Capítulo 1

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Choro na madrugada


   Iruka andava pelo ambiente, observando seu arredor. Ele não sabia exatamente por que entrou, e como já que estava dentro...não custava dar uma espiadinha.

   Estava escuro, na verdade, seria um verdadeiro breu se não houvesse a graciosa luz da lua. O rapaz agradeceu internamente aos deuses, ou qualquer criatura benevolente, por não estar num lugar desconhecido totalmente às cegas.

   Com o fraco brilho lunar, era possível notar algumas coisas. Tudo ali estava aos pedaços, cheio de teias e mofos nas paredes, objetos quebrados e jogados pelo chão de madeira.

Deprimente, essa era a palavra certa para descrevê-lo. Até porque o lugar parecia ser uma típica Minka*; os quadros estavam envoltos por uma fina camada de poeira nas molduras e algo preto que foi espirrado por toda a parede.

   Havia brinquedos e... uma mamadeira. "Tinha um bebê..." refletiu fitando-a. Sentiu um arrepio subir por sua espinha.

   Isso, sem dúvida, não era um bom sinal.

   Distraído, acabou pisando em alguns cacos de vidro e, no mesmo instante, ele estremeceu e olhou em volta nervoso.

Nada se mexeu. Nenhum barulho. Nada.

"Merda" pensou levantando os pés dos cacos, andou mais cuidadosamente e dessa vez, ouviu um grunhido mais ao longe.

"Um zumbi, que maravilha" suspirou cansado.

   O moreno se escondeu, colocando seu corpo curvilíneo contra a parede desbotada; pôs parte de seu rosto para fora do batente da porta, analisando o local com sua visão periférica. Com um movimento rápido, o rapaz abriu o coldre presente em seu lado esquerdo e empunhou sua faca, de um metal brilhante contra a luz escassa que adentrava o ambiente abandonado, com a lâmina serrilhada e cabo feito com tira de couro. Furtivamente, se aproximou do morto-vivo. Pisava sobre o chão com cuidado, pés leves, como se o piso fosse feito de vidro. Ele estava meio agachado, quase andando de joelhos.

Quando estava quase corpo a corpo do ex-humano, envolveu um braço no pescoço e o puxou graciosamente, cortando-lhe a garganta.

O corpo pútrido caiu, como um saco de batatas, no chão. Morto. Completamente morto.

   Iruka soltou a respiração. Não se recordava de que havia interrompido o ritmo constante, em primeiro lugar.

Com certa resignação, limpou as mãos na calça surrada. Uma gosma preta, viscosa e que exalava um cheiro nada agradável - que provavelmente já foi sangue, em algum momento - manchou sua calça jeans desbotada.

Ele encarou o corpo por alguns segundos. Não era velho, se estivesse vivo, teria pouco mais de 30 anos. Não foi infectado a muito tempo, poderia ser o dono da casa, quem sabe. Balançou a cabeça num movimento rápido, livrando-o de seu estupor. Não era hora de ficar aéreo, não se desejava continuar vivo.

Repetindo o movimento de caça, caminhou agachado, como um animal pronto para atacar, até o outro *portal da casa.

   Dessa vez ele estava preparado. Totalmente alerta e focado.

   O moreno escutou lamento, baixo e choroso. Sem o conhecimento de ser ou não ser confiável, empunhou a faca à frente do corpo e seguiu o som. 

O barulho vinha de um armário, feito de madeira de cerejeira, percebeu o jovem, a superfície estava coberta por poeira e folhas mortas e secas. As portas, por sua vez, estavam com suas dobradiças metálicas obviamente enferrujadas e alguns parafusos caídos no chão.

   Era uma casa de campo, um lugar afastado. Uma casa de gente rica, num passado não tão distante.

A mobília e as posições dos objetos dava indicações de que aquele cômodo, aquele ambiente, antigamente era uma cozinha; Iruka, com muita apreensão e medo, abriu a pequena porta de madeira rapidamente, recebendo, ao mesmo tempo, um grito assustado e um rosnado raivoso.

- Saia de perto de mim, seu monstro! – berrou o garotinho loiro. Estava encolhido sobre algo peludo, que tentava veemente proteger.

   Sem perder tempo, o rapaz tampou a boca do menino com a mão. O mais velho encostou o indicador nos lábios secos balançando a cabeça negativamente. A mensagem era clara: silêncio.

Após alguns minutos, o homem retirou a mão. O garoto ainda estava assustado, mas parecia mais calmo.

- Ei, ei...calma, eu sou amigo, olha – sussurrou apontando para o corpo com os olhos castanhos – Não sou um zumbi.

- T-Tudo bem – soluçou o pequeno.

   O de olhos castanhos teve uma súbita vontade de abraçar o pequeno, porém, conteve-se. Isso iria assustar o garoto, ele era um total desconhecido.

- E gritar não iria ajudar em nada, só iria atrair mais deles – complementou o Umino.

   O loirinho de olhos azuis balançou a cabeça, concordando com o estranho. Ele hesitou um pouco, mas perguntou baixinho:

- Qual o seu nome?

- Iruka, Umino Iruka – sorriu gentilmente – E o seu?

   O menininho mexeu um pouco na camisa, pensando se deveria dizer ou não seu nome. Iruka percebeu, então tentou ser compreensivo.

- Olha...não precisa dize–

- Naruto, Uzumaki Naruto – cortou o jovem.

Diante da súbita atitude do rapazinho, o moreno riu. Não ria assim há muito tempo. Talvez anos.

- Que lindo. O seu nome é lindo, assim como você – elogiou acariciando os cabelos arrepiados de Naruto.

Esse pequeno ato de gentileza fez o Uzumaki corar e sorrir, um sorriso largo, daqueles que enrugam os cantos dos olhos.

- Obrigado, Iruka-san.

- Pode me chamar só de Iruka, se preferir.

- Tudo bem, Iruka.

   O jovem levantou-se e limpou a poeira - imaginária ou não - de suas roupas, pondo sua "Matadora" de volta no coldre de couro preto. Estendeu a mão e o Uzumaki a pegou, saindo de dentro do armário.

Junto ao garoto um pequeno animal o acompanhava. O Umino arregalou os olhos e levantou as sobrancelhas surpreso.

- Uma...uma raposa... – murmurou audivelmente.

- É, uma raposa.

O rapaz de pele parda encarou a raposa por um tempo, olhos com íris avermelhadas, o pêlo felpudo num laranja bem forte e bigodes bem grandes. Os fios brancos de sua barriga e o preto misturado com laranja de suas patas estavam cobertos por lama. Parece que passaram perto de alguma fonte de água, já que não havia nenhum de que choveu por estas localidades.

- Uh...Não querendo ser indelicado, mas...ela é realmente dócil?

- Sim, esse bobo só é marrento – deu tapinhas na cabeça do pobre animal, para afirmar sua fala.

A raposinha rosnou e bufou, como se discordasse do menino. Iruka jura que viu os olhos vermelhos do bicho reviraram, mas podia ser só coisa de sua cabeça. Afinal, estava muito cansado. Muito mesmo

- Tá bom, tudo bem...e qual o nome dele?

- Kurama, o nome dele é Kurama – respondeu com um sorriso brilhante, com um de seus dentes da frente faltando. Era adorável como o menininho podia sorrir.

- Que legal – ele olhou em volta e puxou o rapazinho – Vamos?

- Vamos Iruka, esse lugar é estranho. Não gosto daqui.

Iruka riu e guiou o loiro e animalzinho para fora da casa, todos estavam sujos, fedidos e cansados.

Precisavam ir para casa.

AysúOnde histórias criam vida. Descubra agora