Capítulo 1

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O despertador tocou, fez seu trabalho, e eu fiz o meu. O desliguei no primeiro toque; não porque eu já estivesse acordada ou estivesse acordando, mas porque eu simplesmente, e pela primeira vez na vida desde que parei de fazer manhas quando tinha sei lá, uns sete anos, eu só não queria me levantar, não naquele dia em especial.

- Sila! Acorde querida!  – Ainda com a cabeça por baixo  dos  lençóis,  ouvi minha mãe falar.
- Anne! (mãe!) Só mais cincos minutinhos. – Imploro, em vão.
- Hayir! (não!) Esqueceu que dia é hoje? Levante-se já! – ela ordena.

Descubro minha cabeça e vejo a luz do sol adentrando em meu quarto como um intruso.  Sim, por mais que aquele parecesse ser o  dia perfeito, pois estava ensolarado naquela manhã de outono, para mim, seria um tormento. Era o dia do meu noivado. Com um homem que eu não amava, com um homem que eu não queria.

Claro que eu estava fazendo hora. Me arrumei o mais vagarosamente possível, fiz minha higiene matinal, troquei meu pijama por um vestido soltinho nos joelhos, calcei  sandálias Anabela, amarrei meus cabelos num rabo de cavalo alto e enfim desci, era hora de encarar minha dura realidade. Ao menos por enquanto.

- Günaydin! (bom dia!) – digo ao sentar á mesa do café da manhã.
- Günaydin! – todos respondem.

Estavam todos ao redor da mesa, meu avô Yusuf, o patriarca da família se sentava sempre a cabeceira da mesa; minha avó Ada,  sentava-se a sua direita seguida por minha mãe Nesrin, meu pai Emir se sentava a esquerda de meu avô e eu me sentava ao lado de minha mãe. Todas as mulheres sentavam-se do mesmo lado da mesa, lado oposto aos homens.

- Sila, por que demorou tanto para se juntar a nós? – minha avó pergunta ao levar uma xícara de chá a boca.

- Eu estou com um pouco de dor de cabeça, buyuanne!  (avó!) – digo um tanto forçado. Ela nada diz, apenas continua a bebericar seu chá.
- Emir, vamos! – meu avô se pronuncia ao se levantar. – Temos muito a fazer, e, precisamos estar aqui no horário para receber os Demir. – Imediatamente meu pai também se levanta e pega sua pasta que estava sob a cadeira ao seu lado.  – Hosçakal! (tchau!) – meu avô diz e parte.
- Hosçakal! – meu pai diz também e se vai.
- Hosçakal! – respondemos juntas.

Geralmente as manhãs não eram assim tão corridas; tínhamos ao menos cafés da manhã mais tranquilos na companhia uns dos outros, momentos em família era algo quase que sagrado para nós, no entanto, o tal noivado estava deixando tudo uma bagunça.

- Sila! – minha avó chama minha atenção.
- Evet?! (Sim?!)– digo voltando minha atenção para o presente momento já que eu estava visivelmente presa  e perdida em meus pensamentos.
- Estava tão... longe. Há algo errado, querida?
- Ah, hayir, hayir! ( Não, não!) - disfarço. Ela me olha por cima dos óculos de grau.
- Nesrin, poderia ir à cozinha e pegar mais um pouco de chá? – ela pergunta a minha mãe.
- Claro, anne!(mãe!) – minha mãe diz e por fim se levanta e sai.

Respiro fundo ao tomar um bom gole de chá, eu sabia que a conversa que viria não seria nada agradável. Com um vão da cadeira onde minha mãe estava sentada vazio entre nós, minha avó diz:

- Sila, sabe que nós a amamos muito não sabe?! – faço que sim. – E, se existe algo que eu, seu avô, seu pai e sua mãe mais prezamos é por sua felicidade, minha querida. Eu sei que parece assustador, se casar com um, quase desconhecido, apesar de Aslan ser da família, um primo distante, nós mal o vimos. Mas, você também sabe que prezamos muito nossa cultura, nossas raízes; e, por mais que nós vivemos aqui, não somos desta terra, não fazemos parte desta gente, Sila. Sei que você nasceu aqui, cresceu aqui, pode ser considerada um deles, mas, você é mais nossa que deles. Nosso costume é assim, nossas tradições são essas, essa é quem  você é! Escolhemos o melhor para você, um rapaz bom, que segue as tradições, que preza os bons costumes, que ama nossas raízes, escolhemos o melhor; certamente Aslan será o melhor para a melhor moça que existe neste mundo. – Ela esbanja um leve sorriso, sorrio também, forçado é claro. – Gosto de te ver assim, sempre sorrindo. Nunca perca sua alegria, querida. – Ela diz ao colocar sua mão sob a minha. – Casamento não é fácil, mas você sempre terá a nós, embora isso fuja um pouco das nossas tradições. Estaremos sempre aqui, Sila, caso precise, não tenha medo! E... Como eu sempre lhe disse, vocês irão construir juntos um forte laço, isso demanda tempo e paciência mas não desista, você vai conseguir! - ela garante.

- Shukran! (obrigada!) -digo.

- Agora, termine seu chá. A família do seu noivo mandou o vestido para você usar mais tarde e, temos muito o que fazer por aqui. Tudo precisa estar perfeito!

Sim, como mandava a tradição, a família Demir enviou o vestido que eu usaria no jantar de noivado para poucos convidados, apenas os mais achegados da família. Em cima da minha cama, levado por uma funcionária da casa vi o  vestido que a família de Aslan havia enviado, e era  muito bonito. Um belo vestido bem-comportado creme de mangas três quarto que passava um pouco da altura dos joelhos, apertado somente no busto, e solto do busto para baixo para não marcar, é claro, o corpo da noiva, no caso o meu.

Ao contrário do que eu queria, o dia passou como um sopro. Logo a noite chegou, e com ela, minha sina já havia sido traçada. Enquanto a água morna do chuveiro caía sob meu corpo, refleti sobre tudo o que estaria prestes a acontecer. Mas, por mais que minha família fosse a favor desse casamento, por mais que esse acordo já estivesse sido formando há anos, por mais que eu soubesse que eu precisava fazer aquilo,  uma coisa era certa, eu não me casaria com Aslan. Sei que serei a vergonha de minha família, a desonra, a perdida. Mas eu simplesmente não poderia ir contra o meu coração, os meus sentimentos. E em meu coração só havia espaço para um único homem, Guilherme. Era em seus braços que eu sempre quis estar, era com ele que eu queria me casar, era em sua companhia que eu queria passar o resto de nossos dias. Encontrei nele o amor, o verdadeiro amor; mas algo mais forte que o nosso amor nos impedia de sermos felizes. A tradição, Guilherme não era turco.

Meu amor turcoOnde histórias criam vida. Descubra agora