Vamos dançar?

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Após sentar-se em seu lugar à mesa Heloísa passou o olhar por todo o salão tentando entender por que tinha ido ao baile. Provavelmente por insistência de sua irmã Violeta incentivada por sua sobrinha Isadora. Não havia nada ali que lhe interessasse. Preferia ter ficado em casa com suas costuras e bordados, pois no outro dia já teria algo pronto.
A festa fora promovida pela LBA, e Heloísa já havia feito suas doações, mas a parte de ir ao baile não a atraía.
Levantou mais uma vez os olhos do copo de refresco que segurava e seu olhar se firmou em alguém. Estava de costas e conversava com uma bela dama. Como era mesmo o nome dela? Não se lembrava, mas também não lhe importava. Porém vê-lo assim tão próximo de uma mulher lhe despertou algo que não conseguiu decifrar.
Ele usava uma camisa azul, que diferente do que estava acostumada a ver, estava bem alinhada e perfeitamente colocada para dentro das calças pretas. Era perceptível que ele havia tentado domar seus cachos, mas algumas mechas insistiam em se rebelar. Ela conseguia vê-lo apenas de perfil, mas já era uma visão e tanto. O corpo esguio e com formas definidas chegou a fazê-la prender a respiração por um instante.
Se forçou a desviar o olhar do casal que conversava e observou sua doce sobrinha sendo levada por Joaquim para uma dança. Os dois não haviam assumido um relacionamento, mas ela sabia que era apenas questão de tempo. Não que concordasse muito com isso, pois Isadora vivia desde criança por ali e não conhecia muitas pessoas. Heloísa achava que um namoro ou até mesmo um casamento precoce tiraria da garota a chance de conhecer o mundo, pois pelo que conhecia do rapaz ele possuía atitudes um tanto machistas e conservadoras.
Violeta pediu licença e foi conversar com Julinha. Ela se viu sozinha à mesa quando um rapaz um pouco mais jovem que ela se aproximou e a chamou para dançar. Sua vontade foi recusar, mas nesse momento viu Leônidas dançando com a bela dama com quem o vira conversando. Antes de aceitar dançar com o rapaz o olhar dela cruzou com o de Leônidas que pareceu um pouco surpreso ao vê-la seguir para a pista.
Por que ficaria surpreso? Ele a chamava de minha rosa quando queria e agora, na primeira oportunidade se engraçava para qualquer uma. Tenha dó! Ela assumia que não gostava que a chamasse assim, mas já havia se acostumado e até sentia falta quando a chamava apenas por Dona Heloísa.
Leônidas era um homem bonito, tinha o direito de sair com quem bem entendesse, já que ela vivia lhe dando gelo e o desencorajando a ter esperanças com ela. Era melhor assim. Ele a esqueceria logo e ela teria sossego.
Heloísa fazia o possível para seguir os passos de Vicente. Esse era o nome do rapaz que a tirara para dançar. Mas sua cabeça só pensava no casal que dançava próximo a eles. Leônidas lhe lançava olhares provocativos, o que a atrapalhava ainda mais a acompanhar a dança. Ela nunca dançou muito bem, por isso sempre evitava, mas ver Leônidas tirar outra pra dançar em sua frente a fez querer dar o troco.
A música estava acabando quando ela pisou no pé do rapaz. Ela se sentiu constrangida e se desculpou voltando para sua mesa.
Quando ia se sentar fora abordada.
- Dança comigo, minha rosa?
A voz de Leônidas lhe provocou um arrepio na nuca. Que diacho ele estava pensando? Mal acabara de dançar com aquela loira escultural e vinha a chamando.
- Pensei que estivesse muito bem acompanhado. - O alfinetou.
- Está falando da Ana? - perguntou ele como se não soubesse ao certo sobre o que ela falava. - Ela voltou para as amigas dela. Eu a conheci a pouco. Ela veio até mim, se apresentou e eu não achei justo não chamá-la pra dançar. - Ele explicou. - Eu também vi você dançando agora mesmo.
Heloísa não queria que ele percebesse que ela estava com ciúmes. Será que era isso? Estaria sentindo ciúmes de um matuto? Não podia negar que assim de perto e todo arrumado ele não parecia nada matuto. Estava, sim, muito bem apresentável.
- Vamos. Só uma dança. - Insistiu ele.
Heloísa passou rapidamente os olhos pelo salão e pôde ver Ana com outra moça. Percebeu que a moça olhava para onde estavam enquanto conversava com a morena ao seu lado. Não, ela não daria motivos para que Leônidas dançasse novamente com outra.
- Tudo bem. - Concordou ela. - Mas saiba que não danço bem e posso pisar no seu pé.
