Injusta

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"O erro só é bom enquanto somos jovens. À medida que avançamos na idade, não convém que o arrastemos atrás de nós."

Johann Goethe

O sinal para o intervalo soou pelos corredores do colégio Flores e as portas das salas se abriram. Dezenas, centenas, milhares de alunos saíram gritando de alegria, conversando ou reclamando dos professores, numa confusão de vozes que quebrava o silêncio que reinava até então. Aquele era um dos horários mais esperados pelos alunos, perdendo somente para o do final da aula, onde se divertiam com os colegas. Para Leona, que observava Sophia oferecer um bolinho para Miguel a algumas mesas de distância, aquele se tornou um péssimo horário.

– Com essa carranca acho difícil o Miguel te querer... Ah! Esqueci. Ele não te quer de jeito nenhum.

Ouvindo a risada de Cássio, que se sentara sem ser convidado ao seu lado, Leona desejou poder corta-lo em pedacinhos e lança-lo aos tubarões pra se livrar daquela peste.

– Em vez de ficar me azucrinando, vai estudar pra não repetir o terceiro ano de novo.

– Só repeti pra te fazer companhia.

– Pois dispenso a sua companhia.

– Claro. Prefere ficar sozinha pra observar o Miguel receber comidinha na boca — zombou Cássio.

– Logo serei eu a dar comida na boca dele — garantiu confiante.

– Só nos seus sonhos — Cássio retrucou envolvendo uma mecha do cabelo de Leona entre os dedos.

– Acredite isso está prestes a acontecer — garantiu confiante antes de se levantar e marchar em direção ao banheiro feminino.

Cássio só começou a entender as palavras da ruiva quando notou que Sophia não estava mais do lado do Rodrigues. Sorriu deixando a mostra seus dentes. Queria ser uma mosquinha para ver o que aconteceria naquele banheiro.

*S2*

– Oi, Sophi!

Encostada na pia observando distraída sua saia, que agora estava alguns centímetros mais curta, Sophia levantou o olhar e, após um momento de surpresa, sorriu.

– Oi, Leona!

– Vim te pedir um pequeno favor — começou a ruiva se aproximando da Almeida, os olhos por trás das lentes adquirindo um brilho malévolo. — Se afaste do meu Miguel.

Após o pedido Sophia compreendeu o porquê de Leona lhe cumprimentar.

– E-eu gosto do Miguel... — começou sendo bruscamente interrompida pela colega.

– Todas gostam, mas ele é meu — informou possessiva. – Por isso não posso permitir que continue a desfilar ao lado do meu Miguel. Se você não se afastar por bem...

– O que você irá fazer Leona? — Uma voz feminina perguntou.

Leona olhou para o lado, onde Marina a encarava com a expressão e os punhos fechados.

Não havia percebido que tinha outra pessoa no banheiro, se fixara na Almeida e deixara de enxergar o que havia ao seu redor. Olhou para as demais cabines para se certificar que somente as três permaneciam no local antes de responder a pergunta da jovem.

– Vou fazer o que foi combinado, destruir a Almeida. Não lembra a ideia que partiu de você? — Ignorando Marina, Leona voltou a falar com Sophia. — Sabia que a sua amiguinha é a culpada pelos "acidentes" que teve nos últimos dias? Que ela finge gostar de você pra nos informar de tudo o que ocorre entre você e o Miguel? Que o namoro dela com o André é só uma desculpa pra ficar próxima do Miguel?

– Isso não é verdade — Marina esbravejou antes de encarar Sophia com vergonha. — A maioria do que essa víbora disse é verdade. Menos sobre André. Comecei a namora-lo pra esquecer o meu amor doentio pelo Miguel, não pra me aproximar de quem quer que seja. Desculpe-me! — pediu com humildade.

Sophia ficou pensativa por alguns segundos e depois sorriu.

– Marina, não precisa pedir desculpas – disse tocando a jovem no ombro que, ao encara-la, se surpreendeu com o sorriso meigo da Almeida. – Somos amigas.

Leona riu.

– Vocês são duas otárias que se merecem — cuspiu antes de caminhar até a saída do banheiro e abrir a porta. Porém, antes de sair, resolveu dar um último aviso. — Almeida, essa foi minha tentativa pacifica, caso não faça o que te pedi não poderá reclamar depois.

– Você... Realmente me perdoa? – Marina perguntou ainda em dúvida se ouvira direito.

– Claro – Sophia respondeu de pronto. – Graças a você encontrei o meu verdadeiro amor, o Miguel. Se não tivesse decidido esquece-lo namorando o André, eu não aceitaria namorar o Miguel e continuaria perseguindo o André com os olhos, sofrendo em silêncio.

As sobrancelhas de Marina se juntaram e os olhos esmeralda semicerraram. Marina não conseguia compreender as palavras que saíram da boca da Almeida.

– Mas... Você e o Miguel já estavam saindo antes do meu namoro com o André começar... Não estavam?

– Não! — Sophia respondeu estranhando a pergunta. — Miguel me pediu em namoro depois que saíram inventando mentiras sobre nós dois, e eu aceitei justamente porque o André estava com você – explicou.

– Quer dizer que esse tempo todo fui injusta? – murmurou a jovem em choque. – Pior. Você não roubou o Miguel de mim; eu que roubei o André de você.

– Não é bem assim... André nunca me pertenceu... – disse a Almeida evitando acrescentar que Miguel também não tinha sido propriedade da jovem, mas só por notar a palidez da amiga. – Melhor sairmos pra você beber um gole d'agua – sugeriu.

Percebendo que Marina não pretendia se mover, ou tinha dificuldade pra fazê-lo, Sophia a segurou pelo braço para guia-la de volta para a mesa que ocupavam com Miguel e André.

– Vocês demoraram! – André reclamou, até reparar no estado da jovem que sentou como se carregasse um peso enorme nos braços. – O que houve? Está passando mal, Marina?

– Eu fui tão injusta... Fiz tantas coisas ruins... E quem roubou fui eu...

– Do que ela está falando? O que ela roubou? – André perguntou para Sophia após se sentar ao lado da Limeira.

– Er... É complicado explicar – Sophia respondeu sem graça e levemente corada. Preferia evitar esclarecer os murmúrios que Marina soltava meio aérea. – Tome um gole do meu suco, Marina – ofereceu colocando sua garrafinha de suco na frente da amiga.

O sino tocou estridente alertando que era hora de voltar a estudar e que qualquer tipo de explicação teria de ficar para depois.

Meu Coração quer Amar e ser AmadoOnde histórias criam vida. Descubra agora