Hereditário

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A casa está cheia de conhecidos, porque não conseguem ser amigos. Há dias em que mal trocam uma palavra, não há bom dia, muito menos boa noite. Cada um se mantém preso em seus silêncios que gritam e desejam ser ouvidos de verdade, não porque é uma obrigação. Cada um construiu uma barreira emocional, onde é mais seguro não se abrir, muito menos deixar alguém entrar. Barreira essa que esconde medos, segredos e gostos. Aqui é seguro, atrás do muro mais resistente que um diamante.

Os anos passam e continuam assim, conhecidos que deveriam ser grandes amigos. Nada afetivos, abraços apenas em aniversários, seguidos das mesmas palavras de sempre. Por anos, por décadas. O costume tomou conta de todos, as manias ruins viraram um hábito. A casa está cheia, entretanto, vazia. Uma tenta falar, mas não é ouvida, logo, prefere não dizer mais nada. Uma tenta se expressar, mas ninguém dá importância. Uma tenta desabafar, mas todos a criticam. Uma ouve coisas dolorosas e se desmancha em lágrimas, mostrando para todos que também é humana.

Quem ofende nunca se desculpa e cada um segue sua vida como se nada tivesse acontecido. Um é recluso e talvez se sinta melhor assim, não tentando mudar o presente, só aceitando que as coisas são como são. Embora sejam ruins.
O outro já é mais fácil de lidar, expressivo e não se esconde, isso porque não mora sob o mesmo teto que os demais.
O último e mais velho, é iluminado, gosta de se comunicar, mas seu lar não parece um lar. Todos são problemáticos, porque assim foram ensinados a ser. Todos se questionam se um dia isso mudará, porém ninguém dá o primeiro passo.

— eu desejo e vou acabar com tudo isso.

Quando alguém toma coragem, acaba em confusão.  Alguns buscam lares fora do seu lar de origem, porque lá fora é mais agradável, mais confortável. Outros se perdem em silêncio e depressão. E encaram isso como algo totalmente normal, uma consequência de seus erros no passado, mesmo não sendo.

Não somos monstros, só não sabemos se expressar. Gostaríamos de mudar, mas não sabemos por onde começar. Tentamos e às vezes é emocionante, mas noutras é um grande desastre. Não somos monstros, apenas incompreendidos e buscando um meio de dizer "eu te amo" sem que precise emitir som algum. Não somos monstros, mas usamos máscaras de um. Somos suporte quando um de nós precisa, sabemos amar, mas não demonstrar. Somos um lar que precisa urgentemente ser edificado. Precisamos ser lapidados e polidos.
Céus, que não seja tarde demais...

— esse é o poder destrutivo da falta de comunicação.

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