Alerta

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  Jude encarou as portas que levavam para o escritório do Eleito, nem ela que fora convidada sabia do tal encontro e como aquele estranho sabia? Limpou as mãos de suor no vestido e bateu a porta. Foi imediatamente recebida pelo próprio Eleito, que abriu um enrome sorriso de lobo.
– Ah! Como queria conhecê-la, querida, vamos entre. 
  Ela entrou na luxuosa sala que tinha várias pinturas surrealistas de teor sombrio e a cadeira do Eleito era um magnífico trono de veludo vermelho, ele acendeu um charuto.
  – Vossa Excelência – cumprimentou.
  Ele soltou a fumaça e sinalizou a poltrona  na sua frente para Jude.
  – Judith, permita-me agradecer pessoalmente pelo depoimento sobre os rebeldes que você deu semana passada, a nação está orgulhosa de você.
Semana passada, houve um ataque no porto da cidade, onde o arsenal de armas foi tomado por rebeldes, e Jude, como figura pública do movimento estudantil e queridinha do governo, repudiou a ação e disse que esses delinquentes perturbavam a paz da nação.
– Só fiz o que deveria fazer, Vossa Excelência.
– Sim, sim. Seu pai ficaria orgulhoso de você – tragou o charuto – Deve ter percebido que hoje houve uma queda de energia, isso é sinal que os rebeldes podem atacar em breve, e quando isso acontecer, quero que faça o mesmo de sempre e algumas coisas.
– Que coisas?
    Ele soltou a fumaça e exibiu um sorriso.
– Desta vez, querida, você vai envolver o movimento estudantil em uma manifestação contra os rebeldes, pacífica, é claro, acompanhada dos militares.
– Senhor, foi reportado que o movimento estudantil, como um todo, era apenas para exigir melhorias na universidade como: mais livros, maior variedades no cardápio e..
– Sim, sim. Foi como eu queria o movimento, que só se envolvessem em questões que eu julgo serem saudáveis para a nação, mas no momento, preciso recorrer outros métodos.
  Ela refletiu o pedido inesperado, geralmente era apenas a imagem de Jude que era utilizada para representar todo o movimento estudantil, que de acordo com o secretário as pessoas iriam prestar mais atenção apenas no rostinho bonito no que a mensagem em si, o que deixou ela furiosa.
– Faça o mesmo de sempre, vista algo bonito e não esqueça que seu discurso deve ser analisado antes de ir para mídia, você me entende, Jude?
– Sim, Vossa Excelência.
– Ótimo, agora vamos aproveitar a festa.

  Ela saiu da sala completamente enjoada, sentindo-se humilhada e oprimida, hoje de duas maneiras diferentes foi chamada indiretamente de inútil. Jude foi em direção ao salão principal e encontrou o estranho encostado numa das colunas, ele ergueu uma taça de vinho em sua direção, fazendo o brinde silencioso. diabolicamente belo, ela pensou. Em resposta apenas virou e seguiu seu caminho, iria procurar Rowan, queria ir embora daquela maldita festa.

  Ela sentou no chão da sala do seu apartamento enquanto encarava o envelope amarelo, Rowan dormia profundamente no seu quarto, certamente bêbado. O relógio maracava ás 3h da manhã, apenas a luz fraca do abajur iluminava o envelope em suas mãos. Suspirou e abriu o envelope, leu o conteúdo e quando percebeu estava segurando uma garrafa de vodka e chorava furiosamente.

  Ao acordar, percebeu que ainda estava na sala, a garrafa vazia indicava que afogou as mágoas da pior maneira suas pálpebras pesavam, dificultando abrir os olhos. Resolveu tomar impulso e levantou, precisava ir para a universidade, se arrumou sem cerimônia pegou um moletom qualquer e seguiu seu caminho o dia ia ser longo.

  Jude adentrou os portões da UEP (Universidade Estadual da Pólis) e já foi abordada por uma Elena muito agitada.
– Estamos com problemas, os rebeldes atacaram ontem a impressa está uma loucura.
– O que houve?
– Invadiram mais um armazém que continha armas e aparelhos tecnológicos – disse enquanto olhava suas anotações. – Jude, a impressa deve chegar em minutos, já sabe o que irá dizer?
  Ela exibiu um sorriso.
– Mas é claro.
  Elena olhou atentamente Jude dos pés á cabeça.
– Você não parece bem.
– Nunca estive tão lúcida, Elena, estarei pronta para meu depoimento. Agora.
– Mas e a revisão? Você sabe, a diretora precisa analisar tudo o que for dito para a mídia.
– Foda-se a revisão.
  Elena arregalou os enormes olhos verdes e tirou os óculos, tentando parar Jude que caminhava em passos largos até os portões da UEP.
  Os repórteres viram Jude e correram em sua direção enquanto apontavam luzes e câmeras para capturar seu melhor ângulo, quando houve a primeira pergunta.
– Qual sua opinião sobre o ataque rebelde na noite anterior? Há uma grande possibilidade de que sejam jovens, você concorda com as atitudes?
– Talvez – murmurou Jude.
   Elena que estava ao seu lado permaneceu imóvel e depois tocou o braço da amiga.
– Talvez – disse mais alto.
– Quer dizer que você compartilha da mesma filosofia dos rebeldes? Perturbar a paz de nossa nação com tolices?
– Não são tolices, talvez eles querem nos mostrar algo.
– O que? – perguntou um repórter atrás da multidão.
– O quão cego nos somos – silêncio total, mas Jude prosseguiu – essa cortina de fumaça na qual nós fomos submetidos, só mostra o quão sujo eles são.
Ela se lembrou do conteúdo do envelope, o que deu mais motivação para continuar.
– Estamos fadados em viver na escuridão, cheias de mentiras e ilusões, eu nem posso dizer tudo o que quero, hoje é a primeira vez em anos que digo algo verdadeiro pois ele – apontou para a imagem do Eleito na frente da universidade  – sempre colocou palavras na minha boca, hoje meu pai realmente ficaria orgulhoso de mim, sua morte não passará despercebida.
Depois de dois minutos de silêncio, houve uma grande comoção dos repórteres mas Jude correu de volta para UEP em direção ao banheiro quando foi impedida por braços fortes. Era Rowan.
– O que foi aquilo? Ficou maluca?
– Nunca estive tão lúcida – vociferou.
  Rowan olhou pra cima em um pedido silencioso por paciência.
– Você bebeu, Jude?
– Um pouco, não importa, me solta, Rowan!
  Rowan percebeu as lágrimas caindo e olhou confuso.
– O que está acontecendo?
– Meu pai.. mentiram, Rowan, mentiram sobre tudo, esconderam a sujeira como eles sempre fazem.
– Mas seu pai morreu em um acidente de helicóptero..
– Mentira, mentira, mentira – murmurou.
– Jude, calma, vá para o apartamento feche as portas e janelas e espere por mim, as coisas vão ficar difíceis. Bem difíceis.
– Eles vão me torturar? – ela sorriu com tristeza.
Rowan encarou sério. Nunca viu o amigo assim.
– Pare com isso. Vá direto pra casa, Jude, me escute dessa vez, você está completamente fodida.
Ela reuniu coragem levantou o capuz do moletom e foi embora, talvez estivesse mesmo fodida.

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