Único: Em uma chuva de novembro ou em qualquer lugar eu irei te amar

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San Francisco, 2000

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San Francisco, 2000.

 
  Era outono de 2000 quando o vi pela primeira vez.

  Havia acabado de chegar em meu novo lar na Califórnia, uma pensão furreca, caindo aos pedaços, mas ainda sim era meu lar.

  Durante muito tempo eu não tive um lugar decente para descansar minha cabeça. Claro, imigrantes no país dos americanos não são bem vistos, logo, minhas chances de viver bem caíram drasticamente depois que me mudei.

  Passei grande parte da minha adolescência e juventude colhendo os frutos de um desastre. Mãe coreana, pai estadunidense. Ela faleceu e então eu fiquei com o carrasco do meu pai, não suportei e passei por um internato antes dos 18 anos.

  Qualquer coisa para fugir dos abusos.

  No entanto, a ausência das necessidades básicas sempre me acompanhou, a fome e a luta constante para sobreviver dia após dia. Trabalhando aqui, ali, recebendo o suficiente para comer, até que enfim, me estabilizei em algo.

  Não havia nenhuma preferência minha, nenhuma idealização futura me prescrevia essa moradia. Mas hoje, de onde estou, agradeço por ter estado naquele lugar.

  Era minha primeira noite, conheci poucos dos meus vizinhos de quarto, a pensão era grande. A mobília do meu quarto estava empoeirada e meu nariz mal suportava respirar e inspirar o ar com cheiro de mofo, o que me rendeu uma insônia perturbadora.
 
  Sabia que as regras da pensão, não era permitido som alto depois das 23h, mas literalmente ninguém ali parecia se importar devidamente.

  Meu vizinho do quarto ao lado ouvia um lançamento recente de Ice Cube em um volume absurdo e isso nem era o mais interessante. Os gemidos e a cama batendo na parede fazia parte do combo de barulho. Ninguém o perturbaria, ninguém ousaria, sabíamos que em uma pensão cheia de imigrantes como eu, ex presidiários, traficantes e cafetões, reclamar de som alto estava fora de cogitação.

  Com o barulho e o nariz irritado, me levantei e segui até a janela de madeira disposta ao lado da minha cama velha. Tinha uma bay window sem colchão ali, para minha sorte, então me sentei abrindo a cortina verde.

  Oras, o que eu ganhava dava para pagar um quarto bom de uma boa pensão. Dez pratas por mês, era esse o preço de uma “suíte” como aquela.
Eu trabalhava com limpeza de automóveis em uma região mais modesta de San Francisco, era tratado como um cão, mas me pagavam duas pratas por lavagem e por vezes saia de lá sem dinheiro também porque algum bacana não me achava digno do dinheiro deles.

  Afinal, um verme amarelo estava vivendo às custas do país dos brancos patriotas. Eu pouco me importava com isso, afinal, eu não estava ali por opção. Acredito que ninguém morava naquele bairro por opção.

  Porém, eu não me importava com o lugar que morava, afinal, foi ali que eu o conheci.

  Naquela janela, do lado de fora eu observava uma discussão acontecer entre dois rapazes e os dois pareciam ser amarelos como eu já que discutiam na minha língua nativa e eu entendia cada palavra.

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