Ateliê

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    Mesmo que eu não quisesse voltar eu ainda tinha algumas aulas e precisava assistir elas, mas não entrou na minha cabeça, foi tudo tela preta.
    Eu não me concentrei em nada, fui de uma aula pra outra como um robô, nem me lembro do que os professores estavam falando. Quando vi já era hora de ir embora e fui procurar um dos meninos pra me dar uma carona.
    Achei o Edu perto do estacionamento, junto com uns amigos dele, achei melhor não atrapalhar. Até ele me chamar e ver ele vindo até mim.

- Nem sabia que você tinha vindo - falou assim que parou do meu lado.

- Não graças a vocês.

- Ah, qual é? - disse me empurrando com o ombro. - Você tava dormindo sentada, achamos melhor te colocar na cama e deixar.

- Aí eu me atrasei e o Sr Jhonnes disse que eu atrapalhei a aula - resmunguei séria. - Sem contar a vergonha que o Nick me fez passar.

- Eu fiquei sabendo - me olhou querendo rir, mas ficou sério rápido.- Não é sua culpa, sabe, ele se iludir.

- Pô, eu disse isso pra ele, mas mesmo assim ele pareceu triste hoje - me encolhi sentir frio, ele me abraçou.

- Não é culpa sua, mas não dá pra mudar os sentimentos dele - me olhou com sinceridade. - Dá um tempo pra ele, vai passar.

- É, vai - concordei desanimada.

- Você vai querer carona?

- Você ainda pergunta? - ele riu e pegou as chaves, me entregando.

- Você dirige - e saiu correndo.

- Ah não, não é justo - resmunguei correndo também.

- Ninguém mandou querer carona - gritou levantando os braços no ar.

- Seu sem graça - deu língua pra ele.

   Edu continuou correndo até chegar no carro, quando eu cheguei ele foi pro lado do passageiro, me deixando sem alternativa. Desliguei o alarme e entrei, ele fez o mesmo, ficamos em silêncio por um tempo.
    Nós dois sempre fomos assim, nunca tivemos isso de silêncio chato ou diversão fingida. Sempre soubemos complementar o outro, mas sem ser forçado, é fácil ter amizade com ele.

- Que tu vai fazer hoje? - ele resolveu quebrar o silêncio primeiro.

- Vou sair mais tarde, quer ir? - olhei pra ele no sinal.

- Depende, onde tu vai?

- Vou compra umas coisas na papelaria e depois vou jantar com o Peter - já estávamos perto de casa.

- Acho que vou, tô atoa mesmo - deu de ombros.

- Tá - estacionei e olhei ele. - Só vou tomar um banho e já saio.

   Concordou com um aceno saindo do carro, também saí travando o mesmo e entregando a chave. Assim que entramos em casa vemos o Rodrigo saindo apressado.

- Ué, aconteceu alguma coisa? - minha curiosidade não me deixou quieta.

- Tenho que resolver uma coisa no escritório - me deu um beijo na testa e saiu.

- Esse cara é estranho - belisquei o Edu. - que foi?

- Você não pode falar assim dos outros, eu hein.

- Tá bom, mamãe - odeio quando ele me chama assim.

- Eduardo, acho bom você parar - falei séria.

    Ele fez careta indo em direção as escadas enquanto eu ia na cozinha, eu não comi muito hoje, não vou comer muito já que vamos jantar daqui a pouco.
    Logo já estou subindo as escadas para o quarto e indo tomar banho. Eu amo tanto banho morninho, sempre me acalmar e deixa relaxada, por isso aproveito. Quando saio vou direto procurar roupa, aqui sempre é frio, pelo menos eu acho. Coloquei um conjunto de moletom rosa e um tênis branco, devidamente vestida saio do quarto e procuro o Edu, que esta na sala.

- Tá pronto? - digo descendo as escadas.

- Claro, peppa pig - diz rindo da minha roupa enquanto guarda o celular no bolso.

- Vai se fuder, Edu - digo indo para a saída. - vamos logo!!

- Tá estressada demais, heim.

- Você sabe muito bem o que aconteceu - tranco a porta assim que a gente saí. - eu já vou avisando que não vou dirigir.

- Tá bom - ele sai bufando.

   O caminho foi bem tranquilo, a cidade aqui é bem bonita e calma, sempre gostei disso. Assim que chegamos na papelaria e estacionamos, vou logo procurar o Peter, mas não encontrei ele.

- Talvez ele esteja no ateliê - o Edu diz me ajudando a procurar ele.- tem uma luz acesa lá.

- Vou lá ver, já volto - assim que abro a porta vejo um cara sem camisa com uma calça preta e uma garota nua no divã. - Meu deus, desculpa não queria atrapalhar, merda.

   Fecho a porta e saio correndo, acabo encontrando o Edu e Peter.

- Que foi? Vou fantasma? - Edu pergunta assim que eu chego correndo.

- Que aconteceu? - Peter pergunta enquanto eu tomo fôlego.

- Acho que eu atrapalhei a transa de alguém - respondo me recompondo. - eu achei que era você, Peter.

- Que? Quem tava transando? - parece que nem ele sabia.

- Tem um casal no ateliê, ela tá nua no divã e ele só de calça - eu ainda não acredito nisso. - Parecia que era isso.

- Puta que pariu, é meu chefe - Peter diz já colocando a gente do lado de fora da loja.

- Aquele velho? - Edu pergunta perdido, igual a mim.

- Não foi ele que eu vi - eu tô tonta com isso. - era um cara da nossa idade.

- É o filho dele - ele diz soltando a gente. - ele veio morar aqui na cidade, vai cuidar da loja e estudar.

- Ele tinha que transar logo no ateliê?! - fico com nojo só de pensar. - eu gosto tanto de lá, agora sempre que entrar vou lembrar disso.

- Ele é o dono, pode fazer o que quiser - Edu diz indo até o carro.

- Não, não pode. Acho isso errado - começo a voltar mas o Peter me segura. - me solta, eu vou lá falar umas coisas com esse idiota.

- Tá louca? Eu preciso desse emprego - tento me soltar dele. - Ei, para!!

- Ele é um idiota, o ateliê era um lugar puro, imaculado - começo a chorar, só o que faltava. - era o meu lugar!! Livre de tudo de ruim.

- A gente vai dar um jeito, eu prometo - Peter me abraça afagando meus cabelos.

- Tá tudo bem, qualquer coisa podemos fazer um ateliê lá em casa - Edu também vem me abraçar.

- Ele não podia fazer isso, não tinha o direito - não sei quanto tempo eu chorei, mas os meninos continuaram me abraçando.

Diário de uma intercambista desastrada Onde histórias criam vida. Descubra agora