Era dia, tarde do dia, mas ainda assim dia. Pelas mal calçadas pedras de uma rua, cavalgava um homem. Não qualquer homem, mas o mesmo homem que horas atrás conversara e brincara com sua filha, e o mesmo homem que horas atrás fora mandado para a cidade não tão distante de sua casa campestre, para buscar farinha e algumas sementes de tomate. Mandado por quem? Ninguém mais ninguém menos que sua esposa, mas este não é um assunto para agora.
O assunto que é para agora é que o homem cavalgou por meia hora antes de chegar nos portões de Calantör. Dês de pequeno as muralhas altas de pedra o fascinavam, eram imponentes, as maiores muralhas já construídas, e as mais fortes. Ele aproximou-se do estábulo, um que ficava ali perto de um dos portões principais, entregou seu cavalo ao dono, e com apenas um gesto de cabeça e uma moeda de ouro, deu as costas e entrou na cidade.
Note que não haviam muitas pessoas que estavam entrando e saindo, a maioria do mínimo transito daquele dia era interno, pois além da cidade ser construída com o propósito primeiro de ser impenetrável, sua estrutura interna e suas ruas foram feitas pelo fim específico de inconveniência para qualquer alma que desejasse acessar o coração da cidade.
Subiu direto para a esquerda, sabia onde iria, sabia com quem encontraria, e faria de propósito, ele o avistou de longe.
Chegou a uma das várias barracas que poluíam tanto visualmente como sonoramente a praça da alma, a árvore dos ancestrais parecia cansada de tanto barulho, e de tanto calor, que calor... As folhas caindo eram tão brancas que pareciam neve, mas infelizmente só pareciam.
A carroça em questão apresentava em seu estoque farinha, sacos de farinha de fato, trigo, pães, milho, facas, um escudo... Era um vendedor geral que passou a habitar a cidade a poucos anos.
— Mirrian! Veio para queimar o rosto no sol? — Apoiou-se na barraca com o cotovelo, e mostrou ter um sorriso por entre a barba
O comerciante parou de lustrar o que quer que fosse, e estendeu as duas mãos na madeira pregada da mesinha. Soltou também um amplo sorriso antes de falar mais com as mãos que com a boca.
— Hora se não é Dsan Alux de Calantör! — Exclamou — Um dia você ainda me conta em detalhes todas suas aventuras, hm?
Balançando a cabeça apenas sorriu
— Está convidado para jantar na minha casa hoje — Disse num tom calmo — Se me der um saco de farinha de graça...
— De graça? — Ponderou com a mão quase atravessando o queixo — Hm, a comida vai ser de graça, mas também será minha farinha... você não veio aqui só por farinha, não é?
— Se você tiver tomates eu aceito
— Tomates? Ah, não — Resmungou a última parte — Bem, eu tinha tomates meses atrás, mas os últimos carregamentos não tinham nenhum, as trocas estão ruins.
— As fazendas devem ter trocado o plantio desse ano — Disse otimista — Então, o que me diz? Jantar pela farinha?
— Cinco quilos?
— Cinco quilos — Respondeu, ajeitando a postura
O mercador então começou a empacotar as coisas, trazendo tudo para o compartimento que tinha dentro da carroça de mão
— Já vai? — Dsan perguntou, levando uma mão para a cintura
— Ah não, vou passar em casa, pra mim chega, esse calor vai me matar se eu continuar aqui – Limpou o suor da testa com o próprio chapéu — Nem as pessoas estão querendo sair de casa hoje, calor demais.
Acenando com a cabeça, e posteriormente com a mão, Dsan se virou e voltou andando pelo caminho que percorrera dentro da cidade de pedra. Enquanto voltava, cogitou diversas vezes cortar os longos cabelos, e fazer toda a barba, pois o clima atual não era exatamente agradável, e nem céu ou os pássaros davam indícios disso mudar tão cedo.
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As Runas de Lwellyn
FantasyO trajeto da vida de Dsan Alux nunca foi o mais fácil - e após exilado pela própria família, e quase excomungado pelos paladinos, o rapaz vê sua única chance em um bando disfuncional que busca o poder das Runas de Lwellyn para concertar o mundo, e s...