- Minha rosa. A dança depende de quem a conduz. Se o cavalheiro souber o que está fazendo a dama conseguirá dançar muito bem. - Ele lhe explicava enquanto a conduzia pela mão até a pista.
Heloísa sentiu a pele de sua cintura queimar quando ele a puxou para ele. Ela pousou uma das mãos no ombro do rapaz enquanto ele segurou sua outra mão. Seus corpos se tocaram discretamente, mas já era o suficiente para que ela sentisse seu coração acelerado.
Leônidas a conduzia pela pista com muita graça. E não é que ele tinha razão? Ela estava conseguindo dançar muito bem. Ela sentia o cheiro dele e percebeu que ele usava perfume. O aroma estava bastante agradável. Poderia se perder ali o resto da noite.
A mulher desejou ter aceito a oferta de Isadora para lhe fazer um vestido novo para o baile. Na hora apenas dissera à sobrinha que não precisava de vestido, pois ninguém reparava nela. Achou que o vestido azul estava bonito para esta ocasião. Será que o vestido era azul ou verde? Se perguntou olhando para a saia. Quem liga? Poderia estar enganada dessa vez já que dançara com dois homens apenas em uma noite.
- Você está muito linda. - Leônidas a elogiou e ela soube que suas faces se ruborizaram.
- Obrigada - agradeceu - Você também... está um pouco diferente. - Ela se arriscou.
- Eu só me arrumei um pouco. Queria sair, conversar com outras pessoas.
- E está dando certo, não é? - O alfinetou.
- Está falando por causa da Ana? - Leônidas a fitou com um sorriso de canto. Ela percebeu que ele a estava provocando.
- Digamos que sim. - Heloísa respondeu.
- Heloísa, nenhuma outra mulher me interessa nessa festa além de você.
Agora ela soube que estava uma pimenta de tão vermelha. Apenas abaixou os olhos e desejou que a música que dançavam terminasse para voltar a seu lugar e dizer à Violeta que queria ir embora. Ao invés disso se viu envolvida no calor do momento e se deixou levar pela pista por aquele homem, que parecia tão aberto quanto a seus sentimentos, mas ao mesmo tempo era tão misterioso.
O casal se envolveu em uma dança onde algumas partes de seus corpos se tocavam, o que já era suficiente para que uma aura de romance os envolvesse. Volta e meia seus olhares se cruzavam e Heloísa sentia queimar seu rosto. A sensação de estar nos braços de Leônidas era inexplicável. Não se comparava ao que sentiu uma vez quando se apaixonou pelo... Preferiu não trazer esse pensamento à tona. Sabia que nenhuma dança que tenha tido em sua vida se comparava ao que acontecia naquele momento.
Após algumas danças das quais ela perdeu a conta da quantidade, acabou caindo em si e percebendo que não estava certo o que estavam fazendo. Resolveu interromper a dança.
- Leônidas, me desculpe. Eu não devia alimentar suas esperanças. - Justificou ela. - Minha vida é muito sem graça, eu não tenho nada pra lhe oferecer a não ser amargura.
- Minha rosa, - ela sentiu seu coração parar ao ouvi-lo a chamando assim novamente. - Nem só de flores é a vida. Eu também não fui sempre um cara alegre. Eu guardo minhas mágoas e meus problemas, mas a despeito disso eu quero seguir minha vida.
- Eu ainda não me sinto preparada pra isso. - Explicou. - Me desculpa e com licença. - Disse deixando pra trás um pequeno murmuro que saiu dos lábios dele 'minha rosa'.
Heloísa o deixou na pista de dança e voltou ao seu lugar sob os olhares atentos de Violeta e Isadora.
- Violeta, preciso ir embora. - falou pegando sua bolsa. - O que foi? Por que estão me olhando assim? - Sentiu a reprovação das duas.
- Nada. - Violeta disse levantando as mãos. - Apenas você se perdeu dançando com Leônidas e voltou pra cá toda nervosinha querendo ir embora.
- Eu não posso dar esperança pra ele. Nem pra ninguém. - explicou. - Eu disse isso a ele.
- É uma pena, tia. Vocês estavam tão bonitos dançando juntos.
- Acontece, minha sobrinha, que a vida não é apenas um passo de dança. E quando menos percebemos o amor nos deixa com o coração todo despedaçado.
Ela viu os olhares arregalados das duas e saiu para chamar um carro de praça.
Sabia que o encontro daquela noite, a dança e o cheiro dele ficariam em sua memória por mais tempo que ela desejava. E os passos de dança que a vida lhe dera até hoje só serviram para lhe machucar e não querer mais envolver-se e nem deixar que o amor entre em sua vida novamente.

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