Cap 1. Babaca 2/4

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    O dia foi se passando rápido, e, finalmente, terminei a planilha da empresa Impactual. Parti para os meus afazeres. Bocejei pela terceira vez, com os olhos quase doloridos após horas e horas em frente ao computador. Os esfreguei com os dedos, sentindo uma leve ardência. Não posso deixar o trabalho se acumular; não quero adiá-lo para amanhã. Determinada, decido pegar um café para me despertar. Vou até a copa da empresa, e por sorte, não há ninguém lá.

Na verdade, quase todos já se foram embora

    Diabos, se não fosse o meu chefe maldito eu já estaria no ônibus para casa a essa hora. Argh, como odeio esse homem. Mexo a garrafa de café; aparentemente, ainda há um pouco. Isso é café feito de manhã? Decido experimentar. Pego um copo descartável e despejo o café. Me arrependo no segundo que levo o copo de plástico até a boca. Horrível, quem fez isso certamente queria que alguém morresse ao bebê-lo. Brincadeira, exagerei demais; o café apenas está frio e ruim. Com o café em mãos eu volto para a minha mesa. Observo minha amiga recolher suas coisas e pegar sua bolsa.

— Já vai? — Assopro o café sem querer.

     Ele está frio, Ellen.

— Mulher, já é quase oito horas da noite. — Ela ajusta sua bolsa no ombro.

— Tenho que buscar o Gregory na casa do diabo.

     Dou uma risada antes de tomar um gole do café. Fernando, mais conhecido como diabo, é o ex-marido da Marcela, e eles têm um filho, o pequeno Gregory, de seis anos.

— E ele parou com a síndrome de DiCaprio dele? — Coloco o copo descartável na minha mesa, ao lado do monitor aceso.

     Ela nega com um revirar de olhos, visivelmente frustrada. Fernando tem uma "fixação" por mulheres mais jovens, mas quando elas atingem a idade de vinte e cinco anos, ele termina com elas — acabamos apelidando isso de Síndrome de DiCaprio, que nós duas inventamos.

— Não acho que ele vai parar nem quando tiver sessenta anos! — Ela faz uma careta. — Bom, eu vou indo, antes que ele coloque o Gregory para dormir. — Ela manda beijinhos para mim no ar. — Bom trabalho e não fique até muito tarde. — Ela me adverte, saindo em direção ao elevador.

    Eu aceno de volta quando ela entra no elevador e se vai. Uau... É estranho e bizarro estar aqui sem ninguém. Alguns minutos depois do expediente, eles sempre deixam as luzes um pouco mais baixas, criando um ambiente estranhamente confortável. Puxo a minha cadeira para voltar ao trabalho. Não consigo parar de pensar em Marcela; ela foi casada com Fernando, até teve um filho com ele! E, mesmo assim, sendo uma esposa exemplar que aposto que ela seja, ele a traiu inúmeras vezes. Isso faz com que eu perca um pouco a fé nos homens. Será que todos são assim? Mergulhada em meus pensamentos, apoio o cotovelo na mesa e escoro a cabeça na minha mão.

Suspiro

       Talvez? O meu último relacionamento de verdade foi quando eu tinha apenas vinte anos, ingênua e completamente apaixonada. Ele me pediu em namoro após três meses de encontros, mas uma semana depois me traiu. Não fiquei com traumas nem nada disso, juro, mas... Quando vejo algumas mulheres que conheço com maridos que as tratam mal, começo a me perguntar se todos os homens são assim. Todos farinha do mesmo saco. Não sei o que quero para mim. Claro, não estou esperando um príncipe encantado, mas sei lá... Talvez alguém...

— Ellen. — Uma voz baixa e doce me chama.

     Dou um pulo de susto, quase derrubando a cadeira. Era Tomas, com a bolsa e uma mão apoiada na divisória. Ele ainda não foi embora?

— O que deseja, assom-, senhor Tomas? — Arrumo minhas palavras; xingá-lo "sem querer" me renderia uma suspensão ou até mesmo a demissão, e eu não estou nada afim disso.

— Vim ver por que você ainda está aqui. — Ele se apoia mais na divisória.

— Já ouvi falar que a curiosidade estrangulou o gato, senhor? — Dou um sorriso forçado.

— Não seria "matou"?

— Na verdade, eu acho que ela está começando a cogitar isso... — Faço uma feição de pensativa falsa, olhando para cima.

     Ele dá uma risada, que preenche quase todo o setor, já que está tão vazio e silencioso.

— Essa foi boa, Ellen. Até que você é engraçadinha. — Ele passa a mão embaixo do olho esquerdo, secando uma lágrima.

    Engraçadinha? Suspiro, eu não queria lidar com Tomas agora, estou ocupada demais.

— Tomas, por favor, vou falar sério agora. — Viro minha cadeira para ele. — Estou atolada até o pescoço de trabalho por causa daquela MALDITA planilha da empresa Impactual que você me fez refazer três vezes! E antes que você me acuse de falta de respeito, o expediente já acabou, então agora você e eu não somos nada além de duas pessoas que trabalham na mesma empresa! — Expliquei rápido, sem fôlego no final. 

     Precisava desabafar; não sei o que esse homem faria comigo agora. Começaria a me incomodar ou algo do tipo, qualquer coisa para me irritar com o mais belo sorriso no rosto. Giro minha cadeira, pronta para voltar ao trabalho sem esperar a resposta dele. Começo a digitar.

Hum...

Uh?

Ele...

Está quieto?

     Eu... Deixei Tomas sem palavras? Que esquisito. Quando estava prestes a perguntar o que aconteceu para deixá-lo tão calado, ele puxa uma cadeira de alguma mesa próxima. Ele a deixa bem ao meu lado, se sentando. É impossível não observar seus movimentos estranhos.

— O que é isso? — Ele deixa sua bolsa no chão.

— Vou te ajudar no trabalho, ora. — Ele afrouxa a gravata. — Ou você achou que eu gratuitamente me sentaria ao seu lado e começaria a te interromper? Assim cheia de trabalho? — Levanto uma sobrancelha. — Não... Apenas... Não responda. — Ele aperta os olhos com os dedos finos.

— Eu não preciso da sua ajuda. — Resmungo, orgulhosa.

     Eu sabia que Tomas é conhecido por sua competência e perfeccionismo em tudo o que faz. Ouço elogios a ele por todos os setores; não é à toa que ele se tornou gerente, ele merece. Espera, estou elogiando-o!? Argh, isso me dá calafrios.

— Aham, tá bom. — Ele se inclina mais para o meu lado, olhando para a tela do meu computador. — Ah... Proponho refazermos.

— O quê!? — Quase engasgo.

    Respire fundo, respire fundo, não enlouqueça... Uau, que cheiro de perfume doce e bom, está vindo dele?

— Conheço um jeito mais fácil. — Ele me lança uma piscadela ao ajustar seus óculos.

      Relutante, eu movo o mouse até a parte 'excluir tudo'. Espero que ele esteja falando a verdade; caso contrário, eu jogo este computador nele.








єм รυα мєитє [DEGUSTAÇÃO]Onde histórias criam vida. Descubra agora