Capítulo 2

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Joguei uma água no rosto e me fitei no espelho em cima da pia, meus olhos estavam fundos, olheiras eram o resultado de dois empregos.

Mas preencher qualquer tempo a toa era minha meta quando aceitei os dois de forma que coloquei a blusa do trabalho e peguei a bolsa jogada em cima do sofá.

Na estação de metrô a alguns minutos da minha casa olhei minhas sapatilhas velhas enquanto ouvia as vozes das pessoas ao redor. Não entendia o que diziam eram apenas um amontoado de homens,mulheres,jovens e velhos que reclamavam de alguma coisa.

Reclamavam, reclamavam e reclamavam

Ei,lembra de mim?

Ergui o olhar para o outro lado da plataforma, a pequena figura me encarava com seu vestido azul que balançava com o vento do inverno.

Abri a boca para falar quando um metrô passou ali, e quando ele se foi a pequena figura não estava mais lá.

Outro metrô chegou e eu entrei rumo ao meu trabalho do dia, uma cafeteria. Empurrando a memória de agora para o fundo da minha mente me convenci que era porque não havia tomado café da manhã e estava tendo alucinações.

Caminhando pela rua do meu trabalho o único som que ecoava era meus passos, as lojas de decorações e pequenos presentes não precisavam abrir tão cedo afinal. Abri a porta da cafeteria sendo recebida por um calor muito mais agradável:

-Bom dia-o dono da cafeteria saudou de trás do balcão com um sorriso

O velho senhor Tsukasa não parava de sorrir nunca, nem mesmo quando percebeu que não arrancaria um sorriso de mim, sendo assim disse sem animação nenhuma enquanto fechava a porta:

-Bom dia

-Fico feliz que tenha chegado mais cedo, vou aproveitar o movimento fraco para depositar um dinheiro-ele falou tirando algumas notas do caixa

Assenti com a cabeça enquanto trocava o moletom pelo avental da loja. E em poucos segundos ele se foi.

Era apenas eu e o tique taque do relógio velho do lugar, minha mente estava vazia. Respirei fundo e comecei a organizar as ervas que usávamos para chás pela ordem alfabética.

Logo após organizei os sorvetes por cores,até chegar em roxo. Roxo era uma cor linda e uva um sabor bom pensei.

A porta do lugar se abriu e eu me virei grata por sair do transe:

-Bom dia mocinha-falou uma senhora de cabelos grisalhos,olhos escuros mas um sorriso gentil na boca, sendo acompanhada de outra de curtos cabelos pretos e olhar igualmente gentil embora não sorrisse.

-Bom dia-tentei soar alguma emoção na voz mas acho que falhei. Sei que devia sorrir aos clientes mas também não tinha ânimo para tal.

As duas senhoras não pareceram se importar escolhendo uma mesa e sentando enquanto conversavam:

-O que gostariam?-perguntei chegando perto

-Um cappuccino!-a mulher de cabelos grisalhos falou animada

-Pode ser o mesmo-a amiga concordou

Assenti e fui arrumar, a máquina de café ficava atrás do balcão mas eu ainda podia ver as mulheres que conversavam:

-Fico feliz que finalmente tenha vindo me visitar-a senhora grisalha falou

-Eu disse que viria. Mas por que essa cafeteria é tão vazia?

Coloquei as xícaras na bandeja:

-Não só a cafeteria, a rua toda!

-E por que isso?

-Você não sabe o que aconteceu a 5 anos?

-Claro que não! Há 5 anos estava ocupada com o casamento da minha filha-a senhora de cabelos pretos sorriu feliz-Mas me conte!

-Esse lugar ficou conhecido como cenário de assassinato-a senhora sussurrou embora houvesse apenas nos ali

Deixei a bandeja cair e fiquei olhando para as duas:

-Ah, garota você esta bem?-as duas se levantaram vindo até mim

-Estou!-falei firme me abaixando para pegar os cacos das xícaras-Trarei outro por conta da casa não se preocupe.

Devo ter soado mais impessoal que gelo pois as senhoras rapidamente voltaram para a mesa e continuaram o assunto.

Não ouvi mais que sons abafados, havia fechado meus ouvidos para aquele assunto.

Quando voltei com os cappuccinos as senhoras já se ocupavam com outra coisa no celular de uma delas. E fizeram questão de pagar quando foram embora, acabei aceitando o dinheiro,elas deviam estar com dó pelas minhas olheiras e achar que eu não tinha tido uma boa noite de sono

De volta ao silêncio da loja guardei o dinheiro, aquele seria no cenário otimista, o máximo de clientes do dia. Se o lugar não fosse uma herança de família seria mais sábio vende-lo pensei pegando um jornal da pilha do canto.

Era antigo, mas isso não importava, não queria ver as notícias apenas passei para a página do sudoku e peguei uma caneta começando a preencher as partes.

2 se encaixava bem aqui, e ao escrever tive a sensação nítida de ver a pequena figura erguendo dois dedos enquanto sorria. Apaguei a lembrança rapidamente e voltei ao jogo, sim! Ali se encaixava um 7 então o escrevi.

E pude ouvir a voz suave contar animadamente de 1 até 7 como quem acaba de aprender uma coisa e esta animado pra mostrar.

Soltei a caneta enquanto encarava o jornal mas sem ver ou distinguir aquelas letras, me concentrava em respirar:

-Voltei-a voz de Tsukasa envolveu a loja e voltei a me concentrar na minha frente

-Preciso parar por hoje-falei

-Tudo bem-ele falou pondo o próprio avental-Se não se sentir bem amanhã não venha, posso cuidar das coisas sozinho

Agradeci com um aceno de cabeça e sai para o frio congelante do lado de fora da loja

Ei, lembra de mim?Onde histórias criam vida. Descubra agora