— Não estou dormindo. — ela resmungou, descruzando as mãos que estavam em cima da barriga. — Mas podia. Sua cama é mais confortável que a minha.
Soltando um muxoxo descontente, null sentou na cama e lentamente abriu os olhos, focando em mim. Ela piscou, depois piscou novamente e depois de uma olhada que eu não pude deixar de notar, ela desviou o olhar para a parede rapidamente.
— O que você acha que está fazendo? — Exigiu, fechando os olhos. — Volta para onde você estava e espera lá até eu encontrar o que você vai vestir.
— O banho foi tão relaxante que eu até esqueci que você está aqui no meu aposento. Já era para você ter escolhido a roupa também. — Rolei meus olhos, segurando o pano com certa força para voltar para trás do biombo.
No entanto, ouvi passos no corredor juntamente das vozes de minha mãe, o bispo e claramente as outras pegadas eram dos guardas e aquilo me fez arregalar os olhos e olhar null no mesmo momento. Corri até ela e tampei sua boca.
— Fica quieta que ninguém pode te ver no meu quarto e principalmente comigo junto e despido dessa forma. — Falei extremamente baixo, ouvindo as vozes se aproximarem.
— O quê? — Ela pulou da cama, alarmada. — Eu não posso... O que você tá fazendo?
Acabei puxando null comigo para dentro do armário e nos fechando lá dentro, encarando os olhos null da princesa.
— Não faz nenhum barulho. — murmurei pausadamente, ouvindo eles adentrarem o quarto e a voz da minha mãe invadir o cômodo, chamando por mim.
— Essa é a solução que você encontrou? Me esconder com você no armário? Não podia ter só me escondido? — ela sussurrou, praticamente gritando em tom baixo. — É melhor você sair.
null parecia tudo, menos calma. A respiração dela estava tão ofegante que eu não duvidava que ouvissem caso chegassem mais perto do armário, sem contar que ela estava inquieta, trocando de peso de um pé para outro, fazendo seu corpo esbarrar no meu a cada segundo.
Em toda minha vida nunca pensei que ficaria preso com a null em um armário e somente com um pano enrolado na cintura. Parecia castigo!
— Se eu sair agora, eles vão te ver, esperta! — rebati, falando extremamente baixo e negando de leve com a cabeça.
Desejei que minha mãe só desistisse de me procurar ali logo para acabarmos com isso. Era constrangedor demais. Inspirei profundamente, totalmente desconfortável com aquela situação, então talvez pelo nervosismo e a tensão do momento algo escapou da minha boca.
— Seu perfume é bom, princesa. — Minha voz tinha saído tão baixa que eu podia até torcer para ela não ter ouvido, mas não demonstrei arrependimento também.
Houve uma pausa silenciosa aqui dentro, o que me fez ter certeza que null estava surpresa com o que eu tinha acabado de falar. Não dava para vê-la direito, mas tinha certeza que ela estaria me olhando desconfiada agora mesmo.
— Eu sei. — ela respondeu. — E você tá perto demais.
Estava quase batendo minha cabeça naquela madeira e provocando um desmaio para poder sair logo daquela situação. Ainda mais por ter soltado que ela tinha um perfume bom. Estava bêbado por acaso? Que péssimo dia que eu levantei da cama. Deveria ter continuado deitado.
null tentou se afastar de mim, mas o armário era apertado com duas pessoas nele e eu ocupava pelo menos metade do espaço, o que resultou em null tropeçando para trás novamente e caindo contra mim.
— Que coisa! — grunhiu baixinho, segurando nos meus braços. — Eu preciso parar de cair em cima de você.
Por ela ter quase tropeçado, isso fez com que eu segurasse em sua cintura com força, a puxando contra mim para que ela não caísse. Prendi meu ar de forma automática quando encarei seus olhos null, e por mais escuro que estivesse naquele armário, consegui enxergá-los perfeitamente, ainda mais tão perto daquele jeito. Estávamos tão próximos que sentia até nossas respirações parecerem se embolar.
— Não torça o pé mais uma vez e não nos faça sermos descobertos também, por favor. — Murmurei, ficando desconfortável por tê-la deixado ainda mais perto de mim, então soltei sua cintura de imediato também. — E tenta não se mexer muito, esse... esse.... — Rolei meus olhos por não conseguir explicar. — Não se mexe, tá? Parece que o pano está se soltando, fica calma e não olha para baixo.
Tentei deixá-la calma, mas a culpa tinha sido dela que quase caiu, e o pano enroscou no vestido dela. Desci minhas mãos, puxando o pano de seu vestido e tentando prendê-lo calmamente naquela escuridão e quase saindo dali mesmo para expulsar aqueles enxeridos do meu quarto que estavam debatendo sobre onde eu estaria.
null soltou um barulho esganiçado que podia ter sido um xingamento, um choro ou um grito abafado, mas que não me interessava de verdade, contanto que não ouvissem.
