CAPÍTULO 3

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"Quem sabe a gente não se encontra um dia nesse bar onde dançamos hoje?" Ele me disse ontem, antes de adormecemos. "É, quem sabe".

Hoje, ao acordar e ver que ele não estava ali me fez lembrar que eu já havia frequentado aquele bar outras vezes. Conhecia o dono e ele estava falindo. Certamente fecharia o comércio mais cedo ou mais tarde.

Nunca fui apegada a bares, mas admito que, ao lembrar daquela fala, um nó contorceu minha garganta. Uma sentimento de perda. De quem acabou de perder a última esperança. Eu não tinha o número dele. Não sabia nada sobre aquele homem. Onde iria encontrá-lo? Porque eu queria encontrar? Foram meus questionamentos enquanto bebia o café forte. Quente. Amargo. E lembrava do vinho que dividimos naquelas horas no bar. Um vinho igualmente forte. Com um sabor ardente construído através do contato que eu tive com a boca dele.

Após o café, me dirigi ao aeroporto, tinha um vôo para fazer de São Paulo até o Rio.

***

Tudo o que havia acontecido no dia anterior ainda estava em meus pensamentos. Era como se eu estivesse presa naquele quarto de hotel. Presa novamente, após meses de liberdade. Algo nele me cativou. Oliver tinha um jeito convidativo. "Quero saber seus mais íntimos segredos". Ele sussurrou em meus ouvidos noite passada. Aproximando-se de mim mirou em meus olhos, desvendando meus últimos segredos...

Sou chamada a realidade quando ouço uma passageira inquieta mexendo no bagageiro. Estava tentando alcançar sua mochila. Peguei para ela e a mesma me agradeceu. Ter 1,70 - normalmente é - um dos requisitos para quem almeja ser aeromoça. Cabelo curto e arrumado que não cubra o rosto e o famoso batom vermelho são exigências de algumas companhias aéreas.

Ser comissária de vôo foi o meu maior sonho já realizado. Após eu pôr um fim em um relacionamento de 8 anos, me joguei nessa profissão. "Viajar reconstrói" é o que sempre ouvi e é o que espalho hoje em dia por aí após ter testado e aprovado esse ditado. Não tenho uma rotina certa e a janela do meu escritório sempre dá para o céu!

Depois de cumprimentar todos os passageiros e atender a suas necessidades, fiz a última checagem da aeronave, verificando se todos os passageiros estavam confortáveis em seus respectivos assentos. Em seguida, fui à tripulação anunciar a decolagem.

"Sras e Srs bom dia. Sejam bem vindos a bordo. Meu nome é Elena Hunt, sou uma das comissárias deste vôo. Em nome da nossa companhia aérea, apresento as boas-vindas à bordo do Boeing vôo 737-700 para o Rio de janeiro. Por medidas de segurança, acomodem as bagagens de mão nos compartimentos acima de seus assentos e as que não couberem, abaixo da poltrona a sua frente. Durante a decolagem, o encosto de sua poltrona deve ser mantido na posição vertical, sua mesa fechada e travada.

[...]

Obrigada por terem escolhido a nossa companhia. Tenham todos uma ótima viagem!"

A decolagem foi feita e a aeronave já estava passeando entre as nuvens. Os passageiros soltaram os cintos e já podiam transitar no corredor, ligar seus celulares, abaixar a poltrona e repousarem.

"Daremos a seguir algumas informações sobre a nossa viagem. O tempo de vôo até o Rio de janeiro está estimado em 1h5min. São encontrados a bordo desta aeronave 2 lavatórios: 1 na parte dianteira e outro na parte traseira [...]". Outra aeromoça, ficou encarregada de dar esse aviso.

Entre os ois de cada passageiro, aquele olhar me encontrou. Me desequilibrou. Oliver fixou seus olhos nos meus e eu, o fitei escancaradamente. Para eu tentar descrever a sensação, era como se a garrafa mais cara de vinho estivesse quebrada em mil pedaços no chão. O tapete estaria manchado e, mesmo que limpasse, de que serviria uma garrafa vazia? Quebrada? Foi o que senti quando o olhei. As minhas convicções caíram por terra. "Foi só o desejo da carne. Foi só um caso de noite passada" Eu forçava esse pensamento desde que aceitei contratar um garoto de programa. Foi além de um caso. Havia um fogo de paixão acendendo dentro de mim. Eu já podia sentir.

Fui em direção a ele e o mesmo piscou para mim. Falou algo num tom sonoro baixo, então me inclinei para ouvir:

- Caminhe até o banheiro. Eu vou logo em seguida. Me receba molhada.

NOITE PASSADAOnde histórias criam vida. Descubra agora