Amor Marginal - Romance sáfico

capítulo III - Onde seu coração está

O coração do sábio, tal como o espelho, deve a tudo refletir, sem todavia macular-se.
-Confúcio

Noites de saudade, as mais frias do ano. Dacota se encontrava perdida entre seus desejos e suas obrigações quando a suave brisa tocou sua pele e a fez arrepiar.

- Diga-me, o que esta princesa tem de tão especial?

-Você não entenderia... quando ela me olha sinto tudo ir embora, todos esses sentimentos de não pertencimento, toda essa dor por estar sozinha, toda essa escuridão que me consome. - divagou respondendo o amigo.

- Uau...

- Forte né?

- Não, melodramático. - O homem riu e jogou o chapéu q ocupava o espaço em que ele sentou.

Dacota riu em resposta, mas sabia que ele apenas brincava.

- Quando vão se encontrar novamente?

- Essa é a pergunta que não quer calar, agora que Amiraah se prepara para assumir o trono está cada vez mais difícil ter sua atenção. - respondeu cabisbaixa, encarava o mar e sentia o frio da madrugada.

- Não diga-me que a distância é um problema, logo para a destemida larápia e a bonita princesa. - ironizou os títulos. - você já fez coisas piores por ela, estarmos aqui novamente atracados no porto de Vonia é uma grande prova.

- Ravi, eu quero essa mulher, não vou deixá-la por nada nesse mundo. - A pirata saiu do parapeito e despencou em sua cama improvisada. - Eu li a histórias, a princesa sempre acaba com o amor verdadeiro, e nessa história eu sou a chave para quebrar esse feitiço. - olhou para as madeiras que pendiam sob si e sorriu lembrando do beijo da jovem morena.

- Vá dormir, Dacota. Não serei eu que vou contradizer esse coração obstinado.

Então o homem em seus trapos noturnos retirou-se do "quarto" da pirata e tomou o rumo de seu espaço.

Contrariando o pedido de seu amigo, Dacota passou a noite sonhando acordada, cada mínimo detalhe daquela noite ousava brincar em sua mente e provar que era possível se apaixonar cada vez mais pela mesma pessoa.

Barulhos de pássaros a fizeram sair de sua cabeça e toma-se conta de que o sol havia raiado e mais um longo dia estava pela frente.

- É isso Bart, mais um dia para dois gatunos na cidade. - Comentou com seu gato que tratava mais de observar os pássaros e analisar como poderia preda-los do que prestava a devida atenção.

Vestiu-se com certa rapidez, amarrou sua bandana no braço e seguiu viagem. O jovem gatinho preto andava logo atrás mais um dia desapontado por não ter pego um "lanche" para viagem.
A mulher baixa com curvas acentuadas deslizava com elegância pelas ruas do centro da cidade, dava uma piscada aqui e outra ali, garantindo favores, mesmo que tardios, pela sua beleza.
Cativava até os nobres animais que traziam seus donos para presenteá-la com suas mercadorias. E assim muito do que era necessário no navio ja estava garantido em metade do dia na cidade.

- O que uma jovem como você faz em uma cidade como esta? - Uma senhora a questionou enquanto Dacota escolhia as mais bonitas rosas.

- Conhece a frase que diz "Devemos estar onde nosso coração está"? - A mulher concordou com a cabeça. - Pois bem, meu coração está no Palácio. - Pegou duas rosas e buscou as moedas no bolso.

- Bem, minha querida, o coração sabe sempre a resposta de tudo, leve as rosas, o seu coração te espera entre os grandes muros do Palácio com a janela de sempre aberta. - Tocou a mão da pirata, colocou um cristal junto as rosas e rejeitou seu pagamento.

Dacota abriu um de seus sorrisos entendendo o recado e com muita gratidão seguiu seu caminho.

- As noites de saudade são as mais frias do ano. - Amiraah leu em voz alta assim que se deu conta da nova presença em seu quarto.

- Não parece te afetar. - A branquela respondeu entrando pela janela.

- Se não afetasse não saberia ser verdade. - Fechou o livro e olhou para a mulher branca como o leite.

- Longa noite por aqui? - Aproximou-se.

- Os minutos rastejaram. - Suspirou - O que traz em suas mãos?

- Parece uma espécie de cristal, algo místico ou sei la. - Estendeu as mãos para Amiraah.

- É um Quartzo Rosa, a pedra do amor. - Amiraah analisou maravilhada.

- As rosas também são pra você. Algo me diz que minha princesa está cabisbaixa. - Entregou o cristal e as rosas em suas mãos, tocando levemente os dedos da morena.

- Família... Creio que não precise de desenvolvimento. - A morena com seus lindos olhos castanhos percebia cada detalhe do cristal e o admirava como admirava sua pirata.

- Não posso lhe garantir que sim, a muito não vejo o que um dia chamei de família. - Dacota recoou.

- Pois sinto muito. Queira me desculpar, não quis te insultar de forma alguma. - Colocou as flores sobre a poltrona e encarou Dacota.

- Não me insulta, insulto seria se não me olhasse com tamanho brilho.

- Brilho? - Perguntou confusa tocando a própria pele.

- Sim, minha Bea. Você brilha. Mais que o sol pela manhã, mais que a coroa em sua cabeça. Brilha feito a estrela mais bonita do meu bolso. - Passou a mão pelo cabelo.

Em um ato de reflexo Amiraah fez o mesmo, pousando as mãos em seus brincos de pérolas, pequenas bolas peroladas que destacaram-se em suas orelhas.

- Me perdoe por nao preparar nada para você, mas tome, quero que me tenha junto a ti. - Retirou os brincos e os deu nas mãos de Dacota.

- Por que isso me parece uma despedida? - Perguntou confusa com os brincos nas mãos e lágrimas que ameaçavam brotar em seus olhos.

- Jamais será uma despedida, eu estarei contigo em sua caminhada e arrumarei formas de nos falarmos. - Olhava para os lábios da Pirata e os desejava.

- Para onde vai? - Tratou de analisar cada parte do rosto de sua princesa, cada marca de expressão ou pinta que existia.

- Longe, meus pais querem que eu conheça a capital antes de me tornar rainha. - Sentiu a mão de Dacota contornar sua cintura.

- Longe... - A pirata repetiu desiludida.

- Eu não vou embora, volto e enquanto isso, manterei contato. - Amiraah tomou o queixo de Dacota em suas mãos e sentiu o choque que o toque de suas peles causava.

- Está me deixando. Como da última vez. - Retirou a mão da princesa de seu rosto e virou-se para trás.

- Desta vez é diferente, Dacota. Dessa vez eu digo a plenos pulmões. Eu a amo.

Sem palavras as lágrimas de Dacota rolaram soltas, e sem medo algum correu para os braços de sua princesa.

- Creio que não ame sozinha. - Repondeu respirando o doce perfume da morena.