01. there is one side of the story...

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Lysander sempre se sentiu livre para fazer o que bem entendesse, afinal a criação de Luna e Rolf, apesar de muito excêntrica, foi muito aberta. "Não" era uma palavra raramente dita e, mesmo quando era, vinha acompanhado de um "mas", com explicações do porquê algo ser proibido e com eventuais concessões.

No mais, tudo era possível, e o mundo era um prato cheio de possibilidades.

Por isso, Lys nunca teve problemas em se mostrar para o mundo como queria: cabelos longos, eventualmente com cores aqui e ali - já havia tido todas as cores do arco-íris em seus fios -, piercings, roupas extravagantes, pés descalços sempre que possível e interesses peculiares - o total oposto de seu irmão, mas que, à sua maneira, também se mostrava para o mundo como desejava.

Lysander gostava de quem era e nunca se limitava a nada. Se alguém o definia enfaticamente como algo, ele não gostava. Não queria ser uma coisa só, porque era várias coisas ao mesmo tempo. Gostava de sua pluralidade, ainda que parecesse confuso para algumas pessoas. Ele simplesmente não ligava.

Quando começou a beijar meninas e logo teve interesse em beijar meninos, não parou para pensar muito a respeito. Estava fazendo o que queria e ninguém tinha nada a ver com aquilo. Mas, claro, perguntas foram feitas. Todos com as caixinhas da sexualidade em mãos, prestes a colocá-lo em uma delas apenas para se sentirem bem consigo mesmos, afinal, as pessoas simplesmente tinham a necessidade de tentar compreender tudo o tempo todo, como se só existisse a possibilidade de ser uma coisa ou outra. Não havia a possibilidade de "não se definir". O fato de Lysander nunca ter se rotulado incomodava e ele sabia, a questão era que ele não se importava e, felizmente, seu círculo pessoal também não podia se importar menos.

E, durante dezesseis anos, Lysander viveu muito bem com suas certezas sem necessidade de reafirmação ou explicações, obrigado. Até que ele entrou em sua vida e revirou absolutamente tudo, tirando sua paz interior e levando-o para uma montanha-russa emocional incontrolável.

No início, Lysander o tratou como qualquer outra pessoa que ele beijava, exceto por um pequeno detalhe que o preocupou: ele era o irmão de sua ex-namorada. Por mais que Lys não se importasse com falatório, importava-se com os sentimentos de quem já havia passado por sua vida e, querendo ou não, o término ainda estava fresco, com pouco mais de dois meses passados. No entanto, a atração é um monstro difícil de controlar e, como qualquer adolescente com os hormônios à flor-da-pele, Lysander cedeu.

Olhando em retrospecto, Lysander agora sabia que o fato de estar beijando às escondidas o irmão de sua ex era o menor de seus problemas e queria chorar toda vez que pensava no assunto.

Ah, se ele soubesse.

Um beijo levou ao outro, e mais outro. E tantos outros mais.

Tantos, que Lysander perdeu as contas.

E tanto fazia quantos beijos haviam sido, afinal ninguém estava contando, porque ninguém estava vendo, e seu affair fazia questão de garantir que continuaria dessa forma.

Lysander estaria mentindo se não dissesse que, em um primeiro momento, gostou do mistério e das escapadas nos armários de vassoura. Não devia nada a ninguém, não tinha obrigação nenhuma de contar. Era perfeito.

E, de fato, foi perfeito. Por três meses foi perfeito. Por mais três também. Até deixar de ser.

Agora, quase um ano depois, era o completo oposto de perfeito.

Havia acontecido o inevitável: Lysander se apaixonou. E Lys, por ser esse furacão de emoções e certezas ambulante, não via mais sentido em esconder tal sentimento. Afinal, o amor era supostamente para ser celebrado, certo? Não havia dúvidas disso. O problema era que, enquanto Lysander queria gritar ao mundo, ele estava relutante. E Lys respeitou, mantendo-se quieto sobre o assunto.

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