PRÓLOGO

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"Apesar de todos os refinamento da civilização que conspiraram para produzir a arte - a estonteante perfeição do quarteto de cordas ou o exuberante esplendor das telas de Fragonard - a beleza é selvagem. Era tão perigosa e sem lei quanto a Terra fora milênios antes que o homem tivesse elaborado um único pensamento coerente ou escrevesse códigos de conduta em tábuas de argila. A beleza era um Jardim Selvagem."

- O Vampiro Lestat, As Crônicas Vampirescas.



Um odor podre consumia o ar, fazendo suas narinas queimarem. Como todo animal selvagem, seus sentidos eram extremamente aguçados, letais, prontos para retalhar suas presas. Sobretudo, aquele fedor pungente fazia-o se recordar de uma época a muito enterrada por entre a fartura de suas memórias. Os bares apinhados na antiga e cinzenta Londres... o tilintar das garrafas de licor... o farfalhar das cartas de baralho... o calor do corpo de uma prostituta disposta a lhe vender seu amor... Fora uma boa época. O Devil's Throat o deixava nostálgico. Assim como Blaine, de alguma maneira, fazia-o se recordar de Whitechapel, seu lar.

A brisa fresca da noite afastou o aroma acre de pantanal e sujeira, agitando os fios negros de seu cabelo liso. Deitado sobre o banco de couro de sua Ducati, as botas repousando relaxadamente sobre o painel, Lester contemplou o céu sobre ele. As nuvens eram como um aglomerado de retalhos de cinzas de papel, obstruindo as estrelas, bem como a lua, sua fiel companheira por mais de um século.

Os dedos pálidos tamborilavam sobre o peitoral de mármore, acompanhando a candência da bateria de uma canção que era trazida pelo vento. Não era um fã da música barulhenta e cheia de efeitos eletrônicos daquela nova era, mas a distorção da nervosa guitarra sempre o deixava excitado. Levantando-se, por fim, rumou em direção a porta negra oculta entre as sombras.

Mergulhando na charmosa garganta do diabo, foi recebido por um estouro de luzes cintilantes. Aquela maldita iluminação estroboscópica sempre irritava seus olhos sensíveis, de modo que as pupilas se contrariam, transformando-se em minúsculos pontos negros em meio às írises cor de distênio. Aquele bar asqueroso fazia-o sentir-se submersos em um dos lascivos clipes de Marilyn Manson. Em um dos quartos privativos do corredor de pedra, encontrou a garota humana que havia encomendado. Era uma linda mulher com deliciosos lábios carnudos, a pele cremosa e rosada convidando-o a prova-la. Seus membros roliços, bem como a pele viçosa, eram como um estonteante encantamento. Era exatamente o que precisava - saturar-se com o suprassumo de sua existência, o vinho de sua perdição. As veias em brasa em suas têmporas queimavam como fios elétricos, pulsando sob a carne branca. Lambeu os caninos pontudos, faminto.

- Olá, meu senhor - a bela jovem disse. Trajava um vestido justo de um tom profundo de vermelho.

Muito calmamente, Lester removeu sua jaqueta de couro. Arrastou uma poltrona robusta sobre o chão, produzindo um chiado metálico. Sentou-se de fronte para ela. Recostou-se displicentemente contra o acento. Sorriu.

- Boa noite - ele disse, suavemente. Deslizou o indicador sobre os lábios, de forma que tocassem seus caninos. - Tire suas roupas, querida.

A mulher colocou-se de pé, o cabelo castanho derramando-se com um efeito líquido em suas costas. Era exuberante, com seus grandes olhos azuis adornados com maquiagem cintilante. Os lábios tingidos de carmim entreabriram-se ao contorcer os braços em direção as costas, afim de abrir o zíper. Ao curvar-se, Lester deliciou-se com a imagem de seu delgado seio, uma corrente em platina que pendia em seu pescoço rebrilhando contra a baixa iluminação. Por debaixo do vestido, trajava uma bela conjunto salmão, a calcinha adornada com delicados laços de cetim.

Pondo-se de pé, ele a beijou. Firmou uma mão em sua nuca, a outra ocupando-se em liberá-la de seu sutiã. Tocava-lhe muito deliberadamente, de maneira tênue, como se ela fosse feita de vidro e pudesse se quebrar com o mais suave dos toques. Tomou-a em seu colo, enrolando ambas as pernas em seu quadril. Deitaram-se à cama, uma de suas mãos em seu queixo, tombando sua cabeça para trás de modo que seu pescoço tenro ficasse exposto. A visão de sua jugular pulsante apropriou-se de seus pensamentos. Ele pôde sentir o doce arome de seu sangue quente correndo através de suas veias, o som molhado de seu coração batendo num frenesi contra sua caixa torácica. A imagem de seu corpo nu, os seios brancos de mamilos rosados, bem como a maneira com a qual suas bochechas estavam ruborizadas, os lábios abertos num arqueado O de puro deleite despertavam o animal dentro de si.

Trilogia O Círculo dos Imortais - Jardim Selvagem (Spin-off).Onde histórias criam vida. Descubra agora