Uma rosa

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Todos estavam reunidos para o almoço promovido por padre Romeu para arrecadar fundos para a igreja. Heloísa ficou parada por um instante observando as famílias reunidas. Todos pareciam muito felizes compartilhando um momento tão intenso como aquele. Dorinha com seus doze anos de idade brincava próximo à Violeta que estava de olho em Matias sentado em um canto. A menina começava a desabrochar. Era linda, assim como a irmã na sua idade. Heloísa se lembrava de quando Elisa estava ficando mocinha. Era linda e meiga, muito calma e tímida. Isadora era o oposto da irmã. Geniosa e teimosa, porém muito carinhosa e possuía um enorme coração.
Observou as outras famílias e se pôs a pensar em como estaria sua filha se estivesse com ela hoje. A menina estaria próximo de completar dezoito anos. Heloísa não tinha nem ideia de como ela poderia estar. Não conseguia imaginar como seria seu gênio. Que cores ela preferiria. Se gostaria de ler romances ou suspense. Não sabia se era uma garota sonhadora, se tinha vontade de viajar e conhecer o mundo ou se queria casar cedo e constituir uma família.
Ela se afastou, pois, observar todas aquelas pessoas reunidas era demais para ela. Em todos esses anos não perdeu a esperança de encontrar sua filha, mas a cada dia que passava seu sonho se tornava mais distante. Só um milagre para trazer sua Clarinha de volta.
Se sentou em um banco atrás da igreja. Apenas algumas crianças passavam por lá brincando às vezes. Virou o rosto sem olhar para nada em específico. Não se deu conta de quanto tempo estava ali curtindo sua solidão e não ouviu os passos de alguém se aproximando.
- Uma rosa por seus pensamentos.
Ela olhou para o rapaz que trazia uma rosa cor-de-rosa e estendia para ela. Ele mostrava um sorriso tímido de quem tinha consciência que interrompia o momento de solidão dela.
- Obrigada. - Ela pegou a rosa e sorriu sem graça. - Mas acredite, eles não valem a pena.
Heloísa abaixou os olhos para a rosa que estava em sua mão e ficou pensando naquele homem tão gentil ali na sua frente. Leônidas era um cavalheiro, o que não combinava muito com seu jeito caipira. Desde que chegara à fazenda demonstrou interesse por ela que não conseguia entender o que ele viu nela.
- Tem alguma coisa te incomodando. Eu vi quando se afastou sozinha. - Falou o rapaz.
- Estava me vigiando? - Ela perguntou.
- De forma alguma. - Negou ele. - Apenas percebi que não estava bem. Seus olhos estão vermelhos. - Ele se sentou no banco ao lado dela.
Quem era aquele homem? De onde teria saído e como foi parar na fazenda? Ele não parecia pertencer àquele lugar. Ele parecia capaz de enxergar até a alma das pessoas. A forma como ele conseguia conter as loucuras do Matias. Não, aquele homem não parecia real.
- Sabe, tem dias que acordo assim. Me bate uma tristeza. Uma saudade...
Leônidas segurou a mão dela e acariciou o dorso com o polegar. Heloísa sentiu o ar faltar. O toque da mão quente em sua pele poderia melhorar o seu dia. Não fosse toda tristeza que sentia teria apreciado um pouco mais o momento.
- Eu soube sobre a sua filha. - Ele disse com cautela. - Ela foi tirada de você ainda bebê. Eu sinto muito, minha rosa.
- Ela era recém-nascida. Eu não tive a chance de vê-la crescer. Não a vi dar seus primeiros passos. Não a ouvi falar mamãe. Não a levei no primeiro dia de aula. Não soube sobre seu primeiro amor. - Ela deixou as lágrimas rolarem livremente em seu rosto. - São tantas coisas que não vivenciei. Eu sei que eu errei. Que tive atitudes que não condiziam com uma moça solteira. Mas ele não tinha o direito de me tirar minha menina. Foi um castigo de Deus, eu sei.
- Não fale assim. Foi uma maldade que fizeram com você. Não foi castigo. Deus não a castigaria a privando de cuidar de um ser que você gerou em seu ventre.
- Talvez eu não merecesse ser mãe. - Disse com um fio de voz.
- Minha rosa, você é a mulher mais generosa dessa vila. Jamais a vi destratar ninguém. Trata todos iguais, cuida dos que precisam. Você seria uma ótima mãe.
Ela abaixou os olhos novamente, pois ele a hipnotizava com o olhar e com as palavras. Girava a rosa em sua mão enquanto pensava em tudo que ele lhe disse.
- Nunca pensou em se dar uma chance? Poderia ter encontrado alguém. Ter tido uma família, até gerado outros filhos. - Disse ele com cuidado.
- Eu nunca achei que merecesse. Não queria ter outros filhos para substituir o lugar que seria dela. Sabe, é muito difícil tomar certas decisões e eu preferi me recolher. Não acho que eu mereça amar alguém de novo. E, também não quero.
- É claro que merece. Você ainda é jovem e bonita. Eu não disse sobre ter outros filhos para esquecer sua menina, mas para dividir essa generosidade que é da sua natureza.
- Ah Leônidas, você nem me conhece direito e fica falando essas coisas.
- Eu gostaria muito de te conhecer melhor, minha rosa.
Ele se atreveu a passar o polegar sobre a bochecha dela para secar as últimas lágrimas que teimaram em cair.
- Não perca seu tempo. - Ela disse sem afastar a mão dele que ainda queimava a pele do seu rosto.
- Eu espero o tempo que for preciso.
Heloísa se levantou e se virou para sair. - Eu tenho que ir. - Ela gesticulou mostrando o pessoal reunido do outro lado da igreja.
- Se quiser conversar sabe onde me achar.
Ela não respondeu, apenas caminhou para onde estava a aglomeração de pessoas. Ela queria negar, mas Leônidas mexia com ela. Apenas não achava justo se dar uma chance enquanto sua filha poderia estar infeliz lá fora. E se ela mudasse sua vida, se seguisse em frente, poderia parecer que desistiu. Ela era a única pessoa que se preocupava em encontrar Clarinha. Se ela que é a mãe não mantivesse firme sua esperança quem mais lutaria por ela? Não, não era justo se envolver com ninguém.

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Me desculpem pelo drama. Não pude evitar
Obrigada por acompanharem!

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