NO DISCRETION || VERHAO.

Vernon confronta um novo amigo.

“O poder é bom e a estupidez é inofensiva, em geral. Mas o poder e a estupidez juntos são um perigo.“

[...]

Os olhos de Vernon estavam pesados feito pedras quando acordou, evidenciando sua exaustão física e mental pelos acontecimentos da noite passada. Ele se sentia tão pesado que sequer conseguia se mexer, movendo somente suas pálpebras inchadas conforme tentava enxergar e se situar.

Se sentar foi uma tarefa árdua e dolorosa, fazendo cada pedacinho do corpo franzino do adolescente estalar e pulsar em dor, como se seus ossos fossem feitos de torradas. Se espreguiçou uma única vez e esfregou o rosto com a palma, sentindo uma textura áspera que o fez resmungar, imaginando que, talvez, não estivesse usando tanto hidratante de mãos quanto imaginava. Finalmente abrindo seus olhos cor de âmbar, enxergou o curativo imenso em sua palma. 

Tomando um susto, Hansol deu um pulo, derrubando as cobertas no chão e podendo finalmente ver seus braços e pernas cobertos em ataduras, lhe fazendo parecer uma múmia. Ainda sentia uma leve ardência graças aos cortes, mas não havia uma única mancha de sangue nos curativos, como se cada ferimento seu tivesse sido meticulosamente limpo e cuidado. 

Isso também fez o garoto perceber que os cacos de vidro haviam sido recolhidos do chão, como se aquele acidente jamais tivesse acontecido. O espelho, que deveria estar completamente despedaçado, estava inteiro, intacto, novinho em folha. Até a madeira do suporte parecia mais brilhante e mais conservada do que antes. 

A primeira coisa que Vernon fez foi sair correndo do quarto e procurar por sua mãe, pronto para pedir desculpas por seu comportamento. O fato da mulher não só ter cuidado de si durante seu sono como também ter limpado tudo e até mesmo comprado um novo espelho fez a consciência do rapaz pesar, mas, mesmo rodando o apartamento inteiro, não encontrou nenhum rastro de Melody. Foi quando entrou na cozinha e parou na frente da geladeira que o rapaz percebeu uma coisa. 

Não havia sido sua mãe.

“A mamãe precisou sair às pressas, não tive tempo de fazer seu jantar. Coma a lasanha congelada que eu comprei mais cedo. Vamos conversar com mais calma quando eu voltar, okay? Eu te amo, volto em 1 dia.”

Sua mãe estava longe de ser uma mulher magra, mas era completamente castigada pelo enorme peso da dupla jornada, então era impossível que ela conseguisse arrumar o quarto, comprar um espelho novo e cuidar de todos os ferimentos de Vernon no período entre a briga e o momento que ela saiu, o que provavelmente não levou nem uma hora. Junhui não tinha a chave de seu apartamento, já que, quando Melody viajava, o chinês era quem abrigava seu amigo. Minghao não atravessaria a cidade naquele horário, ainda mais sem nem saber que algo tinha acontecido. 

Um vento quente como o bafo do inferno correu pelo apartamento, fazendo Vernon abraçar o próprio corpo e fazer uma careta pela queimação em sua pele. Acontece que as janelas estavam todas fechadas, além de que uma chuva geladíssima caía do lado de fora, espancando os telhados das casas com rajadas fortíssimas. A temperatura era de 17º. Nem no calor escaldante o adolescente tinha sentido uma quentura tão forte como aquela. 

Ficar naquele apartamento de repente tinha a mesma sensação de ficar preso em um cubículo com oxigênio limitado, então o rapaz se agasalhou inteiro, calçou os sapatos na velocidade da luz e bateu a porta atrás de si, sentindo o coração acelerar como o motor de uma Bugatti. Tirou o guarda-chuva da mochila e o abriu quando pisou na calçada, sentindo as pernas um pouco moles, mas andaria a cidade inteira se fosse pra se livrar daquele sentimento terrível que tomou conta de seu peitoral.

O caminho até a escola parecia ter encurtado em dobro, pois as pernas curtas do adolescente o levaram até o lugar muito mais rápido do que o comum. Encontrou seus amigos do lado de fora do colégio, o que não era comum, já que eles sempre estavam em suas salas, mas ambos estavam discutindo até o momento em que viram o outro chegar, marchando em sua direção.