Capítulo 5

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Praguejou em voz baixa, maldizendo a si mesmo. Por que não conseguia simplesmente esquecer o passado? Ela provara que conseguia cuidar da própria vida sem precisar de um homem ao seu lado. Ainda que apontassem um revólver para sua cabeça, Edgar jamais confessaria que tinha ciúmes e medo do sucesso que ela pudesse alcançar. E não estava enganado. Katerine tinha ido até além de suas expectativas.

Decidido a voltar para casa, ele passou por ela, mantendo a cabeça baixa para impedir qualquer contato. Todavia, percebeu os passos leves bem atrás dele. Edgar deixou que ela o seguisse, embora fumegasse de raiva por dentro. Quando alcançou a caminhonete toda enlameada girou a cabeça e, espiando sobre o ombro esquerdo, perguntou:

- Deseja algo?

- Se importaria se eu o acompanhasse?

- O que acha?

O tom sarcástico e o olhar fuzilante dele não a intimidaram.

- Preciso falar com você, Edgar.

- Não imagino sobre o quê... a menos que Rafarilo tenha conjecturado uma nova teoria sobre a forma como devo ter assassinado Charlie Avery e você pretenda descobrir se acerta dessa vez!

O vento soprava forte e desalinhava os cabelos dela libertando fios loiros que lhe caíam sobre os olhos. Com as mãos enluvadas, ela os afastava. Apesar do frio, Katerine não estava tremendo, embora o casaco e o cachecol em lã fina fossem mais apropriados para uma missa de domingo em vez de um dia tão tempestuoso. As botas que usava também não estavam adequadas para suportar a grossa camada de neve que cobria o chão. Ficou aborrecido com esta última observação, pois o fazia recordar dos pés delicados e bonitos que ela possuía.

- Não seja tolo, Edgar. Nunca fui sua inimiga.

Ele quase riu. A opinião dela sobre a amizade entre eles era tão fraca quanto as promessas de Edgar feitas a Alex e que jamais cumpriria.

- Não imagino o que pretende comigo, agora.

Ela deu um passo na direção dele. Edgar admirou-lhe a coragem. Normalmente as mulheres o evitavam. Desde que fora libertado, as coisas para ele ficaram ainda piores. E o que espantava na aproximação dela era que nenhuma mulher que conhecesse ousaria falar com ele sem levar alguém como escolta. Como era próprio da personalidade de Katerine, ela seguia as próprias regras e permanecia bem na frente dele, quase cara a cara. Ele não podia deixar de apreciá-la pela coragem e honestidade, que combinavam perfeitamente com a notoriedade profissional pela qual era reconhecida. Se fosse um dia comum, ele tentaria evitá-la, porém aquele dia em particular nem mesmo chegava perto da paz que pretendia.

- Sei que está passando por um momento difícil. Mas é importante que conversemos.

Se ele acabara de considerá-la uma mulher corajosa, agora mudava de idéia. A teimosia superava qualquer outra qualidade. Ele ergueu o colarinho da jaqueta e puxou a aba do chapéu para proteger os olhos. Depois retrucou:

- Preciso ir para casa.

- Então vou segui-lo.

Edgar franziu o cenho. Na cabana havia coisas que ele não gostaria que ela visse. Mas não acreditava que Katerine ainda não soubesse que ele estava com o bebê.

- Por enquanto a justiça ainda não tem competência para tirar a criança de você. E eu também ainda não pensei a respeito - declarou ela, percebendo que talvez fosse essa a razão pela qual Edgar a estava evitando.

Aquela declaração convenceu-o a lhe conceder o benefício da dúvida. E seria muito idiota se achasse que Noemir já não estaria procurando uma maneira de derrotá-lo na Corte. Seria importante para Edgar descobrir o que deveria esperar pela frente. Katerine parecia disposta a não deixá-lo no escuro. E isso merecia que a tratasse com gentileza. Desde que ela não pedisse sua confiança.

- Tem certeza de que não quer ir à recepção oferecida pelos Tavares? - perguntou ele, um tanto aborrecido por ter cedido tão fácil. - Ouvi dizer que eles não pouparão despesas para consolar todos os corações partidos das pessoas que comparecerem ao enterro da minha irmã.

- Já me alimentei antes de checar os cavalos.

Edgar sorriu com uma ponta de sarcasmo na voz.

- Que bom, Excelência! Isso me faz lembrar a sua origem da classe trabalhadora!

Como se ele pudesse esquecer que o pai dela, embora falecido, tivesse sido um juiz de renome. E que Katerine viveu com sua tia Beryl no Rancho Shadow, famoso por criar os cavalos mais valiosos da região. E como uma feminista de primeira ordem, Beryl não dava a mínima importância pelo que pensassem a respeito dela. E ai daquele que ousasse chamá-la de solteirona.

Katerine era parecida com a família em vários aspectos. Mas por mais que adorasse os cavalos, as leis eram sua paixão. Agora deixava o treinamento dos animais para o capataz Jorge e os cuidados com a casa para a esposa dele Eva. Porém, gostava de ajudar com os cavalos sempre que tinha algum tempo livre.

- Não faça com que eu me arrependa de tê-lo procurado, Edgar.

E ele sabia que não seria conveniente provocá-la mais do que deveria. Então deu de ombros.

- Tudo bem. Se quer ir comigo, vamos.

* * *

Enquanto a caminhonete vencia os 20 km desde Wallis até a cabana, Edgar observava Katerine pelo espelho retrovisor, seguindo-o de perto. Isso ajudava a controlar as emoções que ameaçavam abalar-lhe os nervos. Marine tinha partido para sempre e ele precisava aceitar o fato. As palavras de atenção e carinho não mais poderiam ser ditas nem o tempo que desperdiçaram poderia ser recuperado. Ele jamais esqueceria e talvez nunca se perdoasse por ter se precipitado em concluir que a irmã não desejava vê-lo e estaria feliz ao lado do marido. Mas não adiantava ficar lamentando. Precisava enfrentar as novas preocupações e responsabilidades que tinha pela frente.

Ele suspirou fundo enquanto observava o horizonte. Desde a última tempestade, poucos dias antes, uma nova camada de neve tornava o chão ainda mais branco. E enquanto dirigia para o lado oeste da cidade, admirava as Grandes montanhas, que para Edgar significavam a liberdade. O lugar que o mantinha longe da civilização que resolvera deixar para trás.

A ventania recente e o tráfego ajudaram a limpar a maior parte do gelo no leito da estrada. Talvez fosse melhor retirar as correntes dos pneus, ele pensou. Se tivesse tempo faria isso na parte da tarde. Entretanto, dependeria de quanto o bebê dormisse. Poderia pedir a João Montes que o ajudasse, porém, quanto mais cedo se organizasse, melhor.


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Um Caso de Amor-DegustaçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora