Capítulo III - Joguetes

228 27 24
                                    

"Jingyi, venha almoçar", A-Luo estava na porta do quarto, chamando pelo mais novo com um sorriso.

A-Luo era uma senhora um pouco sistemática quando se tratava dos horários das refeições, não deixando ninguém sair de casa antes do almoço. E as risadas frequentes na casa eram de sua neta, Xiaoyou, uma criança muito alegre e que podia ser barulhenta às vezes. A casa era simples e não tinha muitos móveis, o que a deixava mais espaçosa, também era limpa e em uma das paredes construídas com ripas de madeira estavam as marcas da altura de Xiaoyou conforme crescia. Enquanto estava ali, Jingyi fez pequenos reparos nos telhados, no chão e no jardim, porque não gostava da sensação de ser hospedado e não dar nada em troca. Ele só estava pensando em onde ficaria depois dali e se teria que construir a própria casa.

Um dia, enquanto encarava as marcas na madeira, com a idade escrita ao lado, ele percebeu que do outro lado da sala havia outra fileira de marcas. Provavelmente de outra criança. "Senhor, aquelas são as marcas de sua neta, certo? Se importa se eu perguntar de quem são as outras?"

O senhor que estava sentado na cama se inclinou levemente para discretamente espiar a porta, como garantia de que ninguém estava ouvindo. "Essas são de quando minha filha tinha a idade da Xiaoyou."

Jingyi não disse nada sobre isso, apenas que havia entendido. Ele guardou sua curiosidade para não fazer perguntas indelicadas e presumiu que houvesse uma história muito triste por trás daquelas marcas, que não foram orgulhosamente mostradas como as de Xiaoyou. Um semana depois, quando o senhor Bai voltou a ter boa saúde, ele mostrou a Jingyi como suas suposições estavam certas.

O senhor Bai acordou às 7 da manhã, sentindo por isso que havia recuperado suas forças e foi até a cama improvisada na sala acordar Jingyi que para sua surpresa - mas não a nossa - já estava acordado desde as 5 da manhã.

"Junte todas as suas coisas e cuide para não esquecer nada, rápido."

Mesmo Jingyi perguntando repetidas vezes sobre onde iriam, o senhor Bai não o dava uma resposta clara, e a forma como ele sorria deixava Jingyi com dúvidas se estava sendo expulso dali ou não. Mas não estava. Jingyi tinha poucas coisas e eles logo fizeram caminho pela floresta enquanto o velho Bai lhe contava algumas histórias sobre a própria família.

Bai, "Quando minha filha nasceu, ela era tão pequena que eu pensei que talvez estivesse doente. Ficava tanto tempo só observando ela, que ainda nem havia aberto os olhos, e acabava sendo inútil em casa. Ela ocupou um espaço no meu coração que ninguém jamais poderia, além dela." Ele sorria de uma forma melancólica, mas não pesarosa, marchando na frente como só quem sabe o caminho. "Quando ela trouxe um noivo pra casa, ainda era só uma criancinha pra mim. Eu até mesmo joguei água nele e o chutei para fora, A-Luo não me impediu também. Mas minha filha me convenceu facilmente. Uma garota não deveria ter que implorar ao pai por um relacionamento, eu senti isso quando pedi a mão da minha esposa ao pai dela. Eles se casaram em alguns meses e assim como eu construí minha casa, ajudei a construir a deles."

Eles já haviam caminhado pro quase uma hora quando chegaram ao destino. Jingyi tinha o ar quieto e respeitoso de quem visita um túmulo, porque já sabia do que se tratava aquilo, "E esta é a casa...?"

Bai, "Eles foram muito felizes nessa casa, antes que ambos morressem. Eu sei que você ficou incomodado por estar na minha casa, este velho desconhecido, mas se você se sentir a vontade, pode ficar aqui. Nós só mantemos a casa, mas não usamos ela."

Jingyi arregalou os olhos, "Como eu poderia...?"

Bai, "Não vai ser para sempre, de qualquer forma. Você não é o tipo de pessoa que vai aceitar viver em uma floresta até o fim, é?"

Beijo doce, remédio amargo. [LingYi]Onde histórias criam vida. Descubra agora