1 - O Fim do Verão

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272 dias para o verão

Setembro, 05

♪But you're in London and I break down 

'Cause it's not fair that you're not around ♪

— Come back...be here

Betty

As folhas das árvores estavam na indecisão se continuavam verdes ou se mudavam completamente para o tom alaranjado. De fato, o verão havia acabado e com ele a minhas férias também. Isso significava que devíamos voltar para a escola, lugar esse que não tem sido mais o mesmo desde que um certo alguém parou de frequentá-la. , eu sei que já fazem quase dois anos que ele se foi, mas ainda assim eu sinto a falta dele. James era o meu melhor amigo, sempre fomos, desde pequenos. Por isso, foi muito difícil me adaptar sem ele. Eu não sou o tipo de pessoa muito sociável, eu tenho dificuldades em fazer amigos e James era a única pessoa que eu poderia confiar meus segredos. Não gosto muito de me abrir para as pessoas. É como se os meus problemas e as coisas que faço no meu dia a dia não fossem interessantes o suficiente para manter uma conversa com alguém. Já com James, era diferente, eu não precisava me esforçar para conversar com ele. Era tão natural e tão espontâneo que eu podia ser simplesmente eu ao lado dele...

Apago James dos meus pensamentos, pois esse era o único lugar que ainda o tinha. Respiro fundo, exatamente como fiz por dois longos anos, pois eu não queria ter que precisar dele. Encaro o pátio de entrada da escola e respiro fundo mais uma vez.

— Tenha um bom dia, querida. — disse a minha mãe beijando o topo da minha cabeça.

— Bom não sei para quem. — murmurei saindo do carro.

Entrei na escola e encarei o espaço. Nada havia mudado desde o último dia antes das férias. Na verdade, nada havia mudado nos últimos dois anos. De certa forma, isso me irritava um pouco. Não era justo que todas as outras coisas estivessem existindo sem nenhuma mudança, como se ninguém ou nada desse a falta dele. Como os corredores podiam continuar os mesmos sem aquela risada exagerada, como os professores não citavam o nome dele como exemplo de melhor aluno, como o grupo musical da escola continuava de pé sem aquela voz incrível, como as pessoas não espalhavam o legado dele pela escola, como os garotos do time de futebol sentavam naquela mesa e continuavam sorrindo como se o vazio de um dos bancos não significasse nada, como a partida de James não afetou todo mundo como me afetou, como? Não era justo não tê-lo por perto, mas parece que tudo seguiu, tudo menos eu. Eu fiquei parada, sem me mover do lugar. E eu me odeio por isso.

Pode parecer contraditório, mas apesar de sentir a falta dele, eu não deveria. Eu devia fazer como todo mundo. Seguir em frente e deixar que a vida seguisse sem o efeito colateral de James. Deveria fazer isso porque ele me abandonou. E eu não estou sendo nem um pouco dramática porque, de fato, ele me abandonou. Desde que ele se mudou para Londres, nossa amizade nunca mais foi a mesma. Nas primeiras semanas, a gente continuou conversando por mensagem e até vídeo chamada, mas depois de alguns meses, as mensagens ficaram menos frequentes até desaparecem por completo. Acho que ele deve ter arranjado amigos melhores ou até mesmo uma namorada.

Engulo a seco. Esse último pensamento fez um nó na minha garganta que só desabrochou ao ouvir o sinal tocar. Caminhei para a minha sala e me sentei no fundo, perto da janela. Gosto de olhar para o gramado da escola e vagar sem rumo com os pensamentos de vez em quando. Abri o meu caderno e ajeitei as minhas canetas na mesa quando uma voz me chamou a atenção. Inez e Sophia acabaram de passar pela porta rindo escandalosamente, o que fez com que todos olhassem para as duas. Elas adoram fazer isso.

Suspirei como sinal de exaustão. Logo cedo, eu teria que lidar com elas, principalmente com Inez. De todas as aulas que podemos escolher, ela tinha que escolher logo a mesma que eu?

— Bom dia, Betty. Como foi o verão? — perguntou Inez abrindo um sorriso falso.

— Você não precisa fazer isso — respondi revirando os olhos.

— Você sabe que ele vai querer notícias suas.

— Ele deve saber também que não é de você que ele vai conseguir. Se ele quiser falar comigo, ele tem o meu número de telefone.

— Porque você sempre tem que ser assim, tão grossa? Talvez seja por isso que seu pai fugiu daquele casa.

— Escuta aqui... — disse alterando o tom de voz. Ela tinha tocado numa ferida muito delicada — eu não vou me...

O professor pigarreou. Eu não havia notado que ele entrara na sala. Virei para frente e o encarei. Ainda bem que ele já ia começar a aula, pois eu não estava a fim de me estressar logo cedo. Ainda mais com ela.

Inez e eu temos uma relação complicada. Não sei ao certo como toda essa complicação começou, mas já faz alguns bons anos que ela existe. Ela deixou um olhar enjoado que captei com a visão periférica antes de virar para frente também.

Suspirei.

***

O primeiro dia estava passando e caí em mais umas duas aulas na mesma sala de Inez e Sophia. A presença delas até dava para suportar, mas o que estava me tirando do sério era o cochicho que elas estavam fazendo durante a aula de história. Tudo começou com uma mensagem que Inez recebeu no meio da aula. Depois disso, ela ficou inquieta e cochichava a todo momento com a amiga. O professor se irritou com a movimentação e chamou a atenção das duas. Depois disso, alguns papéis começaram a circular. Quando me dei conta, mais umas três pessoas também entraram nessa movimentação.

Eu fiquei no meu canto. Não participava de nenhuma panelinha, muito menos de um grupo de amigos. Diferente de Inez, eu não tinha um grande círculo social. Isso me fez ficar de fora do assunto. Ao final da aula, a metade da turma já havia lido o papel. Quando o sinal do término da aula de história soou, eu consegui escutar por alto que os papéis que rolaram na aula tinha algo haver com uma festa.

Não consegui mais informações até o fim da aula. Eu havia acabado de pegar minhas coisas no armário e já estava me preparando para ir para fora esperar a minha mãe quando Christine, uma das meninas do coral da escola, passou com seu grupo comentando alto:

— [...] Inez acabou de me contar. Vai ser bom revê-lo novamente. Ele pode até voltar para o coral.

— Sim. Esperamos que sim.

— Espera — disse interrompendo o grupo. Aquela era a minha única chance de saber do que se tratava o assunto que a grande maioria da escola estava comentando. De todos os grupos, as pessoas do coral eram as que eu tinha algo que beirava a um pouquinho de relação social devido ao James ter participado — quem pode volta para o coral? — perguntei.

— Você não sabe da novidade? — retrucou Christine.

— Que novidade? — disse ainda mais curiosa.

Os ombros de Christine caíram, como se o fato de eu não saber tivesse a decepcionado.

— Eu sempre sou a última a saber das coisas, Christine. Você deveria saber disso...

— Eu pensei que você soubesse porque você e ele eram tão próximos...

— Conta logo, por favor...

Ela me encarou e arqueou as sobrancelhas, prestes a revelar uma surpresa.

— Adivinha só quem está voltando de Londres... 

Éramos TrêsOnde histórias criam vida. Descubra agora