𝐓𝐖𝐎

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Sorveteria Milk-Shakespeare
Santa Mônica, CA.
Outono de 2022
5 meses para a formatura

Para alguém habituada a projetar possíveis futuros e estar devidamente preparada para todos eles, você estava decepcionada consigo mesma por não se prevenir à possibilidade daquele cenário.

Não fazia a menor ideia do que a motivou a ir até ali. Em um momento, estava explorando o novo apartamento, contando os minutos para finalmente conhecer a pessoa com quem compartilharia o lugar até a primavera, no outro, dirigia pelas ruas agitadas de Los Angeles, seguindo em direção ao litoral de Santa Mônica.

Só percebeu o que havia feito quando as borboletas no seu estômago se agitaram, ansiosas por encontrar Koshi Sugawara outra vez.

Panapaná, por favor, fique quieto! Suplicou internamente.

Um suspiro escapou dos seus lábios no exato momento em que reparou que ele te encarava em silêncio, por tempo suficiente para qualquer um considerar constrangedor. Contudo, nunca sentiria qualquer sinônimo de desconforto ou constrangimento quando o assunto era se demorar sob aqueles olhos.

— Olá. — Conseguiu falar, apesar da garganta seca ter feito a sua voz soar meio rouca.

O cheiro adocicado, característico do sorvete de baunilha caseiro da Sra. Sugawara, ainda perfumava a velha e saudosa Milk-Shakespeare. A sorveteria estava diferente, a maioria das mobílias que você tinha um certo apego emocional haviam sido substituídas por novas, apagando qualquer rastro significativo, como a inicial do seu nome junta a de Koshi dentro de um coração torto, entalhados no tampo de madeira da mesa oito.

Mas, estranhamente, algo que não tinha qualquer vínculo com a nova decoração do estabelecimento, fez você sentir a esquisita sensação de Jamais Vu.

Havia uma grande possibilidade de que o pivô daquela angústia repentina fosse a maldita impressão de que você tinha se tornado ignorante à tudo o que um dia conheceu como a palma da mão. Naquele momento, sabiam demais um do outro para dispensar cerimônias e formalidades, mas, talvez não o suficiente para darem um fim definitivo à distância que os separavam.

Por que sinto que parecemos estranhos de novo? Sua mente se agarrou àquela dúvida, apesar de se manter oscilante entre o desejo desesperado de se fundir a ele em um abraço, e o contentamento de manter um diálogo casual à distância.

Será que ele sequer se lembra de mim? Será que ele sequer se lembra de nós?

A questão súbita que tomou os seus pensamentos, nutrida pela forma como Koshi te observava, foi o único motivo que te fez permanecer onde estava, sem dar um passo sequer. Os olhos castanhos dele esquadrinhavam o seu rosto com cautela, como um dia olharam para você, quando não passavam de desconhecidos.

Não entendia, e não gostava de pensar muito no motivo de ainda se importar em usar o "nós" para se referir a algo que não tinham sido, sabia que a culpa sempre recairia na adolescente frustrada com a interrupção de um quase romance de verão que ainda habitava em algum lugar dentro de você.

— Você se lembra de mim?

Ele suspirou à medida que meneou a cabeça para os lados, os movimentos quase imperceptíveis.

Se os corações fossem feitos de vidro, tinha a certeza de que uma rachadura teria surgido na superfície do seu naquele momento.

Estava prestes a bater em retirada de volta ao apartamento quando a boca dele se repuxou em um sorriso contido. Koshi soltou leves lufadas de ar pelo nariz enquanto continuava a negar com a cabeça, encarando você com um misto de descrença e fascínio.

𝐏𝐀𝐏𝐄𝐑 𝐑𝐈𝐍𝐆𝐒, 𝐬𝐮𝐠𝐚𝐰𝐚𝐫𝐚 𝐤𝐨𝐬𝐡𝐢Onde histórias criam vida. Descubra agora