Ela.

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Em algum lugar deve existir pessoas que se importam.

Repito isso toda vez que ela chega.

Isso quer acabar comigo.
Eu não sou assim, é como se aquele brilho que todos costumavam notar simplesmente desaparecesse com a chegada dela.

Mesmo assim me contento com o sorriso forçado e continuo andando.

— Cora!! — paro assim que escuto Aila me chamar, pousando a mão no meu ombro e retribuindo o sorriso.

Péssima hora para me notar, Aila.

— Quer jogar com a gente? Você está tão estranha ultimamente...

Você que só percebeu agora.

Sorrio de canto e aperto a alça da mochila.

— Na próxima, ok? Tenho um compromisso agora a tarde, nem tem como...— digo num suspiro e percebo o olhar dela no meu rosto.— De verdade, na próxima eu apareço.

— Não sei...Mas já que não quer, ok. Tchau!!!

Ela se despede e sinto ao menos uma mísera parcela de alívio. Aperto o passo e desço as escadas rapidamente, virando a direita.

Eu só tinha que chegar em casa, apenas isso.

Um passo de cada vez, Cora. Um passo de cada vez.

Esse sentimento é normal. Mas ela não é normal.

Não consigo respirar. Não consigo pensar. Nem detalhar o que está ao meu redor.

Mais rápido.

Aperto o passo, segurando as lágrimas.

Não posso deixar ninguém preocupado, eu tenho que fingir.

Ela vai embora um dia. Mas vai voltar...

Fecho os olhos fortemente e sinto que minha respiração estava como se eu corresse uma maratona, e não era nada disso.

Prendo os cachos rebeldes em um coque e volto a caminhar, tentando ao menos contar as árvores, sem sucesso.

A sensação era de que o mundo ia cair em mim.

E talvez fosse, realmente.

Seria lindo se não fosse trágico.

Mas a minha vida não é uma sinfonia de Beethoven ou uma trama de Shakespeare, por mais que o ar lúgubre caísse bem em mim.

— Cora!!

Ah, não.

— Oi...— olho para trás e vejo o Vitor sorrir pra mim, se aproximando. — Está indo para casa da sua tia?

— Uhum...

Digo de modo desinteressado.

Quantas vezes eles vão me interromper?

— Então vamos juntos. Vou para o meu pai hoje...

— Ok.- digo tentando não reclamar, apenas queria ficar sozinha. Estava sendo horrível disfarçar a todo momento.

— O que achou de hoje?‐ ele questiona do que cogito ser a aula.

— Normal.

— O Professor de História estava com a gravata azul hoje. Ele sempre usa preto ou vermelho...— Vitor franze o cenho, como se aquilo fosse o fato mais interessante que já viu.

— Inovar deve fazer bem.

— Mas ele nunca inova..– ele diz.

— Hoje ele quis. — interrompo ele, ainda tentando não surtar mas me arrependo no exato momento em que ele para de andar.— Desculpa...Eu só não estou com um dia muito legal.

Murmuro e cruzo os braços.

— Você sempre fica na escadaria por uns 10 minutos, antes de ir para casa. E hoje não fez isso...Eu devia ter notado antes.

— Por que sempre quer perceber tudo?– indago.— A percepção total nos cega as vezes.

— E qual seria a sustentação pra essa tese?

Comprimo os lábios, para não dar uma resposta grossa desnecessário, então apenas sorrio fraco.

— Outro dia, Vitor.

— Ok, Cora...

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⏰ Última atualização: Mar 20, 2022 ⏰

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