Josh

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Um feixe de luz solar ultrapassa a barreira de cortinas e bate nos meus olhos, me tirando do sono leve. Dormi pouco mais de duas horas – passei a noite me deliciando com o corpo escultural de Any Gabrielly –, mas não me sinto cansado. Pelo contrário! O fraco raio de sol me informa que a tempestade de neve finalmente terminou, o que é animador.

Olho para Any, deitada de bruços ao meu lado sobre o colchão macio. Os cabelos castanhos estão espalhados por sobre suas costas. Sua expressão é serena, com um leve sorriso nos lábios carnudos. Agora, passada a noite nada usual que vivenciamos, me pergunto se tomei a decisão certa ao convidá-la para me acompanhar a São Francisco. Imagino que meu pai não será exatamente um problema – ele gosta de novidades, e também, principalmente, de qualidade. Mas conheço o suficiente meu único irmão para saber que terei de responder a algumas perguntas. Por isso, é melhor garantir que a história que terei de contar seja boa o suficiente para enganar o faro apurado de Vinnie.

Levanto devagar. Quero resolver algumas coisas antes que Any acorde. Tomo um banho rápido e visto uma roupa casual: calça jeans, camisa de botões azul-claro, sapatos de couro. Saio do quarto e vou para a sala, de onde ligo para a recepção e solicito que o café-damanhã seja servido na cobertura. Como não faço ideia do que Any costuma comer nodesjejum – o mais provável é que ela nem esteja acostumada a degustar um – solicito todos os itens constantes no cardápio.

Em seguida, pego o celular para fazer o primeiro contato necessário nessa manhã. Lamar Morria me atende prontamente; estava aguardando meu telefonema. Ordeno que prepare nossa partida e providencie alguns documentos, cujos dados especifiquei sem demora. Ele não faz qualquer tipo de indagação sobre o pedido, e tampouco é necessário informá-lo de que não deve comentar com ninguém a respeito de Any Gabrielly. Uma das maiores qualidades de Lamar é sua discrição. Além disso, ele, melhor do que ninguém, conhece as consequências de contrariar um Beauchamp.

Após finalizar a ligação, disco novamente, dessa vez para Vinnie. Ao contrário de Lamar, ele demora alguns segundos para atender. Estou quase desistindo quando a voz familiar soa do outro lado da linha:

— Já está em São Francisco? — ele pergunta, ao atender. — Surgiu um compromisso importante ao qual preciso que você compareça.

— Bom dia, irmão. Estou em Nova York, me preparando para retornar. O que houve?

Vinnie me informa os detalhes sobre um carregamento preso na alfândega, precisando de auxílio financeiro para ser liberado. Trata-se de uma importante carga de armamento que já tem destino certo e precisa ser conferida e despachada.

— Sem problemas. Sigo para lá assim que pousar em São Francisco.

— Faça isso.

— Você irá à Espartacus mais tarde?

— Provavelmente, se tudo correr conforme o planejado. Por quê?

— Faz tempo que não nos vemos.

Consigo visualizar meu irmão revirando os olhos verdes, que herdou de nossa mãe.

— Acho bom você voltar logo aos negócios, Josh. Esse clima natalino e essa cidade cheirando a canela estão deturpando seus sentidos. Você está ficando sentimental demais.

Sorrio, acostumado à frieza usual de minha família.

— Tem razão. Nos vemos em breve, então.

— Faça uma boa viagem.

Assim que encerro a ligação, escuto um barulho às minhas costas. Olho para trás e vejo Any sorrindo, visivelmente sem graça. Ela veste uma calça jeans escura e justa, com botas de couro preto estilo equitação, camisa branca e cinto largo. O cabelo está preso num rabo de cavalo alto, numa clara tentativa de dominar os cachos, rebeldes nessa manhã gelada.

Usa uma maquiagem leve e pequenos brincos dourados. Apesar das poucas horas de sono, tema expressão relaxada de quem dormiu tranquila e feliz.

— Bom dia, Sr. Beauchamp.

— Bom dia, Any. Dormiu bem?

— Maravilhosamente bem!

Ela tem um sorriso largo estampado na face. Isso é o que mais me agrada: a forma como é transparente. Uma sensação diferente desperta minha curiosidade e atenção. Eu, criado rodeado de luxo e conhecendo tudo de melhor que o mundo pode oferecer, acostumado com mulheres educadas e treinadas para agradar, estou gostando de proporcionar a essa mulher experiências novas. Estou gostando de ajudá-la, uma forma de compensar seu passado recheado de desgraças. Proporcionar a ela uma melhoria de vida, ainda que dentro da sua realidade complicada, é compensador.

— Está com fome? — Ando até ela.

— Estou faminta!

— Ótimo. O café-da-manhã já deve estar servido na cobertura. Venha comigo... O dia será longo e com muitas novidades. Você precisa estar alimentada.

Seguimos em silêncio rumo à cobertura e, chegando à mesa repleta dos mais variados quitutes, saboreamos o desjejum. Quando terminamos, ordeno que Any arrume seus pertences e me encontre na sala principal para partirmos.

A mágica noite de Natal chegou ao fim. É hora de retornar à realidade. 

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