— Que péssimo dia para sair da cama, que péssimo dia para sair da cama... — Ela repetiu, tentando se acalmar. — Eu não quero mais ir para a festa. Eu quero voltar para o meu quarto e ficar o mais longe de você que seja humanamente possível, porque isso é mais contato do que eu posso tolerar por uma vida toda.
— Graças aos Deuses! — soltei aliviado. — Porque já foi comprovado que nós dois juntos no mesmo ambiente não dá certo de forma alguma. O azar vem acompanhado. Não é possível! — Até mesmo quis rir daquilo e tive que engolir aquela vontade de gargalhar da minha própria desgraça.
Felizmente uma das vozes no quarto falou algo sobre voltar para a festa e os outros concordaram, embora relutantes. Minha mãe falou algo sobre mandar alguém para me procurar e que ela iria à procura de null para que pudessem ir juntas para o salão.
— Eu adoro a sua mãe, mas no momento eu nunca a odiei tanto. — null murmurou.
Concordei com ela quanto àquilo porque até eu estava odiando minha mãe naquele momento. Então, assim que saíram do aposento e eu ouvi a porta sendo fechada, abri um pouco o armário só para me certificar que ninguém ficou ali para trás e saí em seguida ao ver que estávamos sozinhos novamente.
— Isso foi terrivelmente horroroso em todas as formas possíveis. Que noite horrível! — esbravejei, passando as mãos no meu cabelo e o puxando para trás. — Que não nos encontremos mais por essa semana. — Virei meu rosto e a olhei por cima do meu ombro.
— Podemos esquecer essa noite, por favor? — Ela praticamente implorou, saindo do armário logo em seguida. — Porque eu já tive o suficiente de você e do seu gêmeo.
Ela respirou fundo, olhando ao redor do quarto como se esperasse encontrar alguma coisa.
— É isso, eu estou aceitando o convite para passar uns dias com a Isis. — falou, voltando a me encarar. — Não acho que sobrevivo mais uma semana aqui se continuarmos nos encontrando dessa forma.
— Já esqueci. — Foi o que respondi sobre esquecermos aquela noite horrível.
Por mim, deletava todos nossos encontros e estava bom demais. Queria provar ao meu pai que não tinha condições de fechar acordo algum com o reino dela, porque ao mesmo tempo que poderia unir os reinos, poderia causar uma guerra interna. Todo dia seria uma batalha com ela perto de mim.
— Pobre princesa Isis. Apesar de conhecer a princesa Isis muito bem e saber que ela se dá bem com muitas pessoas mesmo, até mesmo com você. — Torci o nariz, porque a null era insuportável e a Isis era simplesmente uma das minhas melhores amigas. — Mas olha, te escolto até o navio se quiser e ainda lhe desejo uma excelente viagem e um "volte quando eu não estiver".
— Fique à vontade para cair do cavalo e quebrar o pescoço enquanto eu estiver fora. — Ela sorriu docemente, andando em direção a porta. — Então eu voltaria quando você não estivesse.
Sem olhar para trás, null abriu a porta do quarto, espiou o corredor e só então olhou para mim novamente.
— Você é um doce. — Disse com certo amargor no meu tom de voz.
— Eu tenho que parar de esbarrar em você e você precisa parar de me arrastar para lugares escuros. — Ela falou, praticamente se escorando na porta agora. — O palácio é grande o suficiente para nós dois, então vamos evitar esses encontros a qualquer custo. Não ligo se você não me quer aqui. Eu não quero estar aqui, mas precisamos lidar com isso e enquanto não formos obrigados a casar, acho que conseguimos manter distância para o bem da nossa sanidade.
— Ótimo. Perfeito, na verdade. Vamos estabelecer um acordo. — Falei, me aproximando dela novamente e estendendo a mão para ela como se fôssemos mesmo fechar negócios. — Sem precisarmos ficar perto até sermos oficialmente obrigados a isso. Temos um acordo?
— Temos um acordo. — Ela concordou, apertando a minha mão.
E então se virou e saiu do quarto, mancando pelo corredor na direção bem contrária ao que deveria ser o quarto dela e também na direção errada do salão onde estava acontecendo a festa. Eu poderia ter avisado, mas ela podia descobrir o caminho sozinha.
Quis rir daquilo, mas estava tão exausto daquela situação toda que acabei nem rindo e fechando a porta logo em seguida. Não tinha condições de conviver com ela.
Não iria, me recusContinua...
esta historia foi tirada de um site chamado de Fanficobssesion
VOCÊ ESTÁ LENDO
Dinastia
RomanceLigados por um acordo feito mesmo antes de nascerem, a única coisa que une o Príncipe da Humpbrey e a Princesa de Aleudoria, além da promessa feita por seus pais, é o ódio mútuo que nutrem desde a infância. Forçados em um casamento arranjado pelo...