Constelação

Capítulo 6: O Sonhar

Mesmo com a cabeça latejando pelo cansaço, um sorriso insistia em morar nos meus lábios. Me arrumei com um cuidado extra, animada por voltar ao Departamento de Letras. Amarrei meu cabelo em um rabo baixo e me conferi no espelho. A camisa branca com a calça de alfaiataria combinavam perfeitamente com a cinta que rodeava meu abdômen, que tinha uma coloração marrom, assim como meus sapatos. Mesmo com o relógio de pulso funcionando bem, prendi à cinta um relógio de bolso com uma corrente dourada, apenas porque penso que me deixa com a aparência séria e elegante. Marie Lu me esperava na porta, e Cecília já tinha saído do quarto por seu Departamento ficar mais distante do Dormitório. Saímos para o ar gelado da manhã, que não duraria muito, pois o sol brilhava no céu. Enganchei meu braço no de Marie Lu enquanto andávamos pelos bosques da Universidade, preenchidos de diferentes espécies de flores, fontes de água e bancos ocupados por estudantes. 

- Vamos conversar sobre ontem? Temos tempo agora. - eu disse. 

- Sim. - respondeu Malu, ficando em silêncio logo depois. Suspirei alto, revirando os olhos.

- Sabe que eu não a deixarei em paz até que me conte sobre a Valsa, não é? 

- Não sei quem ele era, Angelina. E também não importa. - ela evitava olhar para meu rosto. Se concentrava em cada prédio, bicicleta ou lamparina por qual passávamos. - Apenas dancei com ele porque não encontrei Joshua. Nós tínhamos nos separado alguns minutos antes da Valsa.

- Eu sei que não importa.... Mas quero saber mesmo assim. - não iria perguntar a razão de ela ter se separado de Joshua, pois desconfiava que isso iria distanciá-la de mim. - Como ele era? Como ele falou com você?

- Apenas... sorriu. E perguntou se eu lhe daria a honra. A máscara de coelho me impedia de ver a maior parte de seu rosto, mas ele era bonito. - os olhos dela haviam ficado embaçados e minha amiga parou de andar exatamente no meio do caminho entre os nossos Departamentos. Pacientemente e com um sorriso nos lábios, eu esperei que ela continuasse. - Ele tinha tatuagens do braço e manteve os olhos nos meus o tempo inteiro. E o sorriso. O sorriso dele era... - Malu sacudiu de leve a cabeça, voltando ao presente. - Bom, como disse, não importa. 

- Sim, eu percebi. - meu coração se acelerou só de ouvir ela contar, não conseguia imaginar como estaria o dela. - Preciso ir agora, querida, nos vemos mais tarde.

Beijei sua bochecha, e segui pelo caminho que levava ao Departamento de Letras. Depois de alguns passos, olhei para trás, e vi que ela ainda estava parada, olhando para o chão. Sorri e segui a rua de tijolos violetas, que levava até o prédio. Os pássaros cantavam alto, e eu ouvia sons de instrumentos ao longe, vindos de alguma aula de música. Meu humor combinava com o dia iluminado, e eu tinha a certeza de que a noite anterior tinha sido importante para cada uma de nós. 

Olhei para o grande prédio violeta e dourado, abobadado e gigante à minha frente. A porta dupla era cravejada por pequenas penas douradas. Depois de tanto tempo sem entrar no grande saguão, me senti completamente feliz ao ver Penélope, Jamie e Radesh sentados em um dos grandes sofás acolchoados, todos elegantemente vestidos. Vários grupos de colegas se agrupavam pelo saguão, falando de modo animado e com rostos de quem não tinham dormido muito. Eu podia muito bem adivinhar qual era o assunto de todos eles. Me joguei ao lado de Radesh e apoiei minha cabeça no ombro de seu paletó.

- Queridos amigos, quem mais está se sentindo glorioso? - perguntei na minha melhor imitação de nossa orientadora do Sonhar, Senhora Gema. Olhei para Penélope e, mesmo sabendo da presença de outras pessoas ao redor, precisei provocá-la com sons de beijos. 

Antes que ela tivesse tempo de fazer algo além de uma expressão irritada, o relógio nos comunicou com um escandaloso sinal que a hora de ir aos nossos postos tinha chegado. Radesh empurrou minha cabeça de leve, se levantou e estendeu a mão para me ajudar.