um dia eu bebi tinta

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     Um dia eu bebi tinta, bebi cor numa tentativa falha de me tornar colorida. Numa tentativa falha de que toda aquele pigmento escorresse pela minha garganta dando cor a todo cinza que me preenchia cada vez mais.
   Um dia bebi tinta, peguei aquele copo com tantas cores misturadas e bebei, engoli garganta a baixo, apreciei cada gole com gosto metálico e torci para que aquilo me desse a vida que eu tanto procurava e não me matasse com a toxicidade que estava escrito na embalagem da tinta a óleo que bebi.
    Um dia eu bebi tinta, bebi a tinta que se desfazia em nuvens do pincel em água, eu bebi, mas aquilo não me coloriu nem me trouxe a vida nem a intensidade que aquela cor tinha com ela
   Um dia eu me bebi, me derramei em um copo com água e bebi, torcendo para que enquanto eu deslizasse dentro de minhas entranhas me encontrasse perdida em algum lugar, mas não me encontrei em lugar algum e eu me derramei para algum o vazio oco dentro de mim onde não tinha nada, só água com tinta velha que um dia eu bebi.
   Tinta dia um bebi, na esperança engoli um pincel também, vai ver eu só não estava colorida porque não existia um pincel dentro de mim para pintar todo aquele preto nas paredes do meu intestino, eu falhei de novo minhas borboletas nem se importaram com a presença de tantas cores, nada aconteceu, vai ver a tinta que bebi expeli pelos meus poros ou pelas minhas lágrimas que deslizavam para fora de mim ontem a noite.
   Eu bebi dia um gasolina, bebi gasolina na esperança de fazer minhas entranhas reagirem na esperança de meu estômago ressuscitar as borboletas, todas mortas. Mas a gasolina escorreu por dentro de mim e não me encontrou mas encontrou a tinta já seca que dia um eu bebi.
   Um dia eu nos bebi na esperança que isso me trouxesse a felicidade, mas não trouxe, nós nos escorremos por dentro de mim e nós me arrancamos pedaços deixando feridas abertas em minhas tripas, que até hoje não sararam. E agora as borboletas mortas e todas as minhas feridas em entranhas e tripas entram em decomposição junto a mim, a tinta, a gasolina, as borboletas e a nós.
    Um dia bebi álcool 70 puro na esperança que ele deslizasse pela minha garganta e matasse tudo que me mata mas ele só fez minhas feridas arderem e as borboletas se desfazerem. Não deu certo no final o álcool 70  se evaporou de mim, junto a tinta, a gasolina, a nós as borboletas.

-um dia bebi tinta em uma tentativa de me tornar colorida-

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