Enfim, nós

96 17 25
                                    

Terminamos por chegar numa área de jardim, próxima à estufa dos reis. Não me era uma área inédita, porém, ainda não tinha, verdadeiramente, parado para apreciar a paisagem em sua plenitude.

— Este plano do palácio é especial — dizia-me Hoseok, após lhe comentar sobre como a beleza da vista naquele ponto tinha me impressionado. — Não existia originalmente. Foi de ordem do Rei que fosse construída esta espécie de jardim.

— Como sempre, é incrível a maneira como tudo sabes sobre os gostos e desmandos dos governantes deste Reino.

— E tu te róis por dentro por não poderes saber como isto se sucede, pois não?

O Conde riu, alto, divertido, e o fato de ele estar se divertindo às minhas custas me deixou irritado. Fechei o semblante, mesmo em dúvida se a máscara deixará entrever que me sentia contrariado, na esperança de que ele notasse e se desculpasse. Hoseok, todavia, não notou, ou simplesmente não deu importância aos meus amuamentos, e depois de rir-se bastante de minha curiosidade, regressou ao assunto anterior, falando sobre como o jardim tinha sido planejado, as plantas e flores escolhidas, e a participação de meu irmão na concretização de tudo.

Devo admitir que, pelas palavras do Conde, era como se houvesse, para meu irmão, certa autonomia naquele Reino, algo que jamais vi em parte alguma. Constatar isto me deixou ainda mais intrigado, pensando em formas como Hoseok sabia tanto, e quais eram, de fato, as ligações que prendiam meu irmão e meu cunhado a ele. Talvez fossem circunstâncias bastante diferentes das que eu imaginava. As novas ideias vinham me surgindo, e eu percebia que, conforme elas implicavam ainda mais o Conde, o unindo de forma inequívoca na intimidade dos reis, eu me sentia mal, agoniado. Àquela altura, eu já não sabia que tomava as dores de meu irmão caçula, ou se estava dando vazão às minhas, as dores que eu não queria admitir que latejavam em mim.

— A música voltou a tocar, Príncipe. — O Conde me deu a mão, num convite. — Depois de tanta comida e bebida, um pouco de exercício seria o ideal para nos deixar alertas novamente, não concordas?

— Fala por ti, Conde — respondi, sério. — Pouco comi, e o que bebi não é capaz de me deixar fora de mim.

— Ah, não? — Vi suas sobrancelhas subirem, por cima da máscara. — Então não devo me preocupar com a possibilidade de estares com teu senso de discernimento avariado?

— Meu discernimento nunca fica avariado, Conde. De onde surge tal preocupação?

— Das intenções que tenho para esta noite.

O Conde, por mais uma vez, como vinha fazendo de maneira incansável, me deu um sorriso, e desta oportunidade, além da aura natural que seu sorriso carregava, havia algo a mais. Eu sabia o que era aquilo, e como mais cedo, uma pontada em meu baixo ventre me deixou cristalino que meu corpo tinha reconhecido os pensamentos que aquele alfa dedicava a mim.

Via-me contrariado, enfezado, imaginando situações que não me agradavam. Sentia-me um joguete nas mãos do alfa ruivo, o que potencializava meu estado de espírito recém adquirido. Por esta razão, perdi as estribeiras, esquecendo meus princípios e objetivos, e me aproximei dele, o suficiente para não precisar elevar tanto meu tom de voz.

— Sabes, Conde... — Iniciei, deveras próximo dele, o encarando. — Estás desde cedo alardeando sobre estas tais intenções que tens comigo. Mas sabes o que vejo, Conde? — Fiz uma pausa dramática, na espera de uma reação, que não me foi dada. — Tu gostas de jogar. Adoras o jogo, por certo. Entretanto, não passas disto.

— É o que pensas, Príncipe?

— Como te disse, é o que vejo, Conde.

— Isto é a tua maneira de me fazer confessar exatamente o que venho desejando desde a primeira vez que pus meus olhos em ti?

By chanceOnde histórias criam vida. Descubra agora