Pressionou os lábios mais uma vez contra os de Flávia. O estalar do selinho soando nos ouvidos de Guilherme. Procurou transmitir toda a sua emoção através daquele gesto.
- A gente vai ter um filho! - Mal conseguia reconhecer a própria voz, tamanha era sua empolgação refletida nela. Só se lembrava de ter sentido esse tipo de felicidade uma vez, quando soube que iria ser pai pela primeira vez. - Ou filha!
As últimas palavras foram ditas, ao mesmo tempo em que a mão de Guilherme se encaminhava automaticamente para onde agora crescia quem seria a perfeita combinação dele e da mulher que ele amava. Perfeita porque era a coroação desse novo período na vida dos dois.
- Não sei, eu estou com medo Guilherme. Muito medo.
- Flávia, é normal ter medo. Ter filho dá medo.
- Eu estou com medo de morrer. Não queria que essa criança crescesse sem mãe, que nem eu.
A veemência do que sentiu ao ouvir a mulher a sua frente pronunciar essas palavras, fez Guilherme responder com uma urgência na voz, uma urgência que ele sentia não caber dentro dele.
- Isso não vai... Isso não vai acontecer. Você não vai morrer, Flávia! Não é você. Não pode ser!
- Mas pode ser qualquer um de nós quatro, né?
Flávia respondeu, gesticulando, com as palmas da mão pra cima. Em um quase dar de ombros. Como se já tivesse feito as pazes com a ideia, e estivesse simplesmente aguardando a hora dela chegar.
Guilherme nunca tinha conseguido entender a insistência de Flávia de que seria ela a escolhida, ao fim do prazo dado pela Morte. Desde a primeira conversa séria que eles tiveram na clínica, quando Flávia tinha ido em busca dos dólares mais uma vez.
O arrepiava o modo tão calmo que ela falava disso. Como se a mera idéia disso acontecer, não fosse capaz de destruí-lo.
Tanto ele, quanto Paula e Neném, com certeza, tinham cometido erros o suficiente pra justificar o fim da passagem deles nessa Terra.
Era tão impossível para Guilherme a possibilidade de uma mulher cheia de vida como Flávia, de repente deixar de existir, que o homem nem registrava na cabeça. Seu riso de repente não soando mais nos ouvidos dele, quando ele podia passar séculos ouvindo a melodia única, especialmente produzida.
Guilherme deslizou as mãos suavemente pelos cabelos de Flávia, procurando não expor o turbilhão que sentia dentro dele, logo envolvendo os lados da cabeça da dançarina. Segurou com firmeza, a impossibilitando desviar o olhar dela do dele.
- Isso não vai acontecer Flávia. Eu não vou deixar. Você vai ver a nossa filha crescer. - Ele declarou, procurando passar segurança.
- Você é o Doutor das Galáxias, Gui, mas tem coisas que nem você pode fazer. - A voz de Flávia se quebrou no final da frase, emoções reprimidas transbordando. E era exatamente assim que ela se sentia. Como um vaso, esquecido por alguém, debaixo de uma bica aberta. Seu próprio corpo parecia não conseguir conter mais as suas angústias.
Guilherme sentiu uma umidade nos cabelos que ainda estavam entre as palmas da mão dele. A luz roxa do quarto o impedindo de ver com detalhes o rosto precioso da mulher à frente dele.
- Flávia, você confia em mim? - Indagou, com urgência na voz, mais uma vez concentrado no castanho que o fitava de volta.
- Você sabe que sim. - A voz embargada dela saiu, parecendo incrivelmente pequena.
- Quando eu digo que você vai criar a nossa filha, confia em mim nisso, por favor. - Pediu, em tom de súplica. Guilherme refletiu como nunca havia suplicado por nada na vida. Mas implorar agora parecia muito natural e apropriado.
Flávia balançou a cabeça, concordando. Suas mãos tremiam um pouco, quando ela as uniu na frente do rosto, fungando um pouco. Guilherme se inclinou, e procurou com os lábios a trilha que as lágrimas tinham deixado pelo rosto dela. Depositou delicados beijos pelos caminhos salgados até as duas pálpebras.
Quando ele terminou, Flávia procurou desanuviar a expressão, seus pensamentos acabaram parando no pai. Expressou o desejo de ir pra casa do pai logo depois.
- Você não vai agora não né? Vai abandonar um homem sozinho assim num motel? - Guilherme brincou, buscando animá-la um pouco.
Ele envolveu a cintura de Flávia, sentindo a textura da lingerie dela com os dedos, em seguida puxou os dois até que ficassem de lado sobre os lençóis, um de frente para o outro.
Guilherme finalmente conseguiu arrancar um riso de Flávia, enquanto dava leve mordiscadas na bochecha macia dela.
- Gui, para! - Flávia dobrou o corpo com a risada, colocando a mão na barriga que doía com a ação.
Levando os lábios até o pé do ouvido dela, Guilherme disse, sério:
- Não! - Pontuou a palavra, correndo os dedos pelas extremidades do tronco de Flávia, fazendo ela encolher o corpo mais ainda, procurando fugir dos dedos ofensores.
Algumas lágrimas de riso escorriam pelo rosto da mulher, quando Guilherme parou finalmente, ficando sóbrio.
Começou a acariciar as maçãs do rosto da dançarina, correndo os nós dos dedos em desenhos imaginários, sem pronunciar palavra alguma. Como se o mundo todo dele estivesse contido ali, naqueles centímetros de pele.
- O que foi, meu amor? - Flávia indagou, estranhando o silêncio de Guilherme.
Era uma decisão tão simples, mas que afinal tinha se consolidado na cabeça de Guilherme naqueles segundos. Segundos que podiam determinar o destino de vidas inteiras. Entre uma pulsação e outra, Guilherme teve certeza como nunca em sua vida, que quando a hora chegasse, ele se ofereceria pra ir no lugar dela. Simples assim. Ridiculamente simples.
Iria tranquilo sabendo que Flávia agora estaria cercada de pessoas que a amavam. Seu filho e ela teriam um ao outro também. As duas pessoas que ele mais amava no mundo. Com a maravilhosa nova adição de uma terceira pessoinha.
Paula e Neném se importavam muito com Flávia. Tinha fé, sentimento raro em sua vida, que eles a ajudariam com essa nova jornada.
Sentiu o leve beliscão nos lados, trazendo Guilherme de volta, em frente à uma Flávia que aguardava uma resposta, em expectativa.
- Nada não. Só pensando que esses momentos aqui vão ficar marcados na minha memória pra sempre. - Guilherme respondeu, obedecendo a necessidade de trazê-la mais pra perto do próprio corpo, estreitando a distância até se tornar inexistente.
Flávia olhou pra cima, desencaixando levemente de debaixo do queixo dele. Arqueou as sobrancelhas em surpresa.
Guilherme imediatamente cobriu a distância, envolvendo Flávia completamente nos braços. Afundou o nariz nos cabelos muito negros, até que sua visão fosse preenchida e o cheiro único dos fios dela dominasse seu mundo.
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Cenas Deletadas: FLAGUI Edition
RomancePequenos momentos que não pudemos ver na novela.