Capítulo 4: O baile de máscaras - Parte 2: A Valsa das Estrelas

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- Penélope. - chamei minha amiga em voz baixa. 

Quando ela se virou para mim, agarrei seu pulso e em segundos, estávamos as duas escondidas atrás da pilastra. O sangue bombeava em meus ouvidos e minha roupa começou a parecer apertada demais. Sentia o suor por debaixo da máscara e, mesmo um minuto atrás tendo criticado Jamie, comecei a rir descontroladamente. Realmente, eu era uma decepção. 

- Angelina, o que está acontecendo? - Penélope me balançava pelos ombros.

- A senhorita está bem? - uma das funcionárias com máscara de tartaruga e um espartilho branco me encarava, preocupada. Assenti para ela, que continuou andando com a bandeja em mãos. 

- O que vocês estão fazendo aqui? - Jamie apareceu atrás da pilastra. 

- Ele está aqui. - eu disse, sussurrando, e Penélope arregalou os olhos. - O homem do trem está aqui. 

- Qual homem? - Jamie estava confusa, sendo a única de minhas amigas que desconhecia a história. 

- Onde ele está? - Penélope saiu de trás da pilastra e olhou para onde eu indiquei. - Ah sim, deve ser o que está com a coloração de um tomate. Angelina Maria, olhe para mim. Você vai sair de trás dessa pilastra nesse exato momento e sorrir para ele.

Olhei para ela com desespero, mas sua expressão era dura. Tentei com Jamie, mesmo sabendo que ela usaria isso para se vingar de mim por antes. Concordei com a cabeça, respirei três vezes e saí de trás do mármore, com o máximo de dignidade que consegui reunir. Coloquei em meus pensamentos que talvez ele nem tivesse me reconhecido, ainda mais com o dragão em meu rosto. Minhas mãos tremiam, mas eu controlava isso apertando a taça. 

- Ele está olhando para cá? - perguntei à Penélope. 

- Sim, querida. Vire-se e lhe dê um sorriso. - me respondeu, enquanto olhava discretamente para o grupo.

Coloquei um leve sorriso nos lábios, e me virei. Porém, para meu azar e desgosto, ele não estava mais olhando para meu rosto. Em vez disso, seus seis amigos sorriam para mim, com expressões de satisfação e surpresa. Dois deles começaram a falar com o homem do trem, que os olhava com uma expressão de desespero, com o rosto muito vermelho. Os outros discutiam e concordavam entre si, e os que estavam de pé, chutavam os sapatos do amigo.

- Penélope. Eu te amo, minha amiga, mas irei te matar. - mantive o sorriso no rosto, que eu podia apostar muito dinheiro que estava mais vermelho do que o do homem.

- Me perdoe. Até mesmo eu me sinto constrangida nesse momento. - ela alisou o cabelo.

- Alguma das duas poderia me dizer o que está acontecendo? - Jamie disse, puxando de leve meu braço. 

- Vamos para outro lugar. Eu lhe conto no caminho. - minha voz já começava a dar sinais de desespero, pois, toda vez que eu me virava, via que o grupo ainda nos olhava. E eles pareciam estar em uma discussão fervorosa também. Algumas vezes meu olhar e o dele se cruzavam, mas eu desviava rapidamente. - Me sinto extremamente infantil.

- Tudo bem, Lina, vamos. - cedeu Penélope. 

Nós nos apertamos novamente na pista de dança. Jamie ouviu com atenção a história, a qual eu contava pela terceira vez no dia. Meu coração ainda estava acelerado, e mesmo sabendo que estava sendo ridícula, de tempos em tempos me colocava na ponta dos pés, tentando avistá-lo novamente. 

- Tudo bem, talvez isso tenha sido uma das coisas mais românticas que eu já ouvi. - Jamie disse. As lanternas começaram a mudar de cor, escurecendo o salão em tons de roxo intenso e azul escuro. - Só não entendi o porquê de não irmos até lá. O mais difícil você fez, Lina. Chamou o homem de lindo. 

- Minha coragem foi momentânea, Jamie. Não vou até lá nem por ameaça de morte. - eu disse. - Já esqueci. Vamos dançar, queridas, não vou deixar a ansiedade estragar minha noite.

- Na verdade, isso é só você tentando esconder o medo e... - Penélope não teve a oportunidade de concluir a frase, pois um sinal alto soou pela festa. Três vezes. Todos sabiam o que significava.

A multidão começou a correr de um lado para o outro, se juntando em pares. Quem estava do lado de fora da pista, já se encontrava a caminho dela. Tudo aconteceu muito rápido: Verônica apareceu em um borrão vermelho e puxou Jamie para longe de nós; eu e Penélope seguramos as mãos, com medo de sermos separadas; um dos amigos do homem do trem apareceu, o mais alto deles, vestindo um terno azul e uma máscara de coala, sussurrou algo no ouvido de Penélope, que concordou, soltando minha mão para segurar a dele e os dois desapareceram na multidão; e um instante antes de as luzes se apagarem, aqueles olhos escuros apareceram na minha frente e ele colocou as mãos na minha cintura.

O breu trouxe consigo um completo silêncio, interrompido apenas por risadinhas e respirações agitadas. Meu coração batia freneticamente, e parecia que a proximidade do corpo dele havia levado embora toda a minha embriaguez. A quantidade absurda de pessoas próximas umas às outras nos obrigava a chegar cada vez mais perto um do outro. As três batidas soaram novamente, e o salão começou a ser iluminado por pequenos pontos, que mais lembravam vagalumes. As luzes despencavam aos montes, brancas como estrelas, em volta de todos nós. Eu realmente precisava dar mais valor ao Departamento de Tecnologia. Aquilo era uma das coisas mais lindas que eu já havia visto. Um dos pontos de luz caiu no ombro do homem e se desfez em pó brilhante. Levei minha mão até ali, tirando o máximo que eu consegui delicadamente, e depois, juntei as mãos atrás de seu pescoço. Outras três batidas foram ouvidas, e a Valsa das Estrelas começou. 

A Valsa das Estrelas era o momento que marcava o fim do baile. Era proibido toda e qualquer conversa, com a explicação de que precisávamos deixar o corpo e a alma falar através da dança. Outra tradição arcaica, mas que todos seguiam obedientemente. No último baile, dancei com Penélope, pois nós sempre "sobrávamos" no nosso grupo. Foi divertido, mas nada comparado ao que eu estava vivendo agora. E imaginava que ela sentia a mesma coisa. Nós nos mexíamos o quanto o espaço nos permitia e as luzes conseguiam deixar ele ainda mais bonito, mesmo com a máscara cobrindo a maior parte de seu rosto. Pensava que eu ia ficar nervosa e erraria os passos, mas a proximidade me deixou confortável e, se fosse possível, me aproximaria mais. As luzes começaram a mudar de branco para um azul suave, nos avisando que o fim estava próximo. Ele começou a aproximar o rosto do meu, e entreabri a boca. 

Antes que nossos lábios pudessem se tocar, as três batidas fizeram todos a começarem a correr de novo. Afastei meu rosto do dele, mas ainda me mantendo no seu abraço. 

- Qual o seu nome? - eu perguntei, a voz um sussurro. 

Ele não teve tempo de responder, pois seu amigo e Penélope apareceram, ambos com as bocas borradas da mesma cor. O amigo assentiu para mim e roubou um último beijo de Penélope, antes de arrancar o homem de meus braços e começar a arrastá-lo. Antes de se afastar de mim, ele deu um beijo rápido em minha mão, e se perdeu na multidão.

- Vamos! - Penélope segurou minha mão e começamos a correr na direção oposta. 

Paramos em frente ao toalete, onde as outras três nos esperavam e então saímos em disparada pela mesma porta em que entramos. Quando chegamos no jardim, sentamos no gramado sem classe alguma e arrancamos as máscaras. Eu e Penélope demos gritinhos agudos, e as outras também continham expressões bem felizes nos rostos. Verônica passou por nós e acenou timidamente para Jamie, nos fazendo sorrir ainda mais. Nós cinco nos viramos a tempo de ver a porta do Ginásio ser fechada e trancada. Grupos de meninas já se dirigiam ao Dormitório, e um guarda dos jardins, que usava uma grande cartola, nós instruiu a fazer o mesmo. 

Seguimos as lamparinas sorrindo, mas em silêncio. Fizemos um acordo de comentar sobre os acontecimentos da noite assim que chegássemos no quarto. Olhei para o céu, e eu sabia que até mesmo as estrelas haviam aproveitado a sua Valsa.


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