Cair na real

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Mais tarde naquele dia, Jude andava em círculos na sua sala de estar, o nervosismo se espalhava pelo seu corpo, suas mãos tremiam e seu coração martelava copiosamente, o que iria acontecer agora?  Estava com raiva, medo, e ansiosa. Uma mistura de emoções que sufocavam-a, e pra piorar estava sozinha, nunca pensou que faria algo assim, se ria ou se chorava, não sabia, pois estava petrificada emocionalmente, quando ouviu alguém bater a porta, ela olhou para maçaneta. Outra batida. Não abre a porta pra ninguém, declarou Rowan.
  Sem respostas, sua porta foi violentamente arrombada, ela arregalou os olhos procurando algo para se defender quando encarou as pessoas que invadiram sua casa reparou curiosamente que eram dois jovens — sendo mais específico ,— um jovem alto e ruivo acompanhado de uma jovem loira que usava uma touca preta, ambos vestiam preto.

— Nós temos cinco minutos, vamos — disse a loira.
Rebeldes refletiu Jude, mas ela continuou petrificada.
— Não temos tempo, você vem conosco ou fica pra saber o que vão fazer com você. Decida logo! — a loira levantou a voz enquanto o ruivo digitava algo pelo celular.
— Já se passou um minuto, Diana.
— Droga! Pegue algo e vamos. Mexa-se, garota!
  A loira olhou furiosa para ela, que acenou as mãos pedindo um momento enquanto pegava um moletom azul e o envelope, assim seguiu os dois jovens para fora do apartamento. O ruivo sinalizou com a cabeça para as escadas em vez do elevador e quando saíram pela portas dos fundos eles correram pelas ruas escuras e sujas da cidade de Pólis, depois entraram na movimentada rua Bauman, cuja especialidade eram restaurantes de comida chinesa.
  O ruivo apontou o último restaurante da rua, uma singela propriedade que havia poucos clientes e adentraram no estabelecimento. A mulher loira correu para cozinha, abrindo a porta dos fundos que dava para um beco, logo a frente havia um caminhão frigorífico e o ruivo foi para o banco do motorista enquando a loira abria a traseira do caminhão para ela.
— Vai fazer um pouco de frio, espero que não se importe — a jovem abriu um sorriso cínico.
— Pensei que estávamos sem tempo. — retrucou Jude fingindo calma ao subir para dentro.
  A jovem chamada Diana fechou a cara e lançou um olhar frio e correu para o banco passageiro ao lado de Kev.

Estava frio. Não tão frio ao ponto de manter os produtos tão bem conservados, mas frio o suficiente para fazer Jude estremecer, puxou as pontas do moletom para cobrir as mãos e estava escuro como o breu, e tudo o que podia fazer era contar os minutos.

20 minutos depois houve uma drástica descida, ela se segurou para impedir que deslizasse no chão imundo do caminhão deve ser algum lugar subterrâneo, pensou. E então o motor morreu e alguns barulhos foram ouvidos do lado de fora, ela encostou o ouvido direito para distinguir os ruídos quando as portas foram arregaçadas, entrando uma luz quase cegante.
— Fez boa viagem? — perguntou o ruivo educadamente sorrindo.
  Ela nao disse nada.
— O passeio acabou Judith Montez, desça agora — cantarolou Diana aparcendo no campo de visão de Jude.
  Ela levantou lentamente e andou até a beira do caminhão, encontrou três pessoas, um alto de cabelo preto conversava com Diana enquanto Kev estendeu sua mão para ajudá-la descer.
— Aqui —  Kev lhe entregou uma bolsa térmica de água quente. — Para as mãos.
— Obrigada.
  Ela olhou em volta, o local lembrava uma enrome garagem subterrânea havia alguns carros, caminhonetes e caixas de tamanhos variados e encarou os jovens conversando, quando escutou passos pesados se aproximando ela virou para a origem do som e foi surpreendida. O estranho do jantar anterior estava na sua frente sem terno, sem penteado e sem o sorriso sarcástico que ele tanto exibia na noite passada, vestia um moletom preto combinando com a calça e botas pretas, estava sério e o olhar frio abalou Jude. Seus olhos estavam em Kev e Diana.
— Estão atrasados. — Sua voz era cortante
   Diana arquejou.
— Pergunte á ela, levou dois minutos para arrastá-la do apartamento.
Ele olhou para Kev.
— Mas tirando isso, ocorreu tudo bem, ninguém nos viu entrar e sair.
  Ele finalmente centrou seu olhar em Jude e sinalizou com a cabeça para que chegasse perto. Ela não obedeceu.
— Quer ficar aqui, então? Ou tenho que anunciar sua chegada?
— Óbvio que não, só quero saber o que está acontecendo, o que é tudo isso..
Ele concordou.
— Vamos te alojar primeiro. E depois esclarecemos tudo, no entanto, isso vai ser lá dentro.
  Os jovens seguiram seu caminho para o portão que levava para dentro de uma estrutura fortificada deixando eles para atrás, que mantinham passos lentos, pois Jude observava tudo ao seu redor e quando estavam perto o estranho se virou para ela.
— Tudo que presenciar aqui será mantido em total sigilo, você promete?
— Sim.
  Ele deu um pequeno vislumbre de um sorriso.
— Ah, e a propósito, meu nome é Kai.

                                ▪
  Dentro do complexo aparentava ser como um enrome.. refeitório. Havia mesas e cadeiras espalhadas e jovens entretidos em seus computadores e celulares, alguns consertavam algum aparelho tecnológico. Tinha uma escada no canto do refeitório e liderados por Kai o grupo subiu e Jude se deparou com um corredor com várias portas, ele abriu a primeira e entraram numa sala.. Jude quase sorriu ao lembrar que a sala mais parecia um clube recreativo para jovens só que.. com mais liberdade. As paredes eram pichadas, livros espalhados, uma bola de basquete surrada e uma mesa repleta de aparelhos tecnológicos. Kev, Diana e o garoto alto de cabelo preto se jogaram no sofá, e Kai indicou a cadeira para ela.
— Saiu algo no noticiário?
   Perguntou Kai
— Nada ainda — respondeu o alto de cabelos pretos.
— Vocês nem sabem se isso vai funcionar  — resmungou Diana.
— Diana.. — começou Kev
— O quê? Ela nem mesmo agradeceu por salvarmos a bunda dela.
— Você me jogou num frigorífico — contrapôs Jude.
— Ah, desculpa, queria um cobertor, princesa?
— Chega, Diana — disse Kev empurrando-a para fora da sala com relutância, Diana se esquivou e saiu com passos tão pesados que poderiam marcar o chão. O garoto alto entregou um tablet para Kai e seguiu seu caminho, fechando a porta.
— Perdeu dois minutos por causa de um moletom, envelope e uma bolsa térmica?  Kai ergueu as sobrancelhas.
— Por que estou aqui?
— Foi muita coragem sua fazer aquela declaração na tv.
Jude continuou em silêncio, por fora mantinha uma expressão fria mas por dentro sentia que ia explodir Kai iniciou:
— Os privilegiados odeiam escutar sobre as dificuldades dos outros, eles pensam: se eu estou comendo e vestindo bem, por que me importar com outros? Enquanto haver vinho caro na minha dispensa e caviar na minha mesa, eu estou bem, o problema dos outros não me interessa
  Continuou:
— O governo adora criar a
ilusão de que vivemos em uma sociedade livre em que todos possam dar sua opinião, mas nós dois sabemos que não é assim. Por isso, o Eleito escolheu você.
— Me escolheu?
— Sim, você não sabe mas, seu papel nos dar uma falsa sensação de liberdade e livre arbítrio. Mas isso é mentira, pois, tudo o que você solta na mídia são falas decoradas, é quase como se você estivesse lendo um livro tedioso  — ele ri — Não é real, e as pessoas fora do círculo de privilegiados perceberam que estava sendo usada, manipulada.
Jude estava estupefata e piscava várias vezes.
— Mas nós participamos ativamente do movimento, exigimos nossos direitos e..
— Não, Judith, vocês não protestam, vamos lá, variedades no cardápio universitário? Mais aulas sobre a história da Pólis? — Ele balançou a cabeça — Isso não é protestar, é alienação.
Ela balançou a cabeça, mas lembrou da conversa com o Eleito "queria que o movimento estudantil apenas se envolvessem em questões que eu julgo serem saudáveis para a nação" E o quê seriam saudáveis na visão do Eleito? Algo que não afetasse sua reputação e da Pólis? Não demonstrar descontentamento com o país que vive?

— O que você sabe sobre meu pai? — perguntou desviando o foco da conversa central.
Kai não demonstrou abalo com a mudança repentina.
— Foi difícil encontrar os dados, mas tudo indica que ele não morreu em um acidente de helicóptero.
Ela segurou as lágrimas.
— O envelope que você me entregou diz que ele desapareceu no dia 10 de outubro, mas foi dado como morto no dia 13 e que os dados não batiam com o DNA do meu pai no corpo encontrado no helicóptero.. algum palpite onde ele esteve nesses 3 dias?
— Não.
Ela olhou ao redor da sala procurando esconder as lágrimas.
— O que eu estou fazendo aqui?
— Você vai fazer parte do nosso plano de derrubar a Pólis.
Ela riu sem graça.
— Você acabou de dizer que eu fui usada e agora quer usar a minha imagem? Está sendo que nem eles.
Kai se aproximou e ela pôde sentir o hálito de hortelã, notou que seus olhos eram escuros como a noite.
— Pare com isso, estou te dando uma escolha, não vou obrigá-la vestir algo elegante e jogar besteiras na TV, se quiser ir vá em frente, eu mesmo a levarei até a porta do seu apartamento, aposto que deve ter militares te esperando.

  Jude sentiu a raiva subir até as bochechas deixando-as vermelhas, ainda estava assustada com tudo que aconteceu hoje e tentava a todo custo manter a pose orgulhosa e inabalável, mas tudo o que foi dito por Kai fazia sentido, talvez no fundo soubesse a verdade que era apenas um rostinho bonito sendo usado, já houve antes reflexões a respeito do seu papel no mídia e sempre terminava com a mesma sensação; de frustação. Mas não iria demonstrar fraqueza agora, então empinou o queixo e disse:
— Ajudo com uma condição, que resgate meus amigos, Rowan e Elena.

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