0.0; prólogo;

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0.0 introdução:
disparada ao mundo invertido

Mike  sentiu que sua cabeça zonza pela pancada que agora começava a retomar a lucidez. O sangue fresco e quente escorria por sua testa e seu pescoço. Antes que pudesse tomar frente de toda a situação, um grito ecoou pelo corredor o qual tinha sido jogado minutos antes.

"Mike!"

Era Dustin. Ele parecia desesperado. Encurralado entre uma porta trancada e uma escrivaninha que mantinha uma tv de tubo ligada em estática. Mike olhou à sua volta procurando algo que pudesse arremessar.

As garras arranharam as tábuas de madeira profundamente deixando uma marca para trás. Aquela criatura parecia ter mais de 2 metros de altura, não importava quantas delas tivesse enfrentado, o temor sempre era o mesmo.

A cabeça que antes imitava um broto de flor se abriu mostrando todas as fileiras dos dentes afiados que colecionava nas "pétalas".

Mike percebeu que já não tinha mais tempo para procurar um utensílio que machucasse de verdade. Puxou o vaso amarelo ovo ao seu lado e jogou com força contra o grande demogorgon que grunhiu alto com os estilhaços de vidro que perfuraram sua pele pegajosa.

"Puta merda! Corre Mike!"

Aquela grotesca criatura se virou em direção ao outro garoto. A cara ensanguentada se misturava com o lodo  e a saliva fedorenta. Cambaleando para o quarto ao lado, Mike jogou seu corpo contra a porta e girou a chave trancando-a o mais rápido possível. Esperava que a porta durasse tempo o suficiente para encontrar algum objeto útil na sua defesa.

A madeira voou em pedaços. 

No andar debaixo Will sentiu sua nuca arrepiar, provavelmente pela dor da mordida que estraçalhou sua pele do antebraço,  mas também, pelo monstro invertido que dividia os cômodos. 
Lucas estendeu o braço para que o amigo pudesse levantar. Então observaram  Steve e Jonathan que estavam desmaiados em cantos adjacentes.

"Cuida deles" Will coordenou.

"E você vai fazer o que?"

"Dar uma de Steve"

"Mas você  só tem um braço bom!" Lucas apontou para o braço imóvel  em carne viva. 

"E você não consegue subir a escada. Dustin e Mike estão lá em cima, não dá para perder tempo discutindo"

"Tudo bem, tem razão"

Lucas mancou até o bastão de baseball rodeado por arame farpado que estava do lado de Steve. Jogou rasteiro pelo chão para que o companheiro pudesse pegar sem se machucar. O joelho deslocado começava a latejar de dor.

Só haviam resquícios da porta. O demogorgon se esgueirou para poder passar pelo grande buraco que tinha aberto na madeira. Mike se virou de supetão fazendo que o tapete abaixo de seus pés escorregasse e seu corpo fosse de encontro ao chão. Fechou os olhos com força, se arrependendo a cada pensamento e memórias que vinham à tona.

Não estava pronto para lidar com a morte.

Não queria morrer.

Byers subiu as escadas o mais rápido que conseguia. Antes que pudessem falar qualquer coisa um para o outro, Dustin apontou para a criatura que arrebentava a madeira da porta como se fosse papel.   Segurou a perna de uma mesinha enferrujada nas pontas e quebrou fazendo atrito com a sola do tênis no metal.

"Vamos meter o pau nesse filho da puta!" Dustin gritou.

"Sim!"

Derraparam juntos na virada para a entrada do corredor. Will chutou a perna do demogorgon fazendo o fraquejar e soltar seu peso sobre uma ponta afiada da madeira. A ponta atravessou toda a carne e saltou para fora. Aproveitando que  a criatura estava imóvel, grunhindo de dor, Dustin deu o primeiro golpe segurando o pedaço de ferro com as duas mãos. Will golpeou logo em seguida, mesmo que estivesse com apenas uma mão o estrago ainda era grande.

Mike abriu os olhos. Ainda estava tremendo, com o corpo frio e suado, devia estar totalmente pálido. Will atravessou para o outro lado da porta  em direção ao melhor amigo, estava tão preocupado que nem sequer ligou quando perdeu um dos tênis no cadáver.

"Mike! Você está bem?" segurou o ombro dele.

"Que merda…" Mike lambeu os lábios secos "Achei que ia morrer"

"Tudo bem, a gente deu um jeito naquela coisa. Se machucou?"

"Não. E você?"

"Só um pouco, acho que vai deixar uma cicatriz das feias."

Nem Dustin, e muito menos Mike, tinham reparado no braço do outro garoto até agora. Era nojento,  a carne  pulsava esguichando sangue para todos os lados, a pele estava pendurada em algumas áreas balançando de um lado para o outro. Mais tarde, quando a adrenalina passasse, os gritos de dor seriam impossíveis de conter. Harrington correu para o banheiro na frente, seu estômago se revirando de um lado para outro jogou todo o almoço que tinham comido horas antes. Wheeler ficou estático encarando com os olhos arregalados aquela ferida gigantesca.

Will apenas se levantou. Queria sair o mais rápido daquela casa e correr para um hospital para cuidar daquela ferida. Seus arrepios tinham passado e um alívio tomou o lugar. Steve, andando em zigue-zague apoiado nas paredes, sorriu torto quando observou a criatura morta no chão. Ele estava acabado, olheiras e machucados profundos por todo o corpo.

Desde que o mundo invertido tornou-se um problema recorrente, como uma infestação de ratos, as pessoas precisavam desesperadamente de uma forma para resolver aquilo. Precisavam de dedetizadores, que pudessem enfrentar o problema e se machucar no lugar de inocentes. E quem melhor para assumir esse papel que os moradores de Hawkins? 

Eles já tinham muita experiência com esse assunto. Começaram apenas com o pensamento de salvar os outros para que não passassem pelo mesmo que eles. Depois, como o desenrolar  de tudo, eles tinham se tornado uma  grande empresa. 

Caça demônios, como os caça fantasmas. 

"Nossa"

Foi isso a última coisa que Steve disse antes de eles saírem daquela casa. 

Marlboro e sangue seco;;Onde histórias criam vida. Descubra agora