E as férias de julho chegaram...
Tentava me consolar com a probabilidade de perder minhas aulas e tratava de estar muito junto das crianças e melhorando uma coisinha ou outra na casa.
Uma coisa que me preocupava era saber se o diretor do Ginásio encontrara uma substituta para os meus horários.
O mês de julho se escoava e eu aguardava ansiosa. Como o tempo passava e nada de notícias, achei que seria substituída e, a bem da verdade, andava triste por perder os alunos. Como eu disse anteriormente, gostava demais de dar aulas e me sentia realizada. O progresso da garotada me enchia de satisfação. Além disso, o ordenado no fim do mês, apesar de ser pouco, me proporcionava uma liberdade da qual eu não poderia mais abrir mão. E o melhor é que o Geraldo não reclamava mais.
Na semana anterior ao começo do segundo semestre, o professor Martello esteve lá em casa. Achei que ele iria comunicar meu desligamento e o recebi com o coração apertado. Foi quando tive uma imensa surpresa: ele, canhestramente, disse que precisava que eu continuasse, porque não conseguira uma professora para me substituir.
"A senhora sabe... meio do ano é difícil... desalojar uma pessoa com família no meio do ano é muito complicado, porque depende de muitos fatores... a pessoa já está contratada noutra escola por um ano... se tem marido, às vezes não pode mudar de emprego assim, de repente... eu lamento ter de lhe pedir que continue..."
E continuou:
"Além de tudo, dona Walkyria, a senhora tem sido muito eficiente no seu trabalho. Estou muito satisfeito e, falando a verdade, não me empenhei muito em substituí-la."
Olhei para ele espantada e não pude deixar de observar:
"Mas... professor... vai ser difícil convencer o Geraldo... O senhor lembra? Consegui convencê-lo porque seriam apenas três meses... mas agora... Eu também estou muito feliz em trabalhar no Ginásio, seu parecer é uma honra, e eu, sinceramente, gostaria de continuar... mas... não sei como fazer para convencer meu marido..."
"Por favor, dona Walkyria, tente! É importante que a senhora continue! Não tenho mais para quem apelar! Precisamos da senhora neste semestre... Nas férias maiores será mais fácil procurar quem lhe substitua".
"Vou tentar, professor... vou tentar..."
Quando ele saiu, fiquei num misto de alegria e apreensão... Alegre porque tinha uma boa chance de continuar dando aula e apreensiva por temer a reação do Geraldo.
Foi difícil... tivemos uma conversa bem desagradável. Eu aleguei estar sempre só, com ele sempre viajando e nunca parando em casa, mesmo quando estava na cidade. Ele não teve como alegar a casa mal cuidada, e, felizmente, não tocou no assunto, porque eu me desdobrava para estar tudo a tempo e à hora. Ficou emburrado, sem falar comigo, uns dois dias e eu quieta, não falei mais nada. Quando afinal eu lhe disse que precisava dar uma resposta para o professor Martello e queria saber o que lhe diria, ele, muito contrariado, disse:
"Tá bom! Continue nessas aulas! Você não vai me dar sossego mesmo, se eu não aceitar essa *&%*&! Só quero que as crianças estejam bem... Vê lá o que você vai fazer! Não acha que já tem bastante o que fazer?"
Eu, alegre, pulei no pescoço dele e o beijei muito. Fizemos as pazes e eu também fiquei em paz... tudo daria certo.
E assim, voltei ao Ginásio e aos meus alunos, sempre preocupada em não dar motivo algum para o Geraldo me cobrar, quanto à casa e às crianças. Tinha boas ajudantes mas, mesmo assim, minha jornada era dupla ou tripla, sem descanso.
Outra coisa estava me incomodando:
A cozinha da nossa casa fora construída anos antes, como um "puxado" de meia-água e agora, quando chovia, escorria água na emenda com a casa e Geraldo estava incomodado com aquilo. Eu pedia a ele que fizesse uma cozinha de alvenaria e, nessa construção, aproveitasse para fazer um quarto de empregada, um banheiro e uma despensa. A casa ficaria ótima! Geraldo custou um pouco, mas acabou procurando o dr. Lázaro Pàrellada, na época diretor do DEOE (Departamento de Edificações e Obras do Estado) que não demorou em vir inspecionar nossa cozinha, se comprometendo com os protocolos de autorização da obra. A "nossa" casa, na verdade, era parte da Inspetoria de Terras, por isso a necessidade de autorização oficial para uma reforma.
É claro que eu fiquei animada, e logo desenhei um esboço, grosseiramente, de como queria que ficasse a nova cozinha.
O dr. Lázaro também lecionava no Ginásio e nos encontrávamos sempre na sala dos professores, na hora do recreio.
Também não demorou muito para ele me comunicar que tinha conseguido a autorização para fazer a obra e, quando ele foi lá em casa resolver com o Geraldo como fariam, eu lhe dei o meu desenho, que foi motivo de riso dos dois engenheiros. Apesar de tudo, o dr. Lázaro disse que dava para entender o que eu queria e, pelo meu desenho, ele faria a planta final da construção.
Uns vinte dias depois, começaram a obra. Tivemos que mudar a cozinha para a sala e ficamos meio atrapalhados com a confusão por uns dois meses. Os barracões que se ligavam ao pátio foram derrubados e também a cozinha velha. A casa iria ficar muito mais clara depois da construção pronta.
No Ginásio, eu me sentia cada vez mais entrosada e participativa.
Conheci várias professoras e professores e tínhamos sempre uns momentos de "relax" no horário de recreio, quando conversávamos sobre amenidades ou acontecimentos recentes na cidade.
Para mim, tudo estava bem e eu me tornava cada vez mais "mourãoense". Continuava participando também da APMI e fazendo os programas de rádio, pedia sempre orientação ao pediatra Dr. Eugenio Lapezak sobre o que eu poderia falar e recomendar às mães, como primeiros socorros e sobre alimentos e aproveitamento de verduras e legumes.
E os dias passavam, trabalhosos e cheios de vida...
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Folhas do Outono
Non-FictionMemórias de uma história real que abrange cinco gerações. Walkyria é neta orgulhosa dos personagens mais antigos, que viveram no final dos anos 1800, e é avó da "galera" nascida no final dos 1900. O leitor é levado numa viagem no tempo, com passa...