6. play date

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"I don't want to play no games."

🥀

No orfanato raramente podíamos assistir a filmes e mais raramente ainda filmes de terror, mas quando tinha 14 anos a diretora autorizou que víssemos um após muita insistência e foi quando descobrir que a mente humana é traiçoeira.

Ainda lembro do assassino contando a face de suas vítimas para usar como máscara e me recordo mais de como foi apavorante dormir no escuro aquela noite, minha mente criou formas que não estavam lá, coisas que nem existiam apenas pelo o medo que sentia, os barulhos que ouvi, os reflexos, as formas estranhas que no final só eram blusas penduradas.

A mente consegue fazer coisas inimagináveis e deve ser por isso que meu sono cansado depois do café da manhã foi conturbado por um sonho humilhante. Eu vi Hades em um campo de futebol verde e bem iluminado, ele se aproximava com um sorriso, sua mão envolvia minha bochecha em uma gesto carinhoso e quando fechou os olhos para me beijar começou a rir, seu dedo apontava para mim, seu corpo se curvava para frente e de repente todas as outras pessoas estavam atrás dele, os jogadores de futebol, seus amigos e meninas do orfanato.

Os braços de Emma lhe abraçavam.

- Acha mesmo que um dia alguém vai querer você? - A voz estridente da menina loira caçoava e então seus lábios se encontravam, dando um beijo afobado enquanto eu assistia tudo em primeira pessoa, não conseguia me enxergar mas me senti caindo no chão aos poucos.

Acordei com os olhos arregalados, suando frio e com um pulo sentei na cama, olhei o relógio digital em forma de rosa na parede, eram seis horas. Meu Deus, havia passado o sábado inteiro dormindo.

Me deitei novamente virada para a árvore grande em frente a janela e sem conseguir conter as lágrimas escorreram de meu rosto, minhas mãos foram até minha barriga e começaram a fazer carinho, que logo se transformaram em apertos como se isso fosse diminui-la.
Eles tinham razão, ninguém nunca iria gostar de mim, eu iria morrer sozinha.

Limpei as lágrimas na manga da blusa preta de Hades e peguei meu celular, nenhuma mensagem. Suspirei e me despreguicei na cama, com preguiça demais para levantar resolvi pegar o livro que estava ao lado da cômoda e terminar de ler, ele era enorme e tampava um pouco do vazio que sentia, pelo menos por alguns instantes.

Já havia acabado o trabalho de Hades então tinha que entregá-lo pela a manhã, não sentia vontade de levantar hoje, já estava de noite e com sorte ninguém sentiria minha falta.

Devorei as páginas dos livros enquanto ouvia os grilos cantando do lado de fora, a parte do casamento dos personagens foi quando comecei a chorar, será que ficaria bonita em um vestido de casamento? Eu nunca iria me casar, ninguém vai querer passar a vida comigo, eu vou terminar com cinco gatos, sozinha e conhecida como bruxa pelo o meu bairro inteiro.

Fui acordada de meus devaneios dramáticos com batidas na porta.

- Perséfone? - Sandra me chamou com sua voz doce do outro lado da porta e eu me desesperei, me sentando na cama e limpando os olhos. Aí meu deus, meus olhos devem estar vermelhos.

- Só um segundo, Sandra. - Gritei calçando as pantufas de gatinho que usava hoje e correndo até o banheiro. Caramba, eu estava horrível. Meu cabelo estava todo bagunçado e minha cara toda oleosa, passei uma água no rosto e peguei um roupão branco de florzinhas com capuz para tampar o cabelo.
Fui até a porta e a abri.

- Ah, oi Sandra.- Ela estava com uma bandeija na mão, havia um prato tampado e uma taça com água. Me sentei na cama e ela me acompanhou depois de colocar a bandeija sobre a penteadeira.

Nas profundezas do Tártaro.Onde histórias criam vida. Descubra agora