Coração Partido

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Algo na maneira como Crowley o encarava, os lábios torcidos em repugnância, os olhos faiscando de puro ódio em uma fúria que Aziraphale antes só via direcionada a outras pessoas, nunca para ele, o fez perceber que aquela vez era diferente de todas as outras. Que já não estava mais em um terreno familiar.

Havia passado dos limites. Chegado a um ponto onde Crowley não conseguiria mais perdoá-lo sem primeiro odiá-lo antes. Seus batimentos aceleraram, ecoando e enviando vibrações por todo seu corpo, por algum motivo, em total pânico, tenso como alguém em risco de vida. A culpa ,que já o flagelava tortuosamente, agora queimava na carne viva.

Um arrepio, horrível, eletrizou em sua pele ,pois, naquele momento, não reconhecia aquele Crowley diante de si.

Aquele Crowley tinha uma expressão tirana no rosto, assustadora, o encarava com tamanho desdém que palavra alguma precisava ser dita para que Aziraphale soubesse o quão odiado era naquele instante. Aquela não era somente a expressão de alguém machucado, era ,também, a expressão desesperadora de alguém que havia sofrido uma traição da qual nunca esqueceria.

Sem que esperasse, o contato visual foi rasgado bruscamente e tudo que Crowley fez foi lhe dar as costas com uma frieza de partir o coração. O escutou respirar fundo, o assistiu levar a mão ao rosto em uma atitude que poderia ser desistência ou auto-controle, e , por algum motivo, aquela atitude foi a que doeu mais.

Não lhe deu conforto perceber que ele abriu mão do escândalo, da recriminação, das palavras brutais e acusadoras que o fariam irromper em lágrimas. Notar aquilo só lhe deu a certeza de que tinha atingindo o outro de tal maneira que a raiva, a luta, os gritos, não eram suficientes para que Crowley liberasse tudo que estava guardando, que agora, nem depois do inferno, o teria de volta como tinha antes.